Percevejo-Castanho-da-Raiz: Guia Completo de Identificação e Controle

Engenheira agrônoma, mestre e doutora em Ciências/Entomologia. Atualmente na gestão acadêmica do SolloAgro.
Percevejo-Castanho-da-Raiz: Guia Completo de Identificação e Controle

Lidar com pragas subterrâneas pode ser um grande desafio, principalmente porque elas atacam de forma silenciosa e podem causar sérios prejuízos antes mesmo de serem notadas. Uma dessas ameaças é o percevejo-castanho-da-raiz, um inseto que tem se tornado cada vez mais frequente em diversas lavouras.

Essa praga ataca culturas de grande importância econômica, como soja, milho, sorgo, algodão, café, arroz e pastagens, entre muitas outras.

Para se ter uma ideia do potencial de dano, no Mato Grosso do Sul, por exemplo, já foram registrados casos de perdas de até 100% em pastagens por causa dos ataques do percevejo-castanho.

Então, como evitar ser pego de surpresa por esse inimigo silencioso? Neste guia, vamos detalhar tudo o que você precisa saber para identificar e controlar essa praga de forma eficaz.

Como Identificar o Percevejo-Castanho-da-Raiz?

Como o nome já indica, este percevejo vive debaixo da terra e se alimenta das raízes das plantas. Ele utiliza seu aparelho bucal sugador para perfurar o tecido da raiz e alimentar-se da seiva.

Ao fazer isso, o inseto injeta toxinas que causam uma série de problemas para a planta:

  • Redução do crescimento;
  • Enfraquecimento geral;
  • Amarelecimento das folhas;
  • Murcha, mesmo com o solo úmido.

A espécie que tem causado os danos mais expressivos de norte a sul do Brasil, especialmente no Cerrado, é a Scaptocoris castanea.

Características Físicas:

  • Ninfas (fase jovem): Passam por 5 estágios (ínstares) e têm uma cor branco-leitosa no início.
  • Adultos: Medem cerca de 8 mm de comprimento e possuem uma coloração marrom-clara.
  • Destaque: Suas pernas dianteiras são do tipo escavadoras, uma adaptação que permite ao inseto se mover com facilidade dentro do solo.

Por ser uma praga polífaga (que se alimenta de muitas plantas diferentes), ela pode permanecer na sua área mesmo depois da colheita. Plantas daninhas ou restos culturais podem servir de alimento, garantindo a sobrevivência do percevejo para a próxima safra.

infográfico detalhado que ilustra o ciclo de vida de uma praga agrícola, provavelmente a pérola-da-terra (Eurhi Ciclo do percevejo-castanho (Foto:J. M. S. Bento)

Entendendo o Comportamento do Percevejo-Castanho

Para encontrar e controlar o percevejo-castanho, é fundamental entender como ele se comporta de acordo com o clima, principalmente a umidade do solo.

  • Em épocas chuvosas: Os percevejos ficam na camada mais superficial do solo, atacando as raízes em reboleiras (ataques concentrados em manchas na lavoura). É neste período que ocorrem as revoadas dos adultos, que servem para acasalamento e dispersão. Após a cópula, as fêmeas voam para novas áreas para colocar seus ovos e iniciar um novo ciclo.
  • Em épocas secas: A falta de umidade faz com que os percevejos se aprofundem no solo. Eles podem descer para camadas que variam de 50 cm a até 2 metros de profundidade, tornando sua detecção e controle muito mais difíceis.

Com essa informação, fica mais fácil planejar o momento certo para o monitoramento, não é mesmo? O período chuvoso é a sua janela de oportunidade.

close-up detalhado do sistema radicular de uma planta recém-retirada do solo. As raízes e o torrão de terra Ninfas e adultos de Scaptocoris castanea (Foto: Ivan Cruz em Defesa Vegetal)

Estratégias de Controle do Percevejo-Castanho

De forma geral, o controle de pragas subterrâneas costuma ser mais caro e complexo do que o controle de pragas que atacam a parte aérea das plantas. No caso do percevejo-castanho, a capacidade de se aprofundar no solo complica ainda mais a situação.

Por isso, a melhor abordagem é utilizar diferentes táticas do Manejo Integrado de Pragas (MIP). Combinar várias estratégias é a chave para reduzir a população do inseto de forma eficiente.

1. Amostragens e Monitoramento

O controle se torna muito difícil depois que a praga já está instalada. Portanto, a prevenção e a detecção precoce são essenciais. Conhecer o histórico da área é o primeiro passo.

Se já houve surtos de percevejo-castanho na área, sua atenção deve ser redobrada.

  1. Quando monitorar? Faça o monitoramento durante os períodos chuvosos, quando a praga está na parte superficial do solo.
  2. Como monitorar? Realize amostragens abrindo trincheiras ou covas de 30 cm x 30 cm x 50 cm de profundidade.
  3. E em solo seco? Se precisar amostrar com o solo seco, considere abrir covas mais profundas, de até 1,5 m, pois o inseto pode ter migrado para camadas inferiores.

Ainda não existe um nível de dano econômico preciso, mas a literatura técnica indica que a presença de 24 a 40 percevejos por metro linear já é suficiente para causar perdas significativas na produção.

uma cena detalhada do processo de plantio agrícola. Em primeiro plano, vemos um solo de cor avermelhada, carac Amostragem de solo com percevejo-castanho em café (Fonte: Marcelo Jordão Filho e José Braz Matiello)

composição de duas fotos, A e B, que ilustram o problema do ’tombamento’ em uma lavoura de algodão. A foto A m A) Foco localizado de algodoeiro atacado por percevejo castanho; B) Plantas com sintomas de ataque de percevejo castanho (à esquerda, em destaque) ao lado de planta normal (à direita) (Fonte: José Ednilson Miranda, Circular técnica 138)

2. Controle Cultural

Medidas preventivas são a forma mais inteligente de evitar perdas. Elas devem ser aplicadas quando o solo estiver úmido, para atingir os percevejos nas camadas superficiais.

Considere as seguintes táticas de controle cultural:

  • Preparo do solo: A aração com aiveca ajuda a revolver o solo, expondo ninfas e adultos ao sol e a predadores.
  • Nutrição de plantas: Solos bem manejados, com adubação equilibrada de Cálcio (Ca) e Fósforo (P), promovem um bom desenvolvimento das raízes, tornando as plantas mais tolerantes ao ataque.
  • Qualidade da semente: Utilize sementes de boa qualidade e alto vigor para garantir um estabelecimento rápido da lavoura.
  • Manejo da semeadura: Realize o tratamento de sementes com produtos registrados e, se possível, antecipe a época de semeadura.

3. Controle Químico

O controle químico para o percevejo-castanho é limitado e pode ser feito no sulco de semeadura ou via tratamento de sementes. A principal dificuldade é que existem poucos inseticidas registrados no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) para esta praga.

A baixa eficiência é um grande obstáculo, pois os inseticidas aplicados no solo geralmente não passam de 15 cm de profundidade, o que diminui a chance de atingir o inseto.

De acordo com o site do Agrofit, alguns dos produtos registrados são:

CulturaProduto ComercialIngredientes Ativos (Grupo Químico)
Algodão e MilhoCounter 150 GTerbufós (Organofosforado)
MilhoDurivoClorantraniliprole (Diamida) + Tiametoxam (Neonicotinoide)

Importante: Consulte sempre um(a) engenheiro(a) agrônomo(a) para a recomendação correta e segura dos produtos.

4. Controle Biológico do Percevejo-Castanho

O controle biológico que ocorre naturalmente no campo, por meio de inimigos naturais, não é suficiente para controlar altas populações desta praga.

No entanto, uma alternativa viável é o uso do fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae.

Fungo entomopatogênico: significa um fungo que causa doenças em insetos, agindo como um controle natural.

Este fungo tem registro no MAPA para todas as culturas através do produto comercial Meta turbo SC. Assim como os inseticidas químicos, ele deve ser aplicado no sulco de semeadura ou com jato dirigido na base das plantas para entrar em contato com a praga.

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Conclusão

O percevejo-castanho é uma praga séria que pode comprometer sua produção se não for manejada corretamente. Como vimos, o controle é desafiador, mas totalmente possível com a estratégia certa.

Para resumir, lembre-se destes pontos-chave:

  • Conheça sua área: O histórico de infestações é sua primeira ferramenta de defesa.
  • Monitore na hora certa: A umidade do solo dita onde o percevejo está. Aproveite os períodos chuvosos para encontrá-lo na superfície.
  • Não dependa de uma única solução: O controle químico sozinho não é suficiente.
  • Integre as táticas: A combinação de monitoramento, controle cultural, biológico e químico (MIP) é o caminho mais seguro e eficaz para proteger sua lavoura e sua rentabilidade.

Adotando uma abordagem integrada, seu controle será muito mais preciso e os resultados, mais consistentes.

Referências Avila, C.J., Xavier, L.M.S. and Santos, V., 2016. Fluctuation and vertical distribution of a population of brown root stink bug Scaptocoris castanea (Hemiptera: Cydnidae) in the soil profile in Mato Grosso do Sul State, Brazil. Embrapa Agropecuária Oeste-Artigo em periódico indexado (ALICE).

Souza, C.P.R., Turchen, L.M., Cossolin, J.F.S. and Pereira, M.J.B., 2019. Flight dispersion in field and reproductive status of Scaptocoris castanea Perty (Hemiptera: Cydnidae). EntomoBrasilis, 12(1), pp.44-46.


Glossário

  • Aração com aiveca: Tipo de preparo profundo do solo em que uma lâmina (aiveca) revolve e inverte a camada de terra. Esta prática expõe pragas subterrâneas, como o percevejo-castanho, ao sol e a predadores.

  • Fungo entomopatogênico: Micro-organismo que causa doenças em insetos, agindo como um agente de controle biológico. O Metarhizium anisopliae, citado no artigo, é um exemplo que infecta e mata o percevejo-castanho no solo.

  • Ínstares: As diferentes fases de desenvolvimento de uma ninfa (fase jovem do inseto) entre as trocas de pele (mudas). O percevejo-castanho passa por cinco ínstares antes de se tornar adulto.

  • Manejo Integrado de Pragas (MIP): Estratégia que combina diferentes métodos de controle (cultural, biológico e químico) de forma harmônica. O objetivo é manter as pragas abaixo do nível de dano econômico, de maneira sustentável.

  • Polífaga: Característica de uma praga que se alimenta de diversas espécies de plantas. O percevejo-castanho é polífago, pois ataca soja, milho, algodão, pastagens, entre outras culturas, o que facilita sua sobrevivência na área.

  • Reboleiras: Padrão de ataque de pragas ou doenças que se manifesta em manchas ou áreas concentradas na lavoura. O percevejo-castanho costuma atacar em reboleiras, causando falhas localizadas no stand de plantas.

  • Scaptocoris castanea: Nome científico da principal espécie de percevejo-castanho-da-raiz que causa danos significativos na agricultura brasileira, especialmente em áreas de Cerrado.

Veja como o Aegro pode ajudar a superar esses desafios

O controle do percevejo-castanho, como detalhado no artigo, exige um Manejo Integrado de Pragas (MIP) bem executado, desde o monitoramento no momento certo até o registro de cada ação. Coordenar tudo isso pode ser complexo. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza essas informações, permitindo que você registre os dados de amostragem direto do campo pelo celular e planeje as aplicações de defensivos ou produtos biológicos com mais precisão. Ao registrar cada atividade, o sistema também calcula automaticamente os custos operacionais, mostrando exatamente quanto está sendo investido no controle da praga e ajudando a garantir que o manejo seja não apenas eficaz, mas também rentável.

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Perguntas Frequentes

Qual é o melhor momento para monitorar o percevejo-castanho-da-raiz e por quê?

O melhor momento para o monitoramento é durante os períodos chuvosos. Nessa época, a umidade faz com que a praga permaneça nas camadas mais superficiais do solo (até 50 cm), facilitando sua detecção em amostragens. Durante a seca, os percevejos migram para profundidades de até 2 metros, tornando a identificação muito mais difícil.

Quais são os principais sinais de um ataque do percevejo-castanho na lavoura?

Os principais sinais são o amarelecimento das folhas, a redução no crescimento e a murcha das plantas, mesmo com o solo úmido. Como o ataque ocorre nas raízes, esses sintomas são reflexo da dificuldade da planta em absorver água e nutrientes. É comum observar esses danos em manchas isoladas, conhecidas como ‘reboleiras’.

Por que o controle químico do percevejo-castanho é tão desafiador?

O controle químico é desafiador porque a praga vive no subsolo, muitas vezes em profundidades que os inseticidas aplicados no sulco não conseguem alcançar (geralmente não passando de 15 cm). Além disso, há um número limitado de produtos químicos registrados no MAPA para essa praga específica, o que restringe as opções de manejo.

O que significa dizer que o percevejo-castanho é uma praga polífaga e qual a implicação disso?

Ser uma praga polífaga significa que ela se alimenta de uma grande variedade de plantas, incluindo soja, milho, algodão e até plantas daninhas. A principal implicação é que, mesmo após a colheita da cultura principal, o percevejo pode sobreviver na área se alimentando de restos culturais ou plantas invasoras, infestando a safra seguinte.

Se o percevejo vive no solo, como ele se espalha para novas áreas da fazenda?

A dispersão para novas áreas ocorre principalmente pelas revoadas dos adultos. Durante a estação chuvosa, os percevejos adultos emergem do solo para o acasalamento. Após a cópula, as fêmeas voam para outros locais para depositar seus ovos, iniciando novos focos de infestação na lavoura ou em áreas vizinhas.

O controle biológico com o fungo Metarhizium anisopliae substitui o uso de inseticidas?

O uso do fungo Metarhizium anisopliae é uma excelente ferramenta de controle biológico, mas funciona melhor como parte de uma estratégia de Manejo Integrado de Pragas (MIP). Ele não necessariamente substitui o controle químico, mas o complementa, atuando em conjunto com práticas culturais e, quando necessário, com o uso de químicos para reduzir a população da praga de forma mais sustentável e eficaz.

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