As viroses são doenças sérias na cultura do trigo, podendo causar perdas de até 60% na produção de grãos. Diante de um prejuízo tão grande, fica a pergunta: como proteger a lavoura contra esses vírus?
Neste guia prático, vamos detalhar como identificar os principais sintomas das viroses no trigo e quais são as formas mais eficazes de manejo para garantir a saúde e a produtividade da sua safra.
A Importância do Trigo e as Doenças que Ameaçam a Cultura
O trigo é a principal cultura de inverno do Brasil. Os preços atrativos do grão levaram a um aumento de 14% na área plantada nesta safra em comparação com a anterior, segundo estimativas da Conab.
Com isso, a produção estimada chega a 6,832 milhões de toneladas, em uma área cultivada de 2,329 milhões de hectares.
A produção de trigo está espalhada por diversos estados brasileiros, com cultivo de sequeiro ou irrigado. Os principais produtores são o Rio Grande do Sul, Paraná (que tem a maior área plantada), Santa Catarina, São Paulo, Distrito Federal, Bahia, Goiás e Mato Grosso do Sul.
Assim como outras culturas, o trigo pode ser atacado por doenças causadas por fungos, bactérias e vírus. As principais ameaças são:
- Mancha amarela;
- Ferrugem da folha do trigo;
- Oídio;
- Podridão comum de raízes;
- Mancha marrom;
- Giberela;
- Brusone;
- Estria-bacteriana;
- Mosaico comum do trigo;
- Nanismo amarelo da cevada.
Nesta lista, destacamos duas doenças causadas por vírus. Vamos entender primeiro como as viroses funcionam antes de detalhar cada uma delas.
O que São as Viroses nas Lavouras?
As viroses são doenças causadas por vírus. Eles são agentes infecciosos minúsculos que não conseguem se multiplicar sozinhos. Para isso, o vírus precisa invadir as células da planta de trigo e usar a “maquinaria” dela para criar novas cópias de si mesmo. Por essa razão, ele é chamado de parasita obrigatório: significa que só sobrevive e se multiplica dentro de um hospedeiro vivo.
A estrutura de um vírus é muito simples: basicamente, um material genético (DNA ou RNA) protegido por uma capa de proteína.
Um ponto fundamental sobre as viroses é que o manejo é sempre preventivo. Não existe um “remédio” para curar uma planta já infectada. As estratégias de controle focam em evitar que a doença chegue e se espalhe na lavoura.
Na cultura do trigo, as duas principais viroses são o mosaico comum do trigo e o nanismo amarelo.
Viroses no Trigo: Mosaico Comum do Trigo
O mosaico comum do trigo é causado pelo vírus Soil-borne wheat mosaic virus (SBWMV). Ele é transmitido por um protozoário chamado Polymyza graminis, que vive no solo e parasita as raízes de algumas plantas. Quando o solo está úmido, ele libera esporos que se movem com a água da chuva e infectam novas raízes.
Além do SBWMV, o vírus Wheat spindle streak virus (WSSMV) também pode estar associado à doença, pois utiliza o mesmo transmissor.
Uma lavoura afetada por esta virose pode ter uma redução de até 60% no peso dos grãos.
O mosaico comum também é conhecido por outros nomes, como mosaico verde, mosaico amarelo, mosaico estriado do trigo, virose da estria amarela do trigo e mosaico roseta.
Condições que Favorecem o Mosaico Comum
Esta doença é mais comum em regiões frias, como nos estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina.
- Temperatura ideal: O desenvolvimento do vírus é favorecido por temperaturas em torno de
16℃
. - Controle natural: O desenvolvimento para quando as temperaturas ultrapassam
20℃
. - Fatores de risco: A doença se tornou mais importante com a adoção do plantio direto. Áreas com solo compactado, encharcamento e períodos de muita chuva também favorecem o protozoário transmissor.
Além do trigo, essa virose também afeta centeio, triticale e cevada.
Sintomas e Manejo do Mosaico Comum do Trigo
Nos estágios iniciais da cultura, o principal sintoma do mosaico comum são as estrias amarelas nas folhas, que correm paralelas às nervuras.
Pode surgir também o sintoma de roseta, que causa a paralisação do crescimento da planta e um afilhamento exagerado. A doença se manifesta com mais força logo após o plantio.
Os danos podem ser enormes, especialmente se você utilizar cultivares suscetíveis ao vírus.
(Fonte: Douglas Lau em Embrapa)
No campo, é comum observar a doença em reboleiras (manchas na lavoura), devido à distribuição irregular do vetor no solo.
Ciclo do mosaico comum do trigo e da Polymyza graminis}
(Fonte: Reis e Danelli)
A rotação de culturas não é uma medida eficiente para controlar esta doença. Portanto, o manejo deve ser focado na prevenção, utilizando cultivares resistentes.
Nanismo Amarelo da Cevada
Esta doença é causada pelo vírus Barley yellow dwarf virus (BYDV) e tem maior ocorrência na região Sul do Brasil. As perdas na produção de grãos por causa dela podem chegar a 50%.
O vírus é transmitido por afídeos (pulgões). A transmissão é do tipo persistente circulativa: isso significa que, uma vez que o pulgão se alimenta de uma planta doente, ele carrega o vírus pelo resto da vida e pode continuar infectando outras plantas. O pulgão adquire o vírus em 15 a 60 minutos de alimentação e começa a transmiti-lo após 24 a 48 horas.
Os pulgões são favorecidos por tempo seco e temperaturas amenas. O vírus possui uma grande variedade de hospedeiros além do trigo, incluindo arroz, aveia, cevada, centeio e milho.
Como o nome sugere, a planta infectada sofre de nanismo (crescimento reduzido) e apresenta amarelecimento nas folhas.
Sintomas e Manejo do Nanismo Amarelo
Os sintomas mais característicos são as folhas bandeira que ficam eretas e com uma coloração amarelo brilhante.
Essa folha pode morrer mais cedo, o que causa um escurecimento na espiga. Os grãos de plantas infectadas ficam chochos e enrugados.
Sintomas do nanismo amarelo da cevada com pulgões Rhopalosiphum padi
(Fonte: Douglas Lau em Embrapa)
As medidas de manejo para o nanismo amarelo da cevada incluem:
- Controle do vetor: Faça o controle químico ou biológico dos pulgões. O nível de controle é atingido quando, em média, 10% das plantas apresentam pulgões. Nesse ponto, a pulverização com inseticidas é recomendada.
- Tratamento de sementes: Utilize tratamento de sementes com inseticidas do grupo dos neonicotinoides para proteger as plantas nos estágios iniciais.
- Uso de cultivares tolerantes: Escolha variedades de trigo que apresentem maior tolerância ao vírus.
Um Novo Vírus Identificado no Trigo Brasileiro: WhSMV
No final de 2018, um estudo realizado pela Embrapa Trigo em parceria com outras instituições descobriu um novo vírus no Brasil: o Wheat stripe mosaic virus (WhSMV).
A pesquisa original focava na população viral e no manejo do mosaico comum do trigo. Através de técnicas avançadas de sequenciamento genético, os pesquisadores identificaram a presença do WhSMV associado à doença, além dos já conhecidos SBWMV e WSSMV.
Conclusão
As viroses são doenças de grande impacto para a cultura do trigo, com potencial para causar perdas de até 60% na produção de grãos.
Neste artigo, detalhamos as duas principais viroses da triticultura: o mosaico comum e o nanismo amarelo.
Agora que você conhece os sintomas e entende que o manejo deve ser preventivo, pode tomar as melhores decisões para proteger sua lavoura de trigo, reduzir os riscos e evitar perdas significativas na sua produção.
Glossário
BYDV (Barley yellow dwarf virus): Sigla em inglês para o Vírus do Nanismo Amarelo da Cevada. É o agente causador de uma das principais viroses do trigo, caracterizada pelo amarelecimento e redução do crescimento da planta, sendo transmitido por pulgões.
Folha bandeira: A última folha que se desenvolve na planta de trigo, localizada logo abaixo da espiga. Sua saúde é crucial para o enchimento dos grãos, e sua coloração amarelada é um sintoma chave do nanismo amarelo.
Parasita obrigatório: Um organismo, como um vírus, que só consegue sobreviver e se multiplicar dentro das células de um hospedeiro vivo. Ele “sequestra” a estrutura celular da planta para se reproduzir.
Reboleiras: Manchas ou áreas localizadas na lavoura onde as plantas apresentam sintomas de doença ou desenvolvimento anormal. No caso do mosaico comum, as reboleiras indicam a distribuição irregular do vetor no solo.
SBWMV (Soil-borne wheat mosaic virus): Sigla em inglês para o Vírus do Mosaico Comum do Trigo Transmitido pelo Solo. É o principal agente causador do mosaico, uma doença que provoca estrias amarelas nas folhas e pode reduzir drasticamente a produção de grãos.
Transmissão persistente circulativa: Forma de transmissão de um vírus por um inseto vetor (como o pulgão). Após o inseto se alimentar de uma planta infectada, o vírus circula em seu corpo e ele se torna capaz de transmitir a doença pelo resto da vida.
Vetor: Organismo vivo que transporta e transmite um agente infeccioso (como um vírus) de uma planta para outra. No artigo, o protozoário Polymyza graminis e os pulgões (afídeos) são exemplos de vetores.
Como a tecnologia simplifica o manejo e protege sua lucratividade
Saber o momento exato de intervir, como no controle dos pulgões que transmitem o nanismo amarelo, é crucial para evitar tanto as perdas de produtividade quanto os gastos desnecessários com defensivos. O desafio é conectar o monitoramento no campo com o controle financeiro, garantindo que cada decisão seja rentável.
Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza essas informações. Com ele, você pode registrar as observações de pragas diretamente do talhão pelo celular e planejar as pulverizações com mais eficiência. Ao mesmo tempo, o sistema calcula o custo de cada aplicação, ajudando a entender o impacto financeiro do manejo e a proteger a margem de lucro da sua safra.
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Perguntas Frequentes
Qual a principal diferença entre o Mosaico Comum do Trigo e o Nanismo Amarelo?
A principal diferença está no modo de transmissão e nos sintomas característicos. O Mosaico Comum é transmitido por um protozoário que vive no solo e causa estrias amarelas nas folhas. Já o Nanismo Amarelo é transmitido por pulgões (afídeos), resultando em uma coloração amarelo-brilhante na folha bandeira e no nanismo da planta.
Posso usar fungicidas para controlar as viroses no trigo?
Não, fungicidas são ineficazes contra vírus. O manejo de viroses é sempre preventivo e focado em outros alvos. Para o Nanismo Amarelo, controla-se o inseto vetor (pulgão) com inseticidas, enquanto para o Mosaico Comum, a principal estratégia é o plantio de cultivares resistentes.
Por que a rotação de culturas não é uma medida eficiente contra o Mosaico Comum?
A rotação de culturas não funciona porque o vetor do Mosaico Comum, o protozoário Polymyza graminis, sobrevive no solo por muitos anos em estruturas de resistência, mesmo sem a presença do trigo. Ele permanece dormente até encontrar um hospedeiro e condições favoráveis, reiniciando a infecção na lavoura.
Se eu notar folhas amareladas no meu trigo, é sempre um sintoma de virose?
Não necessariamente. O amarelecimento pode ser causado por muitos fatores, como deficiências nutricionais (especialmente de nitrogênio), estresse hídrico ou outras doenças fúngicas. Para suspeitar de virose, observe o padrão dos sintomas (estrias paralelas ou amarelecimento intenso na folha bandeira) e a presença de vetores. Um diagnóstico preciso pode exigir análise laboratorial.
Qual o momento ideal para controlar os pulgões e evitar o Nanismo Amarelo?
O controle químico dos pulgões é recomendado quando a infestação atinge o nível de ação, que é, em média, 10% das plantas com a presença do inseto. O monitoramento deve ser constante desde o início do desenvolvimento da cultura, pois a transmissão do vírus é rápida. O tratamento de sementes com inseticidas também é uma medida preventiva crucial para proteger as plantas jovens.
O Mosaico Comum do Trigo é um problema em todas as regiões produtoras do Brasil?
Não, o Mosaico Comum é mais comum e severo em regiões de clima frio, sendo uma preocupação maior nos estados do Sul do Brasil, como Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. A doença é favorecida por temperaturas amenas, ao redor de 16°C, e solos úmidos, condições menos frequentes nas áreas de cultivo de trigo do Cerrado.
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