As tripes são consideradas pragas secundárias na cultura da soja. Isso significa que, em geral, os prejuízos econômicos que causam não são tão grandes quanto os de outras pragas. No entanto, não se engane: sob certas condições, esses pequenos insetos podem provocar uma grande redução na produtividade, especialmente durante longos períodos de seca e em solos de baixa fertilidade.
O perigo vai além da alimentação. Essa praga pode transmitir viroses perigosas e suas picadas deixam lesões que servem como porta de entrada para outros problemas, como fungos e bactérias.
Neste artigo, vamos detalhar as características das tripes, os danos que elas causam e os pontos-chave para você tomar a decisão certa na hora de controlar essa praga na sua lavoura.
O que são tripes? Conhecendo a biologia da praga
As tripes são insetos minúsculos da família Thripidae, que inclui mais de 290 gêneros e duas mil espécies. Sua cor pode variar bastante, aparecendo em tons de marrom, branco, bege, amarelo ou preto. Na soja, as espécies mais comuns são a Caliothrips brasiliensis, a C. phaseoli e a Frankliniella schultzei.
O ciclo de vida começa com os ovos, de onde saem as ninfas (fase jovem do inseto), que já são parecidas com os adultos. Uma parte importante do seu desenvolvimento acontece no solo, o que pode dificultar o controle.
Elas preferem se esconder em locais protegidos, como folíolos (as pequenas folhas que compõem uma folha de soja) novos e na parte de baixo das folhas mais velhas. O ciclo de ninfa para adulto é rápido, levando de oito a nove dias.
Para se alimentar, as tripes usam seu aparelho bucal raspador. Elas raspam a superfície da folha, sugam a seiva e, como resultado, o tecido da planta morre naquele local. Fisicamente, possuem um corpo alongado, asas com franjas e medem de 1 mm a 3 mm de comprimento.
Corpo característico das tripes: alongado e um par de antenas.
(Fonte: SOSA-GOMEZ et al., 2013)
Caliothrips brasiliensis e Caliothrips phaseoli
Estas duas espécies são encontradas com mais frequência nas lavouras de soja do Sul do Brasil.
A Caliothrips phaseoli é uma espécie [polífaga]: significa que ataca diversas espécies de plantas. Ela causa danos em culturas importantes como feijão, soja e outras fabáceas (plantas da mesma família do feijão).
Já a Caliothrips brasiliensis também causa prejuízos em algodão, feijão, soja, amendoim e ervilha.
Os adultos de ambas as espécies medem cerca de 1 mm e têm uma coloração amarelada. Tanto as ninfas quanto os adultos se alimentam da seiva, fazendo com que as plantas fiquem amareladas, deformadas e sofram com a queda prematura das folhas.
Quando as tripes atacam junto com outras pragas, como os ácaros, os danos são ainda maiores. Estudos registraram uma queda de 50% na taxa de fotossíntese da planta nessas condições.
Para se ter uma ideia do prejuízo, a presença de 73 tripes por folíolo na fase R5 (início do enchimento dos grãos) pode causar uma perda de 17% na produtividade da lavoura.
Danos da Caliothrips brasiliensis na soja: adulto (a), ninfa (b) e os sintomas de raspagem com manchas prateadas nas folhas (c).
(Fonte: SALVADORI et al., 2007)
Frankliniella schultzei
Esta espécie tem sido registrada com alta frequência em infestações no oeste da Bahia.
A fêmea da Frankliniella schultzei coloca seus ovos dentro do tecido das folhas. Em média, a eclosão acontece quatro dias depois.
Durante seu ciclo de vida, uma única fêmea pode colocar de 20 a 139 ovos. O ciclo completo dura de 9 a 18 dias, dependendo do calor e da umidade. Em temperaturas mais altas, o ciclo se completa mais rápido, aumentando a população da praga.
Tanto os adultos quanto as ninfas causam danos ao raspar a superfície das folhas. Eles também podem atacar as flores, o que causa esterilidade e deixa as flores com uma coloração avermelhada.
O pico populacional dessa tripes ocorre na fase reprodutiva da soja, tornando o monitoramento prévio indispensável para evitar perdas.
Vista dorsal de um adulto da espécie Frankliniella schultzei.
(Fonte: KAKKAR et al., 2010)
Identificação e Danos Causados pelas Tripes na Soja
Quando o controle das tripes não é feito de forma adequada, as perdas de produtividade podem variar de 10% a 25%.
De forma geral, os danos visíveis são lesões em faixas ou estrias de cor escura ao longo do caule e das vagens, o curvamento dos ponteiros da planta e um bronzeamento das folhas, além das manchas prateadas características.
As tripes são facilmente disseminadas pelo vento. Embora os adultos tenham asas, sua capacidade de voo é considerada baixa, então o vento é o principal meio de transporte para longas distâncias.
Ataque de tripes em lavoura de soja.
(Fonte: Manual de Pragas da Soja)
Danos diretos
O dano direto mais comum são as manchas esbranquiçadas na parte superior da folha, com áreas de coloração prateada. Com o tempo, essas manchas evoluem para um tom bronzeado, depois marrom e, por fim, o tecido morre (necrose). É importante notar que diferentes cultivares de soja podem apresentar níveis distintos de dano para a mesma infestação.
Danos indiretos
O principal dano indireto é a transmissão do vírus TSV (tobacco streak virus). Esse vírus causa uma doença chamada “queima-do-broto” na ponta da planta, que pode levar à perda de até 100% da lavoura em casos severos.
O TSV afeta o desenvolvimento da soja, deixando as plantas menores e atrofiadas, o que reduz drasticamente a produtividade. Apenas os insetos adultos são capazes de transmitir o vírus pela área de produção.
Infestação de cravorana, uma planta daninha que serve de abrigo para as tripes.
(Fonte: KLENJI, C. A., 2020)
A maior ocorrência de TSV é relatada nas regiões do Paraná e São Paulo. Isso se deve principalmente à presença de plantas daninhas que servem como hospedeiras para o vírus e para a praga. Plantas como a cravorana (Ambrosia polystachya) permitem que as tripes se reproduzam durante o ano todo.
Sintomas do vírus TSV em soja: lesões escuras em estrias nas vagens (esquerda) e grãos afetados (direita).
(Fonte: MUELLER, D., 2013)
Controle de Tripes na Soja: Quando e Como Fazer
As tripes na soja reduzem a área da folha que faz fotossíntese, atacando principalmente o terço inferior da planta (o “baixeiro”), tanto na fase vegetativa quanto na reprodutiva.
Elas prejudicam o enchimento dos grãos de três maneiras:
- Diminuem a área foliar, reduzindo a produção de energia da planta.
- Causam perda de água pelas lesões nas folhas.
- Aceleram o ciclo da cultura, diminuindo o peso final dos grãos.
Esses danos não só diminuem a produtividade, mas também a qualidade dos grãos, acelerando sua deterioração.
A decisão de controlar as tripes com inseticidas deve levar em conta alguns pontos importantes: a população da praga, o estágio da cultura e os ingredientes ativos disponíveis. Além disso, lembre-se que a reinfestação é rápida, pois o ciclo completo da tripes dura cerca de 15 dias.
Fique de olho na previsão do tempo. Condições de baixa umidade e falta de água favorecem a reprodução da praga. Para controlar o vírus da queima-do-broto, é fundamental remover as plantas daninhas hospedeiras, fazer a rotação de culturas e controlar as tripes, que são o vetor (o inseto que transmite a doença).
A época de semeadura também é estratégica. Programe o plantio para evitar que as fases críticas da soja (do final do vegetativo ao final do enchimento dos grãos) coincidam com períodos de pouca chuva.
8 Pontos Importantes Sobre o Controle de Tripes na Soja
- Nível de Ação: O controle é recomendado com populações altas (acima de 50 tripes por folha). Utilize o método de pano de batida para fazer a contagem.
- Alvo da Aplicação: A pulverização de inseticidas deve atingir a parte de baixo das folhas, onde as tripes costumam se concentrar.
- Fase Reprodutiva: Nesse estágio, seja mais rigoroso. A população deve ser mantida abaixo de 25 tripes por folíolo para evitar perdas.
- Desafios do Controle: O controle é difícil por causa do alto potencial reprodutivo da praga, do curto intervalo entre gerações e das altas populações, especialmente em plantas sob estresse por falta de água.
- Ciclo no Solo: Lembre-se que parte do ciclo de vida da tripes ocorre no solo, o que dificulta a eliminação completa da praga com apenas uma aplicação foliar.
- Monitoramento no Vegetativo: Monitore a população desde cedo para evitar a perda de área foliar, que será essencial para o enchimento dos grãos mais tarde.
- Monitoramento no Reprodutivo: Continue monitorando para evitar a maturação precoce da planta, que encurta a fase de enchimento de grãos e reduz o peso final.
- Cuidado com as Bordaduras: Planeje bem as plantas usadas nas bordas da lavoura. O milho, por exemplo, também é uma planta hospedeira para tripes e não é recomendado como barreira.
Controle Químico: Melhores Inseticidas para Tripes
Além das práticas de manejo, o controle químico, combinado com a detecção precoce da praga antes da fase reprodutiva, é a estratégia mais eficaz.
Produtos com [ação translaminar]: significa que o produto aplicado em um lado da folha consegue atravessar o tecido e atingir o outro lado, onde as pragas se escondem, são os mais indicados. Eles são aplicados na superfície superior das folhas e conseguem alcançar ninfas e adultos abrigados na parte inferior.
Para as três espécies principais de tripes na soja, os ingredientes ativos mais recomendados são:
- Acefato
- Cipermetrina
- Metomil
- Clorfenapir
Você pode consultar os produtos registrados no Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários (Agrofit).
Estudos mostram que o MIP (Manejo Integrado de Pragas) pode ser muito eficiente. Um exemplo é o uso do imidacloprido, que além de controlar tripes, também é eficaz contra percevejo-verde, vaquinha-verde-amarela, mosca-branca, percevejo-marrom e percevejo-verde-pequeno, otimizando a aplicação.
Sempre observe o momento correto, a dose, o intervalo e o número máximo de aplicações recomendadas na bula do produto.
Conclusão
Neste artigo, você viu as características das tripes e os danos diretos e indiretos que elas podem causar na sua lavoura de soja.
Para um controle eficaz, as principais recomendações são:
- Realize o monitoramento constante e planeje bem as culturas que serão implantadas na área.
- Faça a rotação de culturas ao longo do ano agrícola para quebrar o ciclo da praga.
- Mantenha a lavoura no limpo com um bom controle de plantas daninhas, eliminando abrigos para a praga e para o vírus.
Adotar o MIP (Manejo Integrado de Pragas) é uma estratégia inteligente. Além de controlar diversas pragas com menos aplicações, você aumenta a eficiência econômica do seu manejo fitossanitário.
Glossário
Ação translaminar: Propriedade de um defensivo agrícola que, ao ser aplicado em uma face da folha, consegue atravessar os tecidos vegetais e atingir a face oposta. Isso é crucial para controlar pragas como as tripes, que se escondem na parte de baixo das folhas.
Folíolos: As pequenas folhas que, juntas, formam uma folha composta, como a da soja. As tripes costumam se abrigar nos folíolos novos e na parte inferior dos mais velhos.
MIP (Manejo Integrado de Pragas): Estratégia que combina diferentes métodos de controle (químico, biológico, cultural) de forma racional e sustentável. O objetivo é manter as pragas abaixo do nível de dano econômico, em vez de buscar a erradicação.
Ninfas: A fase jovem de certos insetos, como as tripes, que se assemelha ao adulto, mas sem asas desenvolvidas. Nesta fase, as tripes já se alimentam da seiva da planta e causam danos.
Polífaga: Característica de uma praga que se alimenta de diversas espécies de plantas. Espécies de tripes polífagas podem atacar não só a soja, mas também culturas como feijão e algodão, além de plantas daninhas.
Pragas secundárias: Organismos que, na maioria das condições, não causam danos econômicos significativos à cultura. No entanto, sob certas circunstâncias, como seca, sua população pode aumentar e provocar perdas de produtividade.
TSV (Tobacco Streak Virus): Vírus transmitido pelas tripes que causa a doença conhecida como “queima-do-broto” na soja. A infecção pode levar ao atrofiamento da planta e, em casos graves, à perda total da lavoura.
Vetor: Organismo, como um inseto, que transmite um agente causador de doença (patógeno) de uma planta para outra. No artigo, as tripes adultas são o vetor que dissemina o vírus TSV.
Do monitoramento ao controle: como a tecnologia pode ajudar
O controle eficaz das tripes na soja, como vimos, depende de um monitoramento rigoroso e da decisão certa no momento de agir. Anotar as contagens de pragas, comparar com os níveis de ação e, ao mesmo tempo, gerenciar os custos dos inseticidas dentro de uma estratégia de MIP pode ser uma tarefa complexa e manual.
É aqui que a tecnologia se torna uma grande aliada. Um software de gestão agrícola como o Aegro permite registrar os dados do monitoramento diretamente no campo, pelo celular. Isso facilita a análise para decidir o momento ideal da pulverização. Além disso, a plataforma centraliza o controle de estoque de insumos e os custos de cada aplicação, oferecendo uma visão clara da viabilidade econômica do seu manejo e ajudando a otimizar os gastos da safra.
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Perguntas Frequentes
Por que as tripes são consideradas pragas secundárias na soja e quando elas realmente se tornam um problema?
As tripes são classificadas como pragas secundárias porque, na maioria das safras, seus danos não atingem um nível de prejuízo econômico significativo. Elas se tornam um problema sério sob condições específicas, como longos períodos de seca e em solos de baixa fertilidade, quando suas populações podem explodir e causar perdas de produtividade de 10% a 25%.
Qual a diferença entre os danos diretos e indiretos causados pelas tripes na soja?
O dano direto é o prejuízo físico causado pela alimentação do inseto, que raspa as folhas e suga a seiva, deixando manchas prateadas ou bronzeadas que reduzem a fotossíntese. O dano indireto, e mais perigoso, é a transmissão de doenças, principalmente o vírus TSV (tobacco streak virus), que causa a “queima-do-broto” e pode levar à perda total da lavoura.
Qual é o nível de ação para o controle de tripes na soja e como fazer o monitoramento?
O controle químico é recomendado quando a população atinge 50 tripes por folha. No entanto, na fase reprodutiva da soja, o critério é mais rigoroso, devendo-se agir quando houver 25 tripes por folíolo. O monitoramento deve ser feito com o método do pano de batida, focando no terço inferior da planta (“baixeiro”), onde a praga se concentra.
Além dos inseticidas, que outras práticas de manejo integrado ajudam a controlar as tripes?
Práticas de Manejo Integrado de Pragas (MIP) são fundamentais. As principais incluem o controle rigoroso de plantas daninhas, como a cravorana, que servem de hospedeiras para a praga e o vírus. A rotação de culturas também é essencial para quebrar o ciclo de vida da praga entre as safras.
Por que o controle químico das tripes é considerado difícil e qual tipo de inseticida é mais eficaz?
O controle é desafiador devido ao ciclo de vida rápido da praga, seu alto potencial reprodutivo e o fato de parte do seu desenvolvimento ocorrer no solo, fora do alcance de pulverizações foliares. Os inseticidas mais eficazes são os de ação translaminar, pois o produto aplicado na parte de cima da folha consegue atravessar o tecido e atingir as tripes escondidas na parte de baixo.
Como as condições climáticas influenciam a infestação de tripes na soja?
Condições de baixa umidade e falta de chuvas favorecem muito a reprodução das tripes. Durante períodos de estiagem, seu ciclo de vida se acelera, aumentando rapidamente a população. Além disso, as plantas de soja sob estresse hídrico ficam mais suscetíveis e sofrem mais com os danos causados pela praga.
É possível controlar a doença ‘queima-do-broto’ diretamente com fungicidas ou outros produtos?
Não, a ‘queima-do-broto’ é causada por um vírus (TSV), portanto não há produtos que a curem diretamente na planta. A única forma de controle é preventiva, focando em manejar o vetor da doença, que é a tripes. Controlar a população de tripes e eliminar plantas daninhas hospedeiras são as estratégias mais eficazes para impedir a disseminação do vírus.
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