A podridão de carvão, causada pelo fungo Macrophomina phaseolina, é uma das doenças que mais preocupam os produtores de soja no Brasil. Também conhecida como podridão negra da raiz ou podridão cinzenta da raiz, ela está presente na maioria das regiões produtoras e pode causar perdas significativas de produtividade.
Este fungo não se limita à soja; ele também ataca outras culturas importantes como feijão, milho, sorgo, algodão e girassol, além de se hospedar em diversas plantas daninhas. Entender os sintomas, as condições que favorecem a doença e as estratégias de manejo é fundamental para proteger sua lavoura.
Neste guia completo, vamos detalhar tudo o que você precisa saber sobre a podridão de carvão para manejar essa doença de forma eficaz.
Sintomas da Podridão de Carvão (Macrophomina) na Soja
Identificar a doença no campo nem sempre é fácil, pois os sintomas podem ser confundidos com outros problemas. No entanto, existem sinais característicos que ajudam no diagnóstico preciso.
Como a Doença se Manifesta na Lavoura
Na lavoura de soja, a podridão de carvão não costuma aparecer de forma homogênea. Os sintomas são geralmente observados em manchas ou reboleiras (áreas circulares com plantas doentes) ou ao longo das fileiras de plantio.
Sinais Visíveis na Planta
O sintoma mais claro da doença é a presença de minúsculas partículas pretas, parecidas com pó de carvão, na parte de baixo do caule e nas raízes. Em casos severos, essas partículas podem cobrir a planta inteira.
- Atenção: Essas partículas escuras, chamadas de microescleródios, são as estruturas de sobrevivência do fungo e servem como fonte de contaminação para a próxima safra.
Ao raspar a casca (epiderme) do caule, a aparência empoeirada fica ainda mais evidente. Outro sinal importante é o escurecimento dos tecidos internos (vasculares) do caule e das raízes, que pode ser visto ao cortar a planta.
Sintoma característico da doença podridão de carvão quando a epiderme do caule é raspada
(Fonte: Bayer)
Quando os Sintomas Aparecem?
A infecção geralmente ocorre nas primeiras semanas após o plantio. No entanto, a doença pode permanecer latente, ou seja, sem se manifestar, até que as condições ambientais se tornem favoráveis.
Por isso, é mais comum que os sintomas da podridão de carvão se tornem visíveis durante a fase reprodutiva da soja (floração e enchimento de grãos). Contudo, se as condições forem ideais para o fungo, até mesmo mudas recém-germinadas podem apresentar lesões marrons no hipocótilo (a parte do caule logo abaixo das primeiras folhas).
A doença causa maturação precoce e desuniforme, prejudica o enchimento de grãos da soja e reduz a qualidade geral da semente produzida.
Como Fazer a Identificação Correta no Campo
Fique atento aos seguintes sinais nas plantas de soja:
- Perda de vigor e desenvolvimento mais lento;
- Menor estatura em comparação com plantas sadias;
- Folhas pequenas, que podem estar enroladas.
Com o avanço da doença, as folhas ficam amarelas, murcham e morrem, e as raízes começam a apodrecer. Um detalhe importante é que, mesmo depois de mortas, as folhas secas podem permanecer presas aos caules.
É crucial não confundir esses sintomas foliares com outros problemas, como ataque de nematoides, estresse hídrico, senescência precoce ou outras doenças da soja. Um diagnóstico correto é o primeiro passo para um plano de manejo eficiente.
Lavouras afetadas pela podridão de carvão apresentam um estande de plantas reduzido, o que leva diretamente a uma menor produtividade.
Plantas de soja com sintomas de podridão de carvão
(Fonte: Iowa State University)
Condições Ideais para o Desenvolvimento da Doença
O fungo Macrophomina phaseolina se desenvolve com mais intensidade em condições específicas. Conhecê-las ajuda a prever os períodos de maior risco.
As principais condições que favorecem a podridão de carvão são:
- Solos compactados: Solos adensados dificultam o desenvolvimento das raízes e aumentam o estresse da planta.
- Altas temperaturas: O fungo tem seu desenvolvimento ótimo em temperaturas do solo entre
28 °C
e35 °C
. - Falta de água (estresse hídrico): Períodos de seca, especialmente durante a fase reprodutiva da soja, aumentam drasticamente a severidade da doença.
O fungo sobrevive no solo e em restos culturais da safra anterior. Essas são as principais fontes de inóculo (a parte do fungo que inicia a infecção). A transmissão para novas áreas também pode ocorrer por meio de sementes contaminadas, que geralmente não apresentam sintomas visíveis.
O Ciclo de Vida da Macrophomina na Lavoura
Entender o ciclo da doença é essencial para saber onde e quando agir. O fungo Macrophomina phaseolina é extremamente resistente, sobrevivendo no ambiente por longos períodos na forma de microescleródios: pequenas e escuras estruturas de resistência presentes nos restos culturais e no solo.
Microescleródios do fungo M. phaseolina causador da podridão de carvão na soja
(Fonte: Crop Protection Network)
O ciclo ocorre da seguinte forma:
- Sobrevivência: O fungo permanece inativo no solo e em restos de plantas da safra anterior.
- Infecção: Quando as condições se tornam favoráveis (calor e solo seco), os microescleródios germinam e infectam o sistema radicular das plantas de soja.
- Colonização: Após a infecção, o fungo se multiplica dentro das raízes e do caule, formando novas estruturas (hifas).
- Obstrução: O crescimento do fungo obstrui os tecidos vasculares da planta, interferindo na absorção e no transporte de água e nutrientes. É por isso que a planta murcha e morre.
- Produção de Inóculo: A multiplicação do fungo gera novos microescleródios, que dão a aparência de pó de carvão. Quando as plantas infectadas morrem, essas estruturas são liberadas no solo, contaminando a área para a próxima safra.
Ciclo da doença podridão de carvão na soja
(Fonte: Traduzido de Crop Protection Network)
Manejo da Podridão de Carvão na Soja: O Que Fazer?
A podridão de carvão é uma doença de difícil controle, pois as principais ferramentas de manejo ainda são limitadas.
Até o momento, não existem fungicidas registrados no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) para o controle químico da doença. Além disso, não há cultivares de soja totalmente resistentes disponíveis no mercado, embora pesquisas já tenham identificado genótipos com menor sensibilidade ao fungo.
O controle é dificultado pelo fato de o fungo ser polífago, ou seja, ele se alimenta de diversas culturas. Isso torna a rotação de culturas uma estratégia pouco eficiente para reduzir o inóculo no solo.
Dessa forma, o foco do manejo deve ser em medidas preventivas que criem um ambiente desfavorável para o fungo e fortaleçam as plantas.
Estratégias de Manejo Preventivo
- Época de Plantio: Siga o calendário agrícola da sua região. Plantar na época correta ajuda a diminuir os riscos de que a fase reprodutiva da soja coincida com períodos de altas temperaturas e seca.
- Nutrição da Lavoura: Uma planta bem nutrida é mais resistente. Realize uma adubação equilibrada com base nos resultados da análise de solo da sua área.
- Manejo de Plantas Daninhas: É fundamental eliminar espécies que possam servir de hospedeiras para o fungo. O controle de plantas daninhas também reduz a competição por água, luz e nutrientes. Não se esqueça de manter as bordaduras e os carreadores da lavoura sempre limpos.
- Higienização de Máquinas: Limpe cuidadosamente as máquinas e implementos agrícolas antes de movê-los de uma área para outra. Essa prática simples evita o transporte de torrões de solo com restos culturais contaminados para talhões sadios.
Conclusão
A podridão de carvão é uma doença séria para a cultura da soja, e seu manejo exige uma abordagem preventiva e integrada. Como não há soluções químicas curativas, o foco total deve ser em criar as melhores condições para a lavoura e evitar o ambiente ideal para o fungo.
A principal estratégia é reduzir o estresse das plantas, especialmente o estresse hídrico durante os estágios reprodutivos. Práticas como o plantio na época certa, a nutrição equilibrada e a descompactação do solo são fundamentais.
Fique atento aos primeiros sinais da doença no campo e, ao planejar a próxima safra, converse com seu consultor técnico sobre genótipos de soja que têm demonstrado menor sensibilidade à Macrophomina phaseolina na sua região. Adotar essas medidas preventivas é o caminho mais seguro para proteger a produtividade da sua lavoura.
Glossário
Estresse Hídrico: Condição que ocorre quando uma planta perde mais água por transpiração do que consegue absorver pelas raízes. Esse déficit de água torna a cultura, como a soja, mais vulnerável ao ataque de doenças como a podridão de carvão.
Genótipos: Refere-se à constituição genética de uma planta. No contexto do artigo, é usado para diferenciar cultivares de soja que possuem diferentes níveis de sensibilidade ou tolerância ao fungo Macrophomina phaseolina.
Hipocótilo: A porção inicial do caule de uma plântula, localizada entre a raiz e as primeiras folhas (cotilédones). Em ataques severos de podridão de carvão, esta área pode apresentar lesões escuras logo após a germinação.
Inóculo: Refere-se a qualquer parte do fungo (neste caso, os microescleródios) capaz de iniciar uma nova infecção na planta. Restos de culturas infectadas e o solo contaminado são as principais fontes de inóculo da podridão de carvão.
MAPA: Sigla para Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. É o órgão do governo brasileiro responsável por regulamentar o setor agrícola, incluindo o registro e a aprovação de fungicidas e outros insumos.
Microescleródios: Estruturas de sobrevivência microscópicas e escuras, formadas pelo fungo causador da podridão de carvão. São eles que dão a aparência de “pó de carvão” no caule e permitem que o fungo permaneça no solo por anos.
Polífago: Termo que descreve um organismo capaz de se alimentar ou infectar uma grande variedade de hospedeiros. O fungo Macrophomina phaseolina é polífago por atacar diversas culturas (soja, milho, algodão), tornando a rotação de culturas uma estratégia de controle menos eficaz.
Reboleiras: Padrão de ocorrência de uma doença no campo, caracterizado por manchas ou áreas circulares onde as plantas estão visivelmente mais doentes ou mortas. É um sintoma comum da podridão de carvão na lavoura de soja.
Como a tecnologia pode apoiar o manejo preventivo
Como vimos, o manejo da podridão de carvão depende de um planejamento cuidadoso e da execução de múltiplas ações preventivas. Coordenar a época de plantio, a nutrição da lavoura e a higienização de maquinário exige um controle rigoroso para evitar perdas de produtividade. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza o planejamento da safra e o registro de atividades no campo. Isso permite não só organizar o calendário de operações, mas também monitorar os custos de cada etapa, garantindo que as estratégias de manejo protejam a sua lucratividade.
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Perguntas Frequentes
Por que a rotação de culturas não é tão eficaz para controlar a podridão de carvão?
A rotação de culturas tem eficácia limitada porque o fungo Macrophomina phaseolina é polífago, ou seja, ataca uma ampla variedade de hospedeiros, incluindo milho, algodão e girassol. Dessa forma, o fungo consegue sobreviver e se multiplicar mesmo na ausência da soja, mantendo o nível de inóculo no solo alto para a próxima safra.
Qual a principal diferença visual entre a podridão de carvão e o estresse hídrico?
Embora ambos causem murcha e amarelamento, o sinal definitivo da podridão de carvão é a presença de minúsculas partículas pretas (microescleródios) na base do caule e nas raízes, parecendo um pó de carvão. Esse sintoma não ocorre em plantas que sofrem apenas de estresse hídrico.
Se identifiquei podridão de carvão na lavoura este ano, qual o risco para a próxima safra de soja?
O risco para a próxima safra é muito alto. O fungo sobrevive no solo por vários anos na forma de microescleródios, que ficam nos restos culturais. Essas estruturas de resistência são a principal fonte de contaminação para o cultivo seguinte, especialmente se as condições de calor e seca se repetirem.
Existem fungicidas ou tratamentos químicos para combater a podridão de carvão na soja?
Atualmente, não há fungicidas registrados no MAPA para o controle químico da podridão de carvão durante o ciclo da cultura. Por isso, o manejo deve ser totalmente focado em estratégias preventivas para reduzir o estresse das plantas e criar um ambiente desfavorável ao desenvolvimento do fungo.
Como a compactação do solo piora o ataque da podridão de carvão?
Solos compactados dificultam o desenvolvimento do sistema radicular da soja, limitando sua capacidade de absorver água e nutrientes. Isso gera um estresse constante na planta, tornando-a mais fraca e, consequentemente, muito mais vulnerável à infecção e colonização pelo fungo Macrophomina phaseolina.
Qual é o período mais crítico para evitar a falta de água e reduzir os danos da doença?
O período mais crítico é a fase reprodutiva da soja, que engloba a floração e o enchimento dos grãos. O estresse hídrico nesse estágio aumenta drasticamente a severidade da doença, pois a planta está com suas reservas de energia focadas na produção, tornando-se mais suscetível ao avanço do patógeno.
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