Se você é produtor rural e tem o costume de guardar sementes para a próxima safra, precisa ficar atento. O decreto 10.586/2020, que entrou em vigor em 21 de março de 2021, trouxe mudanças importantes sobre as sementes salvas.
As novas regras buscam simplificar alguns processos e facilitar a vida no campo. No entanto, elas também estabelecem punições mais rigorosas, fazendo uma clara diferença entre quem usa semente salva legalmente e quem produz sementes de forma ilegal.
Quer entender exatamente o que mudou e como se adequar? Continue a leitura e veja nosso guia completo.
O que são, exatamente, as sementes salvas?
De forma simples, sementes salvas são aquelas que o produtor reserva da sua própria colheita para plantar exclusivamente na safra seguinte. É importante destacar que essas sementes não podem ser vendidas ou trocadas.
O processo funciona assim: primeiro, você compra sementes certificadas de uma empresa registrada no Renasem ([Registro Nacional de Sementes e Mudas]: órgão do MAPA que fiscaliza a produção e o comércio de sementes). Com essas sementes, você forma sua lavoura. Depois da colheita, você pode guardar uma parte da produção para usar como semente no próximo plantio.
Guardar parte da produção é um direito seu, garantido por lei. Contudo, é fundamental seguir as regras da legislação, que agora foram atualizadas. Vamos detalhar as principais mudanças.
Quais são as principais alterações na lei de sementes salvas?
O novo decreto trouxe atualizações em pontos cruciais como prazos, documentação, identificação e a famosa “reserva técnica”. Vamos analisar cada um deles.
1. Prazo maior para análise de germinação
Uma das primeiras mudanças beneficia diretamente o produtor. O prazo para solicitar ao MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) a amostragem para verificar o índice de germinação das sementes compradas foi ampliado.
- Antes: O produtor tinha até 10 dias após o recebimento.
- Agora: O prazo foi estendido para até 20 dias.
Atenção: Para fazer a solicitação, é preciso apresentar uma justificativa e garantir que a embalagem da semente não foi violada.
2. Documentação obrigatória
A regra de manter a documentação da compra das sementes continua valendo e é essencial para a fiscalização. Você deve guardar a nota fiscal original de aquisição da semente. No entanto, a nova legislação ainda precisa definir em norma complementar quais outros documentos serão necessários e por quanto tempo eles deverão ser arquivados.
3. Identificação e local de armazenamento
O decreto anterior não era específico sobre como as sementes salvas deveriam ser identificadas. Agora, a regra é clara: a semente reservada pelo produtor precisa ser devidamente identificada no seu local de armazenamento. Os detalhes exatos sobre como essa identificação deve ser feita (etiquetas, placas, etc.) também serão publicados em uma norma complementar futura.
4. Declaração de área para todas as cultivares
Essa é uma mudança significativa. Antes, apenas as áreas destinadas à produção de cultivares protegidas ([cultivares com direitos de propriedade intelectual]: ou seja, que exigem pagamento de royalties) precisavam ser declaradas.
Com a nova lei, a declaração de área se tornou obrigatória para TODAS as cultivares, incluindo:
- Cultivares protegidas: Aquelas que possuem proteção de propriedade intelectual.
- Cultivares de domínio público: Aquelas que não têm restrição de uso e podem ser multiplicadas livremente.
Entendendo a nova “Reserva Técnica”
Outra alteração fundamental do decreto 10.586/2020 está na chamada reserva técnica.
- Como era antes: A quantidade de sementes que você podia guardar era calculada apenas com base na área exata que planejava plantar na safra seguinte.
- Como ficou agora: O novo decreto autoriza o produtor a manter uma reserva técnica, ou seja, uma quantidade de sementes maior do que a necessária para o plantio inicial.
Essa atualização é uma segurança a mais, permitindo que você tenha sementes de propagação disponíveis caso precise fazer a ressemeadura ([plantar novamente]: em áreas onde a germinação falhou ou a lavoura foi perdida).
Ponto importante: O percentual exato permitido para essa reserva técnica vai variar conforme a espécie cultivada e ainda será divulgado em normas futuras.
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Punições: O que acontece se as regras não forem seguidas?
O novo decreto é mais rígido e deixa claro que o descumprimento das regras pode enquadrar o produtor como produtor ilegal de sementes. Isso o sujeita a penalidades administrativas, civis e financeiras.
Para evitar problemas, lembre-se das regras de ouro:
- Uso exclusivo: As sementes salvas só podem ser plantadas dentro da sua propriedade.
- Safra seguinte: Devem ser utilizadas exclusivamente na safra seguinte à da colheita.
- Quantidade correta: A quantidade guardada deve ser compatível com a área a ser plantada, seguindo as recomendações técnicas da cultura.
- Reserva técnica no limite: O percentual da reserva técnica não pode ultrapassar o que for estabelecido na legislação para a sua cultura.
Para facilitar, veja um resumo das principais mudanças:
(Fonte: adaptado de Sistema Faep)
Como armazenar sementes salvas com segurança?
Após o beneficiamento, as sementes precisam ser armazenadas corretamente para manter sua qualidade. As opções mais comuns incluem sacos de papel, polipropileno, juta ou os big bags.
Armazenamento de sementes em sacos de papel.
(Fonte: Cocari)
Armazenamento de sementes em sacos tipo big bag.
(Fonte: Sementes São Francisco)
Outra alternativa são os silos de madeira com sistema de ventilação, que ajudam a conservar as sementes por mais tempo.
Silos de madeira utilizados no armazenamento de sementes.
(Fonte: Sementes Simão)
Os contêineres também são uma opção eficiente. Suas principais vantagens são serem herméticos (totalmente fechados), de fácil higienização e poderem ser movidos de um local para outro sem prejudicar as sementes.
Container dry utilizado para armazenamento de sementes.
(Fonte: Miranda Container)
Lembre-se: a escolha do método de armazenamento deve levar em conta as características de cada semente, os custos envolvidos e a tecnologia que você tem disponível.
9 Dicas práticas para o armazenamento correto de sementes
Para garantir a qualidade do seu material, siga estas orientações:
- Escolha um local seco e arejado para o seu armazém.
- Controle e monitore a temperatura e a umidade do ambiente. A regra geral para conservar sementes é manter o ambiente com baixa temperatura e baixa umidade, sempre respeitando as necessidades de cada espécie.
- Mantenha os sacos de sementes sobre estrados (pallets), evitando o contato direto com o chão.
- Identifique todas as sementes por lotes para não haver misturas e facilitar o controle.
- Evite pilhas de sacos muito altas e mantenha uma distância das paredes e do telhado para permitir a circulação de ar.
- Proteja as sementes do contato direto com a luz solar, que pode danificar o embrião.
- Não armazene sementes no mesmo local que outros insumos como adubos, defensivos agrícolas ou ração.
- Controle a presença de insetos e roedores no armazém e em seus arredores.
- Mantenha o local sempre limpo, organizado e bem sinalizado para evitar acidentes e contaminações.
Conclusão
A semente é um organismo vivo, e seu armazenamento exige cuidados específicos para garantir sua viabilidade.
Seguir as condições corretas de armazenamento, junto com um manejo adequado, é o primeiro passo para garantir o bom desenvolvimento inicial da sua lavoura. Isso resulta em um estande de plantas uniforme, fator decisivo para alcançar altas produtividades.
Diante das novas regras, é fundamental estar atualizado. Como vimos, algumas informações mais específicas ainda serão publicadas em normas complementares, sem data prevista. Enquanto isso, siga as diretrizes do decreto atual para garantir que sua prática de salvar sementes esteja 100% legal e evitar qualquer penalidade.
Glossário
Cultivares de domínio público: Variedades de plantas que não possuem restrição de propriedade intelectual. Podem ser multiplicadas e utilizadas livremente pelos produtores rurais, sem a necessidade de pagamento de royalties.
Cultivares protegidas: Variedades de plantas registradas e amparadas por leis de propriedade intelectual. Seu uso e multiplicação exigem autorização e, geralmente, o pagamento de royalties ao desenvolvedor da tecnologia.
Índice de germinação: Medida percentual que indica a capacidade de um lote de sementes de germinar sob condições controladas. É um dos principais indicadores da qualidade e vigor das sementes.
MAPA: Sigla para Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Órgão do governo federal brasileiro responsável pela gestão e fiscalização das políticas para o agronegócio, incluindo a legislação de sementes.
Renasem: Sigla para Registro Nacional de Sementes e Mudas. Cadastro obrigatório junto ao MAPA para todas as pessoas físicas ou jurídicas que produzem, beneficiam, embalam ou comercializam sementes e mudas no Brasil.
Reserva técnica: Quantidade adicional de sementes que o produtor é autorizado a guardar, além do volume necessário para o plantio da safra seguinte. Essa reserva serve como uma segurança para a ressemeadura, caso ocorram falhas na lavoura.
Ressemeadura: Ato de realizar um novo plantio em uma área onde a germinação falhou ou a lavoura inicial foi perdida devido a problemas climáticos, pragas ou doenças.
Sementes salvas: Sementes que o agricultor reserva da sua própria colheita para utilizar exclusivamente como semente no plantio da safra seguinte, dentro de sua própria propriedade. A comercialização ou troca dessas sementes é proibida.
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Lidar com as novas exigências da legislação de sementes salvas, como a declaração de área e a correta identificação do estoque, exige um nível de organização que pode ser complexo de manter em planilhas ou cadernos. Um erro no controle da quantidade armazenada ou a perda de uma nota fiscal podem resultar em penalidades severas.
É aqui que um software de gestão agrícola como o Aegro faz a diferença. Com a funcionalidade de gestão de estoque, você pode registrar a entrada das sementes colhidas, controlar a quantidade exata destinada à próxima safra — incluindo a reserva técnica — e dar baixa no momento do plantio. Isso não só garante a conformidade com a lei, mas também evita perdas e otimiza o uso dos seus recursos. Além disso, a plataforma centraliza todos os documentos importantes, como as notas fiscais, facilitando a comprovação da origem das sementes durante uma fiscalização.
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Perguntas Frequentes
O que é a ‘reserva técnica’ permitida pela nova lei de sementes salvas?
A reserva técnica é uma quantidade adicional de sementes que o produtor pode guardar, além do volume exato necessário para o plantio da próxima safra. Sua finalidade é servir como uma segurança para a ressemeadura em caso de falhas na germinação ou perda da lavoura, garantindo que o produtor tenha material de propagação disponível sem precisar comprar mais sementes.
Preciso declarar a área de plantio mesmo que eu utilize cultivares de domínio público?
Sim, essa é uma das mudanças mais importantes do decreto 10.586/2020. Anteriormente, a declaração de área era obrigatória apenas para cultivares protegidas (com royalties). Agora, a exigência vale para TODAS as cultivares, incluindo as de domínio público, visando um maior controle e rastreabilidade da produção.
Posso vender ou trocar o excedente das minhas sementes salvas com um vizinho?
Não, de forma alguma. A legislação é muito clara ao proibir a venda, troca ou qualquer tipo de repasse de sementes salvas a terceiros. Elas devem ser usadas exclusivamente na propriedade do agricultor que as produziu e apenas na safra seguinte. A comercialização configura produção de semente pirata, sujeita a penalidades.
Quais documentos são essenciais para comprovar a legalidade das minhas sementes salvas?
O documento fundamental é a nota fiscal original de compra das sementes certificadas que originaram sua lavoura. Guardar essa nota é crucial para comprovar a origem lícita do material durante uma fiscalização. A legislação prevê a publicação de normas complementares que podem detalhar outros documentos necessários.
Qual a principal diferença entre semente salva e semente pirata?
A semente salva é aquela que o produtor reserva legalmente da sua própria colheita (originada de sementes certificadas) para uso exclusivo em sua propriedade. Já a semente pirata é produzida e comercializada ilegalmente, sem registro, certificação ou garantia de qualidade, o que constitui crime e representa um risco fitossanitário e de produtividade para a lavoura.
Como devo identificar e armazenar minhas sementes salvas para cumprir a lei?
A nova lei exige que as sementes salvas sejam devidamente identificadas no local de armazenamento. Uma boa prática é utilizar etiquetas ou placas informando a cultivar, a safra e a indicação de ‘uso próprio’. Além disso, armazene-as em local seco, arejado, protegido da luz solar e separado de outros insumos, como defensivos e fertilizantes.
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