Muitas doenças podem atacar sua lavoura em diferentes fases de desenvolvimento ou até mesmo durante todo o ciclo da cultura. Uma das mais importantes é o míldio.
Essa doença surge principalmente em condições de alta umidade e temperaturas amenas, sendo uma ameaça para diversas culturas agrícolas. Para se ter uma ideia, sua presença em uma lavoura de sorgo pode causar perdas de até 80% na produção.
Para proteger sua safra e evitar prejuízos, é fundamental estar preparado. Neste artigo, vamos detalhar as principais características do míldio, mostrar como identificar os sintomas corretamente e apresentar as estratégias de controle mais eficientes para sua fazenda.
O que é o Míldio e Como Ele Age?
O míldio é causado por um grupo de patógenos conhecidos como oomicetos.
O que são oomicetos? São organismos parecidos com fungos que se desenvolvem em ambientes úmidos e causam doenças em plantas.
Existem vários gêneros de oomicetos que provocam o míldio, como Plasmopara, Peronospora, Bremia e Sclerospora. Ao longo deste guia, mencionaremos espécies específicas que afetam as principais culturas.
O míldio ataca principalmente as folhas, mas também pode aparecer em ramos e frutos, dependendo da cultura. A doença se desenvolve mais facilmente em regiões com alta umidade e temperaturas amenas, que são as condições ideais para o patógeno.
Os sintomas típicos do míldio são fáceis de identificar se você souber o que procurar:
- Na parte de cima da folha: Aparecem manchas de cor verde-clara a amarelada. Com o tempo, essas manchas escurecem e morrem, tornando-se necróticas.
- Na parte de baixo da folha: No mesmo local da mancha superior, surge uma eflorescência de cor esbranquiçada, que se parece com um mofo ou bolor.
Essa eflorescência nada mais é do que a estrutura reprodutiva do patógeno. Ela geralmente aparece na parte inferior da folha porque é onde se concentra a maior parte dos estômatos (pequenos poros por onde a planta respira), facilitando a saída do patógeno.
Estruturas da Plasmopara viticola (míldio da videira) na parte inferior da folha. Note o aspecto de mofo branco.
(Fonte: Gessler et al. (2011) em Phytopathologia Mediterranea)
Essas estruturas reprodutivas são muito leves e facilmente disseminadas pelo vento e pela água da chuva ou irrigação, espalhando a doença pela lavoura. Ao cobrir a folha, o míldio atrapalha a fotossíntese, reduzindo a capacidade da planta de produzir energia e, consequentemente, diminuindo a produtividade.
Agora, vamos analisar os sintomas e as medidas de manejo do míldio em culturas específicas.
Míldio na Cultura do Sorgo
O patógeno responsável pelo míldio no sorgo é o Peronosclerospora sorghi. Quando se utilizam cultivares suscetíveis, a doença pode causar danos de até 80% na produção.
No Brasil, o míldio do sorgo está presente em quase todas as regiões de cultivo. Na região Sul, por exemplo, é considerada a segunda doença mais importante da cultura, perdendo apenas para a antracnose.
O patógeno pode infectar a planta de duas formas: localizada ou sistêmica.
Infecção Localizada
A infecção localizada acontece quando os esporos (estruturas do patógeno) atingem diretamente as folhas. Isso causa lesões de tecido morto (necróticas) com formato retangular. Em condições de umidade e frio, um crescimento pulverulento de cor acinzentada (a eflorescência) aparece na parte de baixo da folha.
Se o patógeno conseguir alcançar o ponto de crescimento da planta (meristema), a infecção pode se tornar sistêmica.
Infecção Sistêmica
A infecção sistêmica é mais grave e ocorre quando o patógeno invade as células do meristema apical, que é o principal ponto de crescimento da planta.
Plantas jovens infectadas de forma sistêmica mostram sintomas de clorose (amarelamento) e enfezamento (redução do crescimento), podendo morrer antes de produzir. Além disso, o desenvolvimento dos grãos fica seriamente comprometido.
O sintoma mais claro da infecção sistêmica é a clorose foliar, que aparece em faixas de cor verde-claro a amarelo, intercaladas com a cor verde normal da folha. Na parte inferior dessas faixas, em dias úmidos, também pode surgir a eflorescência branca do patógeno.
Infecção sistêmica (A), infecção localizada (B), estádio mais avançado da infecção sistêmica (C) em sorgo.
(Fonte: Luciano Viana Cota em Embrapa)
Medidas de Controle para o Míldio do Sorgo
- Use variedades resistentes: Este é o método mais eficiente e econômico para controlar a doença no sorgo.
- Faça rotação de culturas: Utilize espécies que não são hospedeiras do patógeno. Atenção: não use milho na rotação, pois ele também pode ser hospedeiro.
- Destrua os restos culturais: A eliminação da palhada infectada reduz a fonte de inóculo para a próxima safra.
- Ajuste a época de semeadura: Em locais com histórico da doença, antecipar a semeadura pode ajudar a planta a escapar do período mais crítico de infecção.
- Utilize sementes de boa qualidade: Sementes certificadas e sadias evitam a introdução da doença na área.
É importante destacar que, até o momento, não existem produtos químicos registrados no Brasil para o controle do míldio na cultura do sorgo. Portanto, não há recomendações de aplicação de fungicidas na parte aérea nem para o tratamento de sementes.
Míldio na Cultura do Milho
Na cultura do milho, vários patógenos podem causar míldio. O mais comum no Brasil é o Peronosclerospora sorghi, o mesmo que ataca o sorgo.
Apesar de presente, esta doença no milho geralmente não causa prejuízos econômicos tão grandes no Brasil como em outros países.
A infecção sistêmica deixa as folhas com estrias e faixas brancas (clorose). Um sinal característico é que as plantas infectadas apresentam folhas mais eretas e estreitas, com o colmo mais fino, o que pode levar ao acamamento.
Folhas de milho estreitas e eretas, com faixas esbranquiçadas típicas do míldio.
(Fonte: Carlos Roberto Casela em Embrapa)
A doença também pode prejudicar a formação de grãos nas espigas. Em condições de alta umidade e temperaturas mais baixas, a eflorescência esbranquiçada pode surgir nas folhas, assim como no sorgo.
Medidas de Manejo para o Míldio no Milho
- Utilize variedades resistentes: É a principal forma de prevenção.
- Faça o tratamento de sementes com fungicidas sistêmicos: Consulte um engenheiro agrônomo para saber os produtos registrados.
- Elimine plantas doentes e restos culturais: Reduz a fonte do patógeno na área.
- Realize a rotação de culturas: Evite o plantio sucessivo de milho ou sorgo.
- Antecipe o plantio: Em áreas com histórico da doença, plantar mais cedo pode ajudar.
Míldio na Cultura da Soja
Na cultura da soja, o míldio é causado pelo oomiceto Peronospora manshurica e pode aparecer em qualquer região produtora do Brasil.
Os sintomas nas folhas superiores são lesões de cor verde-clara a amarelada, que mais tarde podem necrosar. Na parte inferior da folha, sobre essas lesões, aparece um crescimento de aspecto cotonoso e cor cinza, que são as estruturas do patógeno.
A doença pode infectar as vagens, causando redução no tamanho dos grãos ou até sua deterioração. O patógeno pode entrar na lavoura por meio de sementes contaminadas ou pelo vento, que transporta suas estruturas reprodutivas.
Em geral, o míldio é considerado uma doença de menor importância econômica para a soja no país. Contudo, se ele é um problema em sua área, aqui estão algumas medidas de manejo:
- Trate as sementes com produtos registrados.
- Destrua os restos culturais após a colheita.
- Opte pelo uso de cultivares resistentes.
Míldio em Outras Culturas
Além das grandes culturas, o míldio também afeta diversas hortaliças e frutas. Veja alguns exemplos:
- Alface: causado por Bremia lactucae.
- Cebola: causado por Peronospora destructor.
- Brássicas (repolho, couve-flor): causado por Peronospora parasitica.
- Videira: causado por Plasmopara viticola.
Você sabia que o míldio da videira está diretamente ligado à descoberta do primeiro fungicida da história?
Míldio da Videira e a História dos Fungicidas
No Brasil, o míldio é a doença mais importante da videira, sendo causado pelo patógeno Plasmopara viticola. Em condições favoráveis, a doença pode gerar perdas de até 75% da produção.
Na videira, os sintomas podem aparecer em todas as partes verdes da planta. Nas folhas, o primeiro sinal é uma pequena mancha de aspecto encharcado e translúcido, conhecida como “mancha de óleo”. Com o avanço da doença, essas manchas escurecem, e as folhas podem cair.
“Mancha de óleo” com necrose em folha de videira, sintoma inicial do míldio.
(Fonte: Gessler et al. (2011) em Phytopathologia Mediterranea)
Na parte de baixo da folha, sobre a mancha, surge a típica eflorescência esbranquiçada. Nos ramos, também aparecem manchas encharcadas, que logo são cobertas por esse “mofo”. Nos cachos, a doença causa morte de flores e apodrecimento dos frutos.
Mas qual a relação dessa doença com a história do controle químico?
A Descoberta Acidental do Primeiro Fungicida
A história nos leva à região de Bordeaux, na França, por volta de 1870. O pesquisador Pierre Marie Alexis Millardet investigava o míldio, um problema recente nos vinhedos locais. Ele notou que algumas videiras perto das estradas não apresentavam a doença.
Curioso, ele perguntou ao produtor o que havia sido feito naquelas plantas. O agricultor explicou que as pulverizava com uma mistura para evitar o roubo das uvas, pois ela deixava os frutos com uma cor diferente e um gosto amargo.
Millardet, junto com outro pesquisador, Ulysse Gayon, analisou e aperfeiçoou a mistura. Em 1885, eles publicaram os resultados, mostrando a eficácia da calda bordalesa (uma mistura de sulfato de cobre e cal) no controle do míldio da videira.
Assim, a calda bordalesa se tornou o primeiro fungicida da história, nascido da observação prática de um agricultor. Até hoje, essa mistura de cobre e cal pode ser usada para controlar o míldio em videiras.
Míldio x Oídio: Quais as Diferenças?
O oídio é outra doença importante que, por ter sintomas parecidos (um pó branco), pode ser confundida com o míldio. No entanto, existem diferenças claras:
- Localização dos sintomas: O míldio geralmente mostra sua eflorescência branca apenas na parte inferior da folha. Já o oídio aparece em ambos os lados da folha e pode cobrir grandes áreas.
- Condições climáticas: O míldio prefere épocas úmidas. O oídio, ao contrário, se desenvolve melhor em épocas secas.
No microscópio, as estruturas dos dois patógenos são bem diferentes, facilitando a distinção. Se tiver dúvidas, procure um engenheiro agrônomo ou uma clínica de diagnóstico para uma identificação precisa.
Conclusão
Neste artigo, detalhamos o que é o míldio, uma doença que ameaça diversas culturas agrícolas. Vimos os sintomas, os patógenos causadores e as principais medidas de manejo para sorgo, milho, soja e videira.
Também contamos a interessante história de como o míldio da videira levou à descoberta do primeiro fungicida, a calda bordalesa. Por fim, esclarecemos as principais diferenças entre o míldio e o oídio.
Com essas informações em mãos, você está mais preparado para identificar e combater essa doença. Não deixe que o míldio reduza a produtividade da sua lavoura!
Glossário
Calda Bordalesa: O primeiro fungicida da história, composto por uma mistura de sulfato de cobre e cal. Foi descoberto na França para o controle do míldio da videira e ainda é utilizado em algumas situações.
Clorose: Amarelamento das folhas de uma planta devido à falta de clorofila. No contexto do artigo, é um sintoma chave da infecção sistêmica por míldio em sorgo e milho, aparecendo como faixas amareladas ou esbranquiçadas.
Eflorescência: Estrutura de aspecto esbranquiçado e pulverulento (semelhante a um mofo) que surge na parte inferior das folhas infectadas pelo míldio. Corresponde à parte reprodutiva do patógeno, responsável por espalhar a doença pelo vento e pela água.
Estômatos: Pequenos poros, localizados principalmente na parte de baixo das folhas, por onde a planta realiza trocas gasosas (respiração). O míldio aproveita essas aberturas para emergir da folha e liberar suas estruturas reprodutivas.
Infecção sistêmica: Ocorre quando o patógeno se espalha por todo o interior da planta, atingindo seus pontos de crescimento (meristemas). É a forma mais severa da doença, podendo causar nanismo (enfezamento) e morte da planta.
Meristema apical: Principal ponto de crescimento ativo de uma planta, localizado nas pontas dos caules. Quando o míldio atinge o meristema, a infecção se torna sistêmica, comprometendo todo o desenvolvimento futuro da planta.
Oomicetos: Grupo de organismos semelhantes a fungos que são os agentes causadores do míldio. Eles se desenvolvem em ambientes com alta umidade e temperaturas amenas, atacando diversas culturas agrícolas.
Como a tecnologia ajuda no manejo do míldio
Lidar com o míldio exige um planejamento cuidadoso, desde a escolha de cultivares resistentes até o registro de ocorrências para safras futuras. Um controle eficiente não depende apenas das ações no campo, mas também da organização das informações. Ferramentas de gestão agrícola, como o Aegro, centralizam esses dados, permitindo que você mapeie áreas afetadas, planeje as aplicações de defensivos com antecedência e mantenha um histórico detalhado de cada talhão. Isso transforma a tomada de decisão, tornando-a mais rápida e baseada em dados concretos.
Além do controle agronômico, é fundamental entender o impacto financeiro de cada estratégia. O custo do tratamento de sementes, dos fungicidas e das operações de pulverização precisa ser monitorado para garantir a rentabilidade da lavoura. Com um software, é possível registrar todos os custos de produção e analisar o custo-benefício de cada medida de controle, garantindo que o manejo da doença proteja não só a produtividade, mas também a saúde financeira da fazenda.
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Perguntas Frequentes
Qual é a principal diferença entre o míldio e o oídio?
A principal diferença está na localização dos sintomas e nas condições climáticas. O míldio geralmente se manifesta como um mofo esbranquiçado apenas na parte de baixo da folha e prefere alta umidade. Já o oídio aparece como um pó branco em ambos os lados da folha e se desenvolve melhor em tempo seco e com baixa umidade.
Qual é a medida de controle mais eficaz e econômica contra o míldio?
Para a maioria das culturas abordadas, como sorgo, milho e soja, a medida mais eficiente e de melhor custo-benefício é o uso de variedades e cultivares geneticamente resistentes à doença. Essa estratégia preventiva é fundamental, pois evita perdas de produtividade e reduz a necessidade de outras intervenções de manejo.
Por que o mofo característico do míldio aparece na parte de baixo da folha?
O patógeno causador do míldio utiliza os estômatos, que são os poros de respiração da planta, para emergir e liberar suas estruturas reprodutivas. Como a maioria dos estômatos se concentra na parte inferior da folha, é ali que a eflorescência esbranquiçada (o “mofo”) se torna visível.
O que significa uma infecção sistêmica de míldio e por que ela é mais grave?
Uma infecção é sistêmica quando o patógeno atinge o ponto de crescimento principal da planta (meristema) e se espalha internamente por todos os tecidos. Ela é mais grave porque compromete todo o desenvolvimento da planta, causando sintomas severos como amarelamento, nanismo (enfezamento) e podendo levar à morte antes da produção de grãos.
Posso usar fungicidas para controlar o míldio na lavoura de sorgo?
Não. Conforme destacado no artigo, atualmente não existem produtos químicos (fungicidas) registrados no Brasil para o controle do míldio na parte aérea da cultura do sorgo. Portanto, o manejo deve se concentrar exclusivamente em práticas preventivas, como o uso de variedades resistentes e a rotação de culturas.
A rotação de culturas com milho ajuda a controlar o míldio no sorgo?
Não, essa prática deve ser evitada. O principal agente causador do míldio no sorgo (Peronosclerospora sorghi) também pode infectar e se hospedar na cultura do milho. Realizar a rotação entre essas duas culturas pode manter ou até aumentar a quantidade do patógeno na área para a safra seguinte.
O que é a calda bordalesa mencionada no artigo?
A calda bordalesa é considerada o primeiro fungicida da história, uma mistura de sulfato de cobre e cal. Sua descoberta na França, no século XIX, foi um marco no controle do míldio da videira. Embora seja uma tecnologia antiga, ela ainda pode ser utilizada no manejo de algumas doenças em certas culturas, especialmente na produção orgânica.
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