Quando o assunto é controle de pragas, a solução mais comum que vem à mente do produtor ainda é o uso de defensivos químicos. No entanto, o cenário agrícola está passando por uma grande transformação nos últimos anos.
Desde 2011, o mercado de controle biológico vem crescendo em média 15% ao ano no Brasil, segundo dados da Embrapa. Este método tem se mostrado não apenas eficaz em diversas lavouras, mas também uma ferramenta mais sustentável. Isso é fundamental para atender à crescente demanda dos consumidores por alimentos mais seguros e produzidos de forma responsável.
Você conhece as tendências desse mercado e os principais produtos biológicos disponíveis para o controle de pragas agrícolas? Continue a leitura para entender como essa tecnologia pode beneficiar sua produção.
O Mercado de Controle Biológico no Brasil
O objetivo do controle biológico é simples e direto: usar inimigos naturais para combater pragas. Esses inimigos podem ser predadores, parasitoides, fungos, bactérias ou outros organismos que atacam especificamente as pragas da lavoura, sem prejudicar a cultura.
O crescimento desse setor é impressionante. Nos últimos anos, o mercado de controle biológico cresceu mais de 70% no Brasil, de acordo com a Associação Brasileira das Empresas de Controle Biológico (ABCBio). A expectativa global para 2020 já era de uma movimentação de US$ 5 bilhões.
Apesar desse avanço, os produtos biológicos ainda representam cerca de 2% do faturamento total do mercado de proteção de plantas no país. Por que isso acontece?
- Hábito Cultural: Muitos produtores estão acostumados com o uso programado de defensivos químicos, conhecido como calendarização: significa aplicar produtos em datas fixas, independentemente da infestação.
- Falta de Informação: A falta de conhecimento detalhado sobre a eficácia e o modo de aplicação dos biológicos ainda é uma barreira para muitos agricultores.
É aqui que o Manejo Integrado de Pragas (MIP) entra como uma estratégia fundamental. O MIP não elimina o uso de químicos, mas propõe a combinação inteligente de vários métodos de controle, incluindo o biológico. Essa abordagem integrada visa a sustentabilidade do sistema produtivo e oferece soluções eficazes para os desafios da agricultura tropical.
Para aplicar o MIP com sucesso, é essencial conhecer o mercado de controle biológico e as ferramentas que ele oferece para a agricultura brasileira.
Tipos de Produtos Biológicos
Existem diversos defensivos biológicos produzidos em larga escala por biofábricas e disponíveis comercialmente. O objetivo deles é o mesmo dos defensivos químicos: controlar as pragas agrícolas com rapidez para evitar que atinjam o nível de dano econômico: ponto em que o custo do dano da praga é maior que o custo do controle.
Os produtos biológicos são classificados em quatro grandes grupos: macrorganismos, microrganismos, bioquímicos e semioquímicos.
Veja a seguir a definição de cada um e exemplos de produtos registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
Macrorganismos
São inimigos naturais visíveis a olho nu, como insetos, ácaros e nematoides benéficos. Eles atuam como parasitoides ou predadores e são liberados em grande quantidade na lavoura.
- Cotesia flavipes: Uma pequena vespa que atua como parasitoide: significa que ela deposita seus ovos dentro da praga, matando as lagartas da broca-da-cana-de-açúcar.
Cotesia flavipes parasitando lagarta de Diatraea saccharalis
(Fonte: Heraldo Oliveira)
- Trichogramma spp.: Outra vespa parasitoide, mas que ataca os ovos de lagartas (lepidópteros) em diversas culturas, como soja e milho.
Trichogramma pretiosum parasitando ovo de lepidoptera
(Fonte: Koppert)
- Neoseiulus californicus: Um ácaro predador utilizado para controlar o ácaro-rajado em todas as culturas onde essa praga ocorre, com destaque para milho e soja.
Ácaro predador Neoseiulus californicus
(Fonte: Koppert)
Microrganismos
São organismos microscópicos, como fungos, bactérias e vírus, que infectam e matam os insetos-praga. A maioria deles atua em diferentes fases de vida da praga (ovo, larva, adulto).
- Beauveria bassiana: Um fungo entomopatogênico: significa que causa doenças em insetos, agindo como um inseticida natural. É eficaz contra diversas pragas, como a cigarrinha-do-milho e a mosca-branca.
Beauveria bassiana colonizando adultos e ninfas de mosca-branca
(Fonte: MF Rural)
- Bacillus thuringiensis (Bt): Uma bactéria que produz uma toxina. Quando ingerida por lagartas da ordem Lepidoptera, como a Spodoptera frugiperda no milho e a Anticarsia gemmatalis na soja, essa toxina destrói o sistema digestivo do inseto.
Produto biológico à base de Bacillus thuringiensis
(Fonte: Simbiose)
- Trichoderma harzianum: Um fungo benéfico que age como fungicida. Ele controla outros fungos causadores de doenças e nematoides presentes no solo, protegendo o sistema radicular das plantas.
Trichoderma harzianum
(Fonte: Koppert)
Bioquímicos
São produtos desenvolvidos a partir de substâncias naturais, como extratos de plantas, algas, enzimas ou hormônios. Eles podem atuar como pesticidas naturais ou como estimulantes de defesa, que “avisam” a planta para se proteger contra ataques.
- Óleo de Neem: Um dos mais conhecidos, este produto é feito a partir do extrato da planta de nim (Azadirachta indica Juss) e possui ação inseticida contra diversas pragas.
Produto à base de óleo de Neem para controle de pragas
(Fonte: Grow Plant)
Semioquímicos
São substâncias químicas usadas pelos organismos para se comunicarem. Na agricultura, são usadas para alterar o comportamento das pragas. Existem dois tipos principais:
- Feromônios: Usados para comunicação entre indivíduos da mesma espécie. São muito específicos e utilizados principalmente para monitoramento (em armadilhas) ou para confundir os machos, impedindo o acasalamento.
- Aleloquímicos: Usados na comunicação entre espécies diferentes, podendo atrair ou repelir certos insetos.
Feromônio sintético para Spodoptera frugiperda
(Fonte: BioControle)
Novos Produtos e o Processo de Registro
O mercado de controle biológico está em constante inovação. Em 2019, por exemplo, o MAPA aprovou o registro de 474 defensivos, dos quais 40 eram produtos biológicos ou orgânicos.
Recentemente, foram aprovados dois defensivos biológicos inéditos no país:
- Produto à base de alho: Um bioquímico que será utilizado para o controle de nematoides que atacam as raízes das plantas.
- Ácaro Amblyseius tamatavensis: Um macrobiológico (predador) que controla a mosca-branca (Bemisia tabaci Biótipo B) ao se alimentar de seus ovos e ninfas.
É importante saber que, para um produto biológico chegar ao mercado, o processo de registro é tão rigoroso quanto o de um defensivo químico. De acordo com a Lei 7.802 e o Decreto 4.074, o produto precisa ser avaliado por três órgãos federais:
- MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento): Avalia a eficiência agronômica do produto.
- Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária): Avalia os possíveis impactos na saúde humana.
- Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis): Avalia os impactos ambientais.
Com o aumento da procura por soluções biológicas, a tendência é que cada vez mais produtos sejam registrados e se tornem acessíveis ao produtor.
Onde Encontrar Esses Produtos? As Biofábricas
Se você está se perguntando onde encontrar esses produtos, saiba que o acesso está cada vez mais fácil. O Governo Federal criou uma plataforma online que mapeia a localização de todas as biofábricas no Brasil.
Atualmente, existem mais de 80 empresas em todo o país, incluindo grandes multinacionais especializadas na produção de defensivos biológicos.
Mapa para localização de biofábricas no Brasil
(Fonte: Governo Federal)
Conclusão
Neste artigo, você viu os pontos mais importantes sobre o controle biológico de pragas:
- O mercado de controle biológico está em forte crescimento no Brasil, embora os defensivos químicos ainda dominem o setor de proteção de plantas.
- Os defensivos biológicos são classificados em quatro grupos principais: macrobiológicos, microbiológicos, bioquímicos e semioquímicos.
- Todos os produtos passam por um rigoroso processo de registro no MAPA, Anvisa e Ibama para garantir sua eficácia e segurança.
- Já existem mais de 80 biofábricas espalhadas pelo território nacional, facilitando o acesso do produtor a essas tecnologias.
O controle biológico não é apenas uma tendência, mas uma ferramenta estratégica e essencial dentro do Manejo Integrado de Pragas, ajudando a construir uma agricultura mais produtiva e sustentável.
Glossário
Controle biológico: Método de combate a pragas agrícolas que utiliza seus inimigos naturais, como predadores, parasitoides e microrganismos. É uma alternativa mais sustentável ao uso exclusivo de defensivos químicos.
Fungo entomopatogênico: Tipo de fungo que causa doenças em insetos, funcionando como um inseticida natural. A Beauveria bassiana, por exemplo, é usada para controlar pragas como a mosca-branca.
Inimigos naturais: Organismos que, na natureza, predam, parasitam ou causam doenças em pragas agrícolas. São a base do controle biológico e incluem desde vespas e ácaros até fungos e bactérias.
Manejo Integrado de Pragas (MIP): Estratégia que combina diferentes métodos de controle (biológico, químico, cultural) de forma inteligente e sustentável. O objetivo é manter as pragas abaixo do nível de dano econômico, em vez de simplesmente eliminá-las.
MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento): Órgão federal do Brasil responsável por avaliar a eficiência agronômica e registrar defensivos agrícolas, incluindo os produtos biológicos, antes que possam ser comercializados.
Nível de dano econômico: Ponto em que o custo do prejuízo causado por uma praga na lavoura se torna maior que o custo de aplicar uma medida de controle. É o principal indicador para a tomada de decisão no MIP.
Parasitoide: Organismo que deposita seus ovos dentro ou sobre o corpo de um hospedeiro (a praga). As larvas se desenvolvem alimentando-se do hospedeiro, levando-o à morte, como a vespa Cotesia flavipes faz com a broca-da-cana.
Semioquímicos: Substâncias químicas usadas na comunicação entre organismos, aplicadas na agricultura para manipular o comportamento das pragas. Feromônios, por exemplo, são usados em armadilhas para monitoramento ou para confundir os machos e impedir o acasalamento.
Como a tecnologia simplifica a transição para o Manejo Integrado
Adotar o Manejo Integrado de Pragas (MIP) é um grande passo, mas abandonar o hábito da aplicação por calendário pode parecer complexo. A falta de organização para registrar o monitoramento e calcular o momento certo de agir é uma barreira real. Um software de gestão agrícola como o Aegro resolve esse desafio, permitindo que você registre as contagens de pragas direto do campo pelo celular. Com esse histórico, fica fácil planejar as aplicações de defensivos — biológicos ou químicos — com precisão e acompanhar os custos de cada operação, garantindo que cada decisão proteja tanto a lavoura quanto a sua rentabilidade.
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Perguntas Frequentes
Qual a principal diferença entre o controle biológico e o controle químico de pragas?
A principal diferença está no modo de ação. O controle químico utiliza substâncias tóxicas para eliminar as pragas de forma ampla e imediata. Já o controle biológico usa inimigos naturais específicos (predadores, parasitoides, microrganismos) que atacam apenas a praga-alvo, preservando outros organismos benéficos e o equilíbrio do ecossistema agrícola.
O controle biológico é tão eficaz quanto os defensivos químicos?
Sim, o controle biológico é altamente eficaz, mas sua ação pode ser mais gradual que a de um químico de choque. Enquanto alguns químicos oferecem um resultado imediato, os agentes biológicos proporcionam um controle mais duradouro e estável, pois os inimigos naturais podem se estabelecer na área. A eficácia máxima é alcançada dentro de uma estratégia de Manejo Integrado de Pragas (MIP).
Posso substituir completamente os defensivos químicos pelos biológicos na minha lavoura?
A substituição total é possível em alguns sistemas de cultivo, mas o objetivo principal é a integração. A estratégia mais recomendada é o Manejo Integrado de Pragas (MIP), que combina o controle biológico com outras práticas, incluindo o uso racional de químicos apenas quando estritamente necessário. Isso resulta em um sistema mais resiliente, sustentável e lucrativo.
Os produtos de controle biológico são seguros para o meio ambiente e para o aplicador?
Sim. Assim como os defensivos químicos, todos os produtos biológicos passam por um processo de registro rigoroso no Brasil, sendo avaliados pelo MAPA (eficácia), pela Anvisa (saúde humana) e pelo Ibama (impacto ambiental). Por serem baseados em organismos ou substâncias naturais e específicos para as pragas, eles apresentam baixíssimo risco para o meio ambiente, aplicadores e consumidores.
Como saber qual tipo de produto biológico (macro, micro ou bioquímico) é o ideal para minha praga?
A escolha depende da praga-alvo, do estágio de desenvolvimento dela, da cultura e das condições climáticas. Por exemplo, vespas como o Trichogramma (macrorganismo) são ideais para parasitar ovos de lagartas, enquanto fungos como a Beauveria bassiana (microrganismo) são eficazes contra insetos como a mosca-branca. É fundamental ter o diagnóstico correto da praga e consultar um engenheiro agrônomo para a recomendação mais precisa.
O custo para implementar o controle biológico é maior do que o do manejo químico?
O custo de aquisição de um produto biológico pode ser, por vezes, similar ao de um químico. No entanto, o custo-benefício a médio e longo prazo tende a ser muito vantajoso. O controle biológico pode reduzir a necessidade de múltiplas aplicações, diminuir a resistência de pragas e agregar valor ao produto final, atendendo a mercados que exigem maior sustentabilidade.
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