Você já pensou que o Manejo Integrado de Pragas (MIP) na cultura da soja é algo complicado demais para a sua realidade? Muitos produtores compartilham dessa visão, mas a verdade é que existem inúmeros casos de sucesso que provam o contrário.
Embora o MIP exija mais planejamento que o manejo convencional, ele garante maior rentabilidade a longo prazo. Além disso, contribui para uma produção mais sustentável, um diferencial cada vez mais importante no mercado.
Para esclarecer as principais dúvidas, preparamos este guia prático sobre como fazer o MIP na soja. Continue a leitura e descubra como aplicar essa estratégia na sua lavoura.
Por que Fazer o Manejo Integrado de Pragas?
Antes de detalhar o MIP na cultura da soja, é fundamental entender por que essa abordagem se tornou tão importante para a agricultura moderna.
Com a chegada dos inseticidas na década de 1930, o controle de pragas ficou mais rápido, permitindo um grande salto na produção agrícola. No entanto, o uso indiscriminado e sem equilíbrio de pesticidas ao longo das décadas gerou uma série de problemas graves, como:
- Resistência: Pragas-chave se tornaram resistentes aos pesticidas mais comuns.
- Uso irracional: Aplicações preventivas e desnecessárias aumentaram os custos e os impactos negativos.
- Desequilíbrio: Pragas que antes eram secundárias se transformaram nas principais ameaças da cultura.
- Ressurgência: Após a aplicação, as pragas retornam em populações ainda maiores e mais difíceis de controlar.
- Toxicidade: Aumento dos riscos para a saúde humana e para organismos benéficos, como polinizadores e inimigos naturais.
- Contaminação: Resíduos de pesticidas contaminaram o solo, a água e os alimentos.
- Incompatibilidade: Muitos pesticidas são incompatíveis com o controle biológico, eliminando os inimigos naturais das pragas.
Diante desses desafios, pesquisadores propuseram na década de 1960 uma abordagem mais inteligente, que integra diferentes formas de controle além do químico. Assim, o MIP nasceu não apenas para reduzir custos, mas para trazer mais equilíbrio econômico, social e ambiental à produção.
Afinal, o que é o MIP?
O MIP é um conjunto de táticas de controle que devem ser usadas de forma coordenada e harmônica. O objetivo principal é manter a população de pragas abaixo do nível de dano econômico, agindo apenas quando elas atingem o nível de controle.
Para entender melhor:
- Nível de Dano Econômico (NDE): É a quantidade de pragas que causa um prejuízo financeiro maior do que o custo da aplicação do defensivo. Atingir esse nível significa que você já perdeu dinheiro.
- Nível de Controle (NC): É a densidade populacional da praga que serve como um alerta. Ao atingir o NC, você deve tomar uma medida de controle para impedir que a praga chegue ao Nível de Dano Econômico.
É importante ressaltar que o MIP não busca eliminar completamente as pragas da lavoura. O foco é manter as populações em um nível que não cause prejuízo, preservando o equilíbrio do agroecossistema.
Como Começar o MIP da Soja na Prática?
O primeiro passo para implementar o MIP, antes mesmo de pensar em métodos de controle, é conhecer o histórico da sua área. Quais pragas costumam aparecer e causar prejuízos ao longo da safra?
Para responder a essa pergunta, é essencial saber identificar as principais pragas da soja. Com esse conhecimento, você pode iniciar o monitoramento, que é a base de todo o sistema.
O monitoramento precisa se tornar parte da sua rotina. É necessário que, toda semana, você ou sua equipe verifiquem a densidade populacional das pragas na lavoura. Esse acompanhamento constante permite uma tomada de decisão muito mais precisa, escolhendo o método de controle certo, na hora certa.
As ferramentas mais comuns e eficientes para monitorar pragas na soja são o pano de batida e as armadilhas atrativas.
Pano-de-Batida
Com o pano-de-batida, você consegue verificar a presença de:
- Lagartas desfolhadoras: como a lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis) e a falsa-medideira (Chrysodeixis includens).
- Percevejos: como o percevejo marrom e o percevejo verde (Nezara viridula).
- Inimigos naturais: insetos benéficos que ajudam a controlar as pragas.
Com base nessa contagem, você pode calcular se a população atingiu o nível de ação ou se ainda é seguro esperar.
Para facilitar o trabalho, tenha sempre em mãos uma ficha de monitoramento. A Embrapa Soja desenvolveu um modelo prático que pode te auxiliar nesse processo.
Armadilhamento
Outra técnica eficiente é o monitoramento de mariposas, que são a fase adulta das lagartas que atacam a soja. Isso é feito com armadilhas do tipo delta, que utilizam um feromônio específico para atrair e capturar os insetos.
A quantidade de armadilhas por hectare varia conforme a espécie que você está monitorando. Por isso, siga sempre as recomendações do fabricante do feromônio.
Armadilha do tipo delta com uso de feromônio
(Fonte: Governo de Rondônia)
MIP da Soja: Diferentes Métodos para Reduzir as Pragas
Ao longo da safra, seu monitoramento semanal indicará a necessidade de intervir para controlar pragas que se aproximam do nível de dano econômico.
A grande vantagem do MIP é que você pode combinar vários métodos de controle. Abaixo, listamos os principais:
Controle Cultural
O controle cultural envolve práticas agrícolas que criam um ambiente menos favorável às pragas. O melhor de tudo é que essas ações, em geral, também contribuem para aumentar a sua produtividade. Exemplos incluem:
- Escolher sementes de alta qualidade e vigor.
- Realizar uma boa irrigação, evitando estresse hídrico.
- Eliminar restos culturais e plantas daninhas que servem como hospedeiras para os insetos-praga.
Controle Comportamental
Este método utiliza o comportamento natural das pragas contra elas mesmas. Os feromônios, por exemplo, podem ser usados não só no monitoramento, mas também em maior quantidade para confundir os machos e atrapalhar o acasalamento, reduzindo a população futura.
Controle Biológico
O controle biológico na soja tem apresentado resultados excelentes e é um pilar do MIP. Existem duas formas principais de utilizá-lo:
- Controle Biológico Natural: Consiste em conservar os inimigos naturais já presentes na área, evitando o uso de inseticidas de amplo espectro que os eliminam.
- Controle Biológico Inundativo: Envolve a liberação massiva de organismos benéficos comprados de biofábricas. Exemplos comuns são os microhimenópteros Trichogramma pretiosum (para controle de ovos de mariposas) e Trissolcus basalis (para controle de ovos de percevejos).
Outro exemplo de sucesso é o uso do Baculovirus para controlar a Helicoverpa armigera, evitando surtos severos como os que ocorreram na safra 2012/2013.
Controle Utilizando Plantas Resistentes
O uso de plantas transgênicas (soja Bt) é uma ferramenta muito eficaz para combater as principais lagartas desfolhadoras. No entanto, para que essa tecnologia continue funcionando a longo prazo, é fundamental adotar a área de refúgio.
[Área de Refúgio]: significa plantar uma porção da lavoura (geralmente 20%) com soja não-Bt para evitar que as pragas desenvolvam resistência à tecnologia.
Lembre-se: o uso de plantas transgênicas não elimina a necessidade de fazer o monitoramento e de integrar outras táticas do MIP.
Controle Químico
Ao contrário do que muitos pensam, o MIP não proíbe o controle químico. Ele defende o seu uso racional e equilibrado, apenas quando estritamente necessário. O ideal é optar por inseticidas seletivos.
[Inseticidas Seletivos]: são produtos que atingem a praga-alvo, mas causam pouco ou nenhum dano aos inimigos naturais e outros organismos benéficos.
Embora os inseticidas seletivos possam ter um custo inicial mais alto, eles se pagam a longo prazo, pois preservam o controle biológico natural da sua lavoura e reduzem a necessidade de futuras aplicações.
Alguns Erros Comuns no MIP da Soja
Na tentativa de otimizar operações, muitos produtores acabam cometendo erros que sabotam o MIP e aumentam os custos desnecessariamente.
Um exemplo clássico é aplicar inseticidas junto com fungicidas “para aproveitar a entrada da máquina”, mesmo sem ter um problema real com pragas. Essa decisão, na maioria das vezes, é tomada sem um monitoramento prévio que a justifique.
Além de gerar um custo imediato sem necessidade, essa prática acelera problemas graves como a resistência das pragas e a ressurgência de populações ainda mais fortes.
Pense na seguinte situação…
João tem dois filhos. Um está com dor de garganta, o outro está saudável. Para “aproveitar o remédio”, João decide medicar os dois. Essa atitude é uma imprudência: o filho saudável pode sofrer efeitos colaterais e o gasto foi desnecessário.
Na lavoura, a lógica é a mesma. Aplicar um inseticida sem que a praga tenha atingido o nível de controle é gastar dinheiro à toa e arriscar o equilíbrio do sistema.
Por isso, mesmo que pareça mais complexo, seguir as táticas do MIP é a melhor forma de garantir a sanidade e a rentabilidade do seu sistema de plantio.
Conclusão
Implementar o MIP na soja não é impossível e os resultados comprovam que o esforço vale a pena. Adotar essa estratégia é fundamental para evitar os problemas causados pelo uso excessivo e indiscriminado de inseticidas.
Para começar, conheça bem o histórico da sua área e transforme o monitoramento semanal em uma rotina indispensável. A partir daí, utilize os diferentes métodos de controle de forma integrada, como discutimos neste artigo.
Com estas informações, esperamos que você se sinta mais seguro para tomar as melhores decisões no controle de pragas da sua lavoura, tornando-a mais produtiva, rentável e sustentável.
Glossário
Área de Refúgio: Porção da lavoura (geralmente 20%) plantada com uma variedade da mesma cultura que não possui a tecnologia transgênica (não-Bt). Essa prática visa manter uma população de pragas suscetíveis à tecnologia, retardando o desenvolvimento de resistência.
Controle Biológico: Método de controle que utiliza organismos vivos, como predadores, parasitoides e patógenos (vírus, bactérias), para reduzir a população de uma praga. Pode ocorrer de forma natural ou pela liberação intencional desses inimigos naturais na lavoura.
Manejo Integrado de Pragas (MIP): Estratégia que combina diferentes táticas de controle (cultural, biológico, químico, etc.) de forma harmônica. O objetivo não é erradicar as pragas, mas mantê-las em um nível que não cause prejuízos econômicos.
Nível de Controle (NC): Densidade populacional da praga que serve como um gatilho para a tomada de uma ação de controle. É o “sinal de alerta” para agir antes que o prejuízo financeiro ocorra.
Nível de Dano Econômico (NDE): Ponto em que a população de uma praga é tão alta que o custo do dano causado por ela é maior do que o custo da medida de controle. Atingir o NDE significa que o produtor já está perdendo dinheiro.
Pano-de-Batida: Ferramenta de monitoramento simples, consistindo em um pano branco esticado em uma armação. É colocado entre as fileiras da soja para que as plantas sejam sacudidas sobre ele, facilitando a contagem de percevejos, lagartas e inimigos naturais.
Ressurgência de Pragas: Fenômeno que ocorre quando, após a aplicação de um inseticida de amplo espectro, a população da praga-alvo retorna em níveis ainda maiores do que antes. Isso acontece porque o produto também elimina os inimigos naturais que ajudavam a controlá-la.
Veja como o Aegro pode ajudar a superar esses desafios
O monitoramento semanal e a análise de dados são os pilares do Manejo Integrado de Pragas, mas registrar tudo em planilhas ou fichas de papel pode ser trabalhoso e dificultar a tomada de decisão rápida. Quando as informações não estão centralizadas, fica difícil saber o momento exato de agir, o que pode levar a aplicações desnecessárias e ao aumento dos custos de produção.
Para superar esse desafio, um software de gestão agrícola como o Aegro é um grande aliado. Ele permite registrar as contagens de pragas e doenças diretamente no campo pelo aplicativo, centralizando as informações e gerando mapas de infestação automáticos. Isso ajuda a visualizar com clareza quando o nível de controle é atingido em cada talhão, garantindo que as pulverizações sejam feitas apenas quando realmente necessário, economizando insumos e protegendo a rentabilidade da lavoura.
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Perguntas Frequentes
O Manejo Integrado de Pragas (MIP) é mais caro que o controle químico convencional?
Inicialmente, o MIP pode exigir um investimento maior em tempo para monitoramento e planejamento. No entanto, a longo prazo, ele se torna mais rentável ao reduzir o número de aplicações de defensivos, diminuir os custos com insumos e evitar perdas de produtividade causadas pela resistência de pragas.
Implementar o MIP significa que não posso mais usar inseticidas químicos na soja?
Não, o MIP não proíbe o uso de defensivos químicos. Pelo contrário, ele os integra como uma ferramenta a ser usada de forma racional: apenas quando o monitoramento indica que a praga atingiu o Nível de Controle (NC). A preferência é sempre por produtos seletivos, que preservam os inimigos naturais.
Qual a principal diferença entre Nível de Controle (NC) e Nível de Dano Econômico (NDE)?
O Nível de Controle (NC) é um ‘sinal de alerta’; é a densidade da praga que indica a necessidade de agir para evitar prejuízos. Já o Nível de Dano Econômico (NDE) é o ponto em que o custo do dano causado pela praga já é maior que o custo do controle. O objetivo do MIP é sempre agir no NC para nunca atingir o NDE.
Se eu uso soja Bt resistente a lagartas, ainda preciso fazer o monitoramento de pragas?
Sim, com certeza. A soja Bt é eficaz contra as principais lagartas, mas não controla outras pragas importantes como percevejos e ácaros. Além disso, o monitoramento é essencial para manejar a resistência da praga à tecnologia Bt, garantindo sua eficácia por mais tempo, e para identificar a necessidade de controle de outras pragas.
Qual é o primeiro passo prático para um produtor que deseja começar a implementar o MIP na soja?
O primeiro passo é estabelecer uma rotina de monitoramento semanal da lavoura. Utilize ferramentas como o pano-de-batida para identificar e quantificar as pragas e seus inimigos naturais. O registro desses dados é fundamental para conhecer a dinâmica da sua área e tomar decisões baseadas em informações concretas, não em suposições.
Como posso proteger os inimigos naturais que já existem na minha lavoura?
A principal forma de proteger os inimigos naturais é evitar aplicações de inseticidas de amplo espectro por calendário ou de forma preventiva. Utilize o controle químico apenas quando estritamente necessário (ao atingir o Nível de Controle) e dê preferência a produtos seletivos, que são projetados para atingir a praga-alvo com mínimo impacto sobre os organismos benéficos.
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