Necrose da Haste da Soja: Guia Completo para Identificar e Manejar a Doença

Engenheira agrônoma, mestre e doutora em Fitopatologia.
Necrose da Haste da Soja: Guia Completo para Identificar e Manejar a Doença

A cultura da soja é um dos pilares do agronegócio brasileiro, com uma safra estimada em 115 milhões de toneladas para 2018/19, segundo dados da Conab.

No entanto, diversos fatores podem comprometer essa produtividade, e as doenças representam uma ameaça constante. Entre elas, uma que exige atenção especial é a necrose da haste da soja, uma doença com alto potencial para causar prejuízos significativos na lavoura.

Para evitar perdas, é fundamental entender como identificar corretamente essa doença e quais são as principais medidas de manejo.

Por isso, preparamos este material completo em parceria com o Agronômica Laboratório de Diagnóstico Fitossanitário e Consultoria, com a colaboração da Dra. Tatiana Mituti, para esclarecer todas as suas dúvidas sobre o assunto.

o logotipo da empresa ‘Agronômica’. O design é composto pelo nome da empresa em uma fonte sans-serif moderna,

O Que é a Necrose da Haste da Soja e Qual a Sua Importância?

A necrose da haste da soja é uma doença viral provocada pelo Cowpea mild mottle virus (CpMMV), um vírus do gênero Carlavirus.

Embora hoje seja uma preocupação para a soja, essa virose foi identificada pela primeira vez no Brasil em lavouras de feijão, na cultivar Jalo, ainda em 1979. A detecção na cultura da soja ocorreu bem mais tarde, durante a safra 2000/01.

Desde então, a doença se tornou um ponto de atenção, pois pode causar prejuízos expressivos se as medidas de manejo corretas não forem aplicadas.

Principais Plantas Hospedeiras

O vírus CpMMV afeta principalmente plantas da família das leguminosas. Os dois hospedeiros mais importantes e economicamente relevantes são:

  • Soja
  • Feijão (onde causa a doença conhecida como mosaico angular do feijoeiro)

Como a Doença se Espalha pela Lavoura?

Entender as formas de disseminação é o primeiro passo para um manejo eficaz. A necrose da haste da soja se espalha de duas maneiras principais:

  1. Pelo Inseto Vetor (Mosca-Branca): A principal forma de transmissão é através da mosca-branca (Bemisia tabaci). A disseminação do vírus na área é diretamente proporcional à população deste inseto. Uma mosca-branca infectada com o CpMMV pode voar para outras áreas e espalhar a doença rapidamente.

Esta é uma imagem de microscopia de alta magnificação (50x) que exibe em detalhe uma mosca-branca (Bemisia tabaci) adulta pou Mosca branca, Bemisa tabaci MEAM1 (biótipo B). (Fonte: Arquivo pessoal da autora)

  1. Por Sementes Infectadas: Pesquisas indicam que sementes de soja contaminadas com o vírus também têm o potencial de introduzir a doença na lavoura desde o início do ciclo.

Conhecer esses dois vetores de transmissão é crucial para definir as estratégias de manejo, que veremos mais adiante. Primeiro, vamos aprender a reconhecer os sinais da doença no campo.

Sintomas da Necrose da Haste da Soja: O Que Procurar na Lavoura

Os sintomas causados pelo vírus na planta de soja podem variar, mas os principais sinais a serem observados são:

  • Escurecimento do pecíolo (o “cabinho” da folha) e das nervuras foliares.
  • Clorose e mosaico na folha: significa que a folha apresenta manchas amareladas e um padrão irregular de cores, podendo ter um aspecto de bolhas em sua superfície.
  • Necrose da haste: é o escurecimento e morte dos tecidos da haste, principal sintoma que dá nome à doença.
  • Queima do broto: os brotos novos da planta secam e morrem.
  • Nanismo: a planta não se desenvolve, ficando menor que as plantas sadias.
  • Vagens deformadas e grãos pequenos, impactando diretamente o rendimento.

Quando os Sintomas Ficam Mais Visíveis?

Uma das dificuldades no controle é que, no início, os sintomas podem ser sutis e passar despercebidos. Eles se tornam mais evidentes e severos a partir da floração e no começo da formação das vagens.

Nessa fase, os sintomas de necrose na haste e queima do broto se intensificam. Se a infecção for severa, a doença pode progredir até a morte completa da planta, o que resulta em perdas diretas de produtividade.

composição de três fotografias que exibem em close-up os sintomas de uma doença em uma planta jovem de soja. A Sintomas da infecção do Cowpea mild mottle virus (CpMMV) em soja. A) Necrose sistêmica das nervuras; B) curvatura do broto apical; c) Necrose da haste da soja. (Fonte: Gabriel M. Favara)

Ao cortar a haste de uma planta infectada, é comum observar um escurecimento interno do tecido. No entanto, mesmo com esses sinais, os sintomas podem ser confundidos com os de outras doenças, o que torna o diagnóstico preciso indispensável.

Diagnóstico Correto: A Chave para o Manejo Eficiente

Para ter certeza de que o problema é a necrose da haste, o ideal é realizar uma análise laboratorial, tanto de plantas suspeitas quanto das sementes que serão utilizadas no plantio. O método mais confiável é a análise molecular.

Para isso, é preciso enviar amostras para um laboratório capacitado, como o Agronômica. O processo funciona em três etapas principais:

  1. Extração do Ácido Nucléico (RNA): O material genético do vírus é extraído das folhas ou sementes enviadas.
  2. Análise RT-PCR: A amostra passa por um teste chamado RT-PCR (Transcrição Reversa – reação em cadeia de polimerase). Esse método funciona como uma “fotocopiadora” de material genético, multiplicando o RNA do vírus milhões de vezes até que ele possa ser detectado, mesmo em pequenas quantidades.
  3. Análise dos Resultados: O laboratório confirma a presença ou ausência do vírus na amostra, fornecendo um diagnóstico preciso.

composição de três cenas que ilustram um processo de análise de biologia molecular em um laboratório. À esquer Etapas para extração de ácido nucléico e equipamento utilizado para a RT-PCR, que permite a correta diagnose de doenças em plantas. (Fonte: Laboratório Agronômica)

A análise correta das sementes é especialmente importante, pois evita que você introduza a doença na sua lavoura antes mesmo de começar o plantio.

Medidas de Manejo para a Necrose da Haste da Soja

As principais estratégias de controle para esta doença são preventivas. Isso significa que as ações devem ser tomadas para evitar que a doença se instale e se espalhe na sua lavoura.

As medidas de manejo mais recomendadas são:

  • Uso de cultivares de soja resistentes ou tolerantes: Opte por materiais genéticos que já possuam alguma resistência ao vírus CpMMV. Essa é a primeira linha de defesa.
  • Uso de sementes sadias e certificadas: Garanta a qualidade sanitária do que você está plantando. Sementes certificadas e testadas para a ausência do vírus reduzem drasticamente o risco de iniciar a lavoura com o problema.
  • Controle químico do vetor (mosca-branca): Embora seja uma opção, o controle químico do inseto nem sempre é 100% eficaz para evitar a doença. A transmissão do vírus pela mosca-branca ocorre de forma muito rápida, muitas vezes antes que o inseticida consiga eliminar o vetor. Por isso, essa medida deve ser parte de um manejo integrado.

Lembre-se que o manejo mais eficiente é sempre o integrado, combinando diferentes práticas de controle. Se tiver dúvidas sobre qual cultivar escolher ou qual a melhor estratégia para sua região, consulte um(a) Engenheiro(a) Agrônomo(a) de sua confiança.

Conclusão

A necrose da haste da soja é uma doença que pode causar sérias perdas na produtividade da sua lavoura. Conhecê-la é o primeiro passo para se proteger.

Neste artigo, você aprendeu os pontos mais importantes sobre o tema:

  • A doença é causada pelo vírus CpMMV e transmitida pela mosca-branca e por sementes contaminadas.
  • Os principais sintomas, como necrose da haste e queima do broto, aparecem com mais força após a floração.
  • O diagnóstico laboratorial (RT-PCR) é essencial para confirmar a presença do vírus e evitar confusões com outras doenças.
  • O manejo eficaz é preventivo, focado no uso de cultivares resistentes e sementes sadias.

Com essas informações em mãos, você está mais preparado para adotar um controle preventivo e proteger sua propriedade contra os prejuízos causados pela necrose da haste da soja.


Glossário

  • Clorose: Amarelamento das folhas devido à falta de clorofila. No artigo, é um sintoma visual da doença, indicando que a planta não está saudável e pode estar infectada pelo vírus.

  • CpMMV (Cowpea mild mottle virus): Sigla em inglês para o vírus que causa a necrose da haste da soja. É um microrganismo que infecta as células da planta e prejudica seu desenvolvimento.

  • Cultivar: Uma variedade específica de uma planta (neste caso, soja) desenvolvida por meio de melhoramento genético para possuir características desejáveis. Exemplos são cultivares com maior produtividade ou resistência a doenças.

  • Diagnóstico Fitossanitário: Processo de identificação de doenças, pragas ou outros problemas que afetam a saúde das plantas. É fundamental para determinar a causa de um sintoma e escolher o manejo correto.

  • Inseto Vetor: Um inseto que transporta e transmite um agente causador de doença (como um vírus) de uma planta doente para uma sadia. No texto, a mosca-branca é o principal vetor do vírus CpMMV.

  • Necrose: Morte localizada de tecidos em uma planta, que geralmente se manifesta como manchas escuras, secas ou apodrecidas. Na doença analisada, é o sintoma principal que afeta a haste e dá nome à condição.

  • Pecíolo: Estrutura semelhante a um “cabinho” que conecta a folha ao caule da planta. O escurecimento do pecíolo é um dos primeiros sinais da necrose da haste da soja.

  • RT-PCR (Reação em Cadeia da Polimerase com Transcrição Reversa): Técnica de análise laboratorial molecular de alta precisão usada para detectar o material genético (RNA) de um vírus. Confirma a presença da doença mesmo em estágios iniciais.

Veja como o Aegro pode ajudar a superar esses desafios

O manejo preventivo da necrose da haste, focado principalmente no controle da mosca-branca, exige organização e um acompanhamento rigoroso. Gerenciar as aplicações de defensivos e, ao mesmo tempo, controlar os custos envolvidos pode ser um grande desafio. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza essas informações, permitindo que você planeje, execute e registre todas as atividades de manejo de pragas diretamente no aplicativo. Dessa forma, você não só otimiza o controle do vetor, mas também acompanha em tempo real os custos de produção, garantindo que cada decisão seja tomada com base em dados precisos para proteger a lucratividade da sua lavoura.

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Perguntas Frequentes

Qual é a principal diferença entre a necrose da haste da soja e outras doenças fúngicas que afetam a haste?

A principal diferença é o agente causador. A necrose da haste é causada por um vírus (CpMMV), enquanto muitas outras doenças da haste, como a podridão-de-sclerotinia, são causadas por fungos. Isso é crucial para o manejo, pois fungicidas não têm efeito contra vírus, tornando as medidas preventivas, como o controle do inseto vetor e o uso de sementes sadias, as únicas estratégias eficazes.

Por que o controle químico da mosca-branca nem sempre impede a disseminação da necrose da haste?

A transmissão do vírus pela mosca-branca ocorre de forma muito rápida, muitas vezes durante a picada de prova do inseto na planta. O inseticida pode levar algum tempo para eliminar o vetor, um período que pode ser suficiente para que o vírus já tenha sido transmitido para a planta. Por isso, o controle do vetor deve ser parte de um manejo integrado, e não a única medida de controle.

É possível tratar uma planta de soja que já está com os sintomas da necrose da haste?

Não, infelizmente não existem tratamentos curativos para viroses em plantas cultivadas, incluindo a necrose da haste da soja. Uma vez que a planta é infectada pelo vírus CpMMV, ela permanecerá doente. Todas as estratégias de manejo eficazes são preventivas, focadas em evitar que a infecção ocorra em primeiro lugar.

Qual é o momento mais crítico para a manifestação dos sintomas severos da necrose da haste?

Embora a infecção possa ocorrer mais cedo, os sintomas mais severos e evidentes da necrose da haste, como o escurecimento da haste e a queima dos brotos, geralmente se intensificam a partir do início da floração e durante a formação das vagens. É nesse estágio que a doença causa os maiores impactos na produtividade, podendo levar à morte da planta.

Se eu suspeitar da doença na minha lavoura, qual é o procedimento correto para confirmar o diagnóstico?

O procedimento correto é coletar amostras das plantas com sintomas (folhas e hastes) e enviá-las para um laboratório de diagnóstico fitossanitário. O método mais preciso é a análise molecular por RT-PCR, que detecta o material genético do vírus (RNA) e confirma a presença da doença, evitando confusão com outras patologias de sintomas semelhantes.

O uso de sementes salvas da safra anterior aumenta o risco de ter necrose da haste na lavoura?

Sim, aumenta significativamente o risco. O vírus CpMMV pode ser transmitido por sementes contaminadas. Utilizar sementes não certificadas e sem análise laboratorial prévia é uma das principais formas de introduzir a doença em uma área, comprometendo a lavoura desde o seu estabelecimento.

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