A lagarta-rosada é um dos principais desafios para o produtor de algodão, causando danos que afetam tanto a produtividade quanto a qualidade da fibra. Quando adulta, a praga é uma mariposa cinza e fina, mas seu maior estrago ocorre na fase de larva, que possui uma coloração branca com faixas cor-de-rosa características, medindo pouco mais de um centímetro.
Conhecer a fundo as características e o ciclo de vida deste inseto é o primeiro passo para proteger seu algodoeiro de forma eficaz. Neste guia completo, vamos detalhar como identificar a lagarta-rosada em cada fase de desenvolvimento e como aplicar as melhores estratégias do Manejo Integrado de Pragas (MIP) para um controle eficiente e sustentável.
O que é a lagarta-rosada do algodão?
A lagarta-rosada é conhecida cientificamente por alguns nomes, como Pectinophora gossypiella, Gelechia gossypiella e Plateydra gossypiela, mas todos se referem ao mesmo inseto. Ela pertence à classe Insecta e à ordem Lepidoptera, sendo uma das principais pragas do algodão em diversas partes do mundo.
Sua distribuição geográfica é ampla, concentrando-se principalmente no hemisfério Sul. No Brasil, a praga está presente em praticamente todas as regiões produtoras, incluindo os estados de:
- Alagoas
- Amazonas
- Bahia
- Ceará
- Espírito Santo
- Maranhão
- Mato Grosso
- Minas Gerais
- Pará
- Paraíba
- Paraná
- Pernambuco
- Rio de Janeiro
- Rio Grande do Norte
- Santa Catarina
- São Paulo
- Sergipe
Distribuição da lagarta-rosada do algodão no mundo. Os círculos amarelos correspondem ao local onde a praga já foi identificada (Fonte: Banco de dados global, 2022)
O principal hospedeiro da lagarta-rosada é a cultura do algodão (Gossypium hirsutum). Contudo, ela também pode atacar outras espécies de algodão e plantas da mesma família, como o quiabo e o hibisco.
Em alguns países, como os Estados Unidos, a lagarta-rosada é classificada como praga de quarentena, o que exige medidas rigorosas de controle para evitar sua entrada e disseminação. Graças a esses esforços, ela é considerada erradicada no país desde 2018.
Como identificar a Pectinophora Gossypiella em cada fase
Para um manejo eficiente, é fundamental reconhecer a praga em todas as suas etapas de vida. O ciclo começa com ovos branco-esverdeados, depositados individualmente ou em pequenos grupos de 15 a 20 ovos. Após a eclosão, a lagarta passa por quatro fases distintas de desenvolvimento:
- Primeira fase: Nos primeiros 3 a 4 dias, as lagartas recém-eclodidas medem cerca de 2 mm e crescem até atingir 4 mm. Sua cabeça tem uma coloração amarela com marrom-escuro.
- Segunda fase: A lagarta adquire uma coloração predominantemente branca e cresce lentamente até atingir 6 mm de comprimento.
- Terceira fase: Nesta etapa, as marcações rosa começam a ficar visíveis, criando um contraste com a cor creme do restante do corpo.
- Quarta fase: A lagarta já está com a coloração rosa bem definida e atinge seu tamanho máximo, aproximadamente 9 mm. Durante esta fase, ela se alimenta intensamente dentro do capulho do algodão. Após se alimentar, ela sai do capulho e cai no solo para continuar seu ciclo.
Quando chega ao solo, o comportamento da lagarta-rosada depende diretamente das condições de temperatura, seguindo um de dois caminhos:
- Continuidade do ciclo: Se as condições forem favoráveis, ela se transforma em uma pupa marrom brilhante, medindo de 7 mm a 10 mm, para depois virar mariposa.
- Diapausa: Se as condições ambientais forem adversas (como frio ou seca), a lagarta entra em diapausa, um estado de desenvolvimento suspenso que garante sua sobrevivência até que o ambiente se torne favorável novamente.
O ciclo de vida completo da praga dura de 21 a 45 dias, variando conforme a temperatura.
Importante: O hábito da mariposa da lagarta-rosada é noturno. Portanto, as inspeções na lavoura para monitorar os adultos devem ser feitas em períodos que favoreçam sua atividade, como o final da tarde ou à noite, para facilitar a visualização e contagem.
Aspecto visual da lagarta-rosada se alimentando dentro do capulho, o que reduz a qualidade das fibras. (Fonte: Queiroga, 2017)
Danos causados pela lagarta-rosada do algodão
A lagarta-rosada (Pectinophora gossypiella) é uma praga que causa danos duplos na cultura do algodão: ela afeta não só a produtividade, mas também a qualidade da fibra. O principal problema é que a mariposa deposita seus ovos diretamente nas estruturas reprodutivas, como as maçãs novas do algodoeiro.
Os prejuízos são agravados pela capacidade de sobrevivência da praga. Ela consegue se manter na área mesmo em condições adversas, abrigada na palhada ou no solo, o que torna seu controle um grande desafio, especialmente em sistemas de plantio direto. Como os danos ocorrem diretamente nos capulhos, o resultado é uma perda direta tanto em quilos de algodão por hectare quanto no valor de mercado do produto final.
Outro ponto de atenção é a resistência. Já foram documentados casos de resistência da lagarta-rosada a inseticidas em diversos países, especialmente em relação à tecnologia Bt.
Danos diretos nas flores e capulhos
Fique atento aos sinais específicos do ataque nas plantas:
- Flores: Se o ataque ocorrer no início do florescimento, as flores podem não abrir corretamente, formando uma estrutura conhecida como “flor rosetada”.
- Frutos (Maçãs): Logo após a eclosão, a lagarta penetra nas maçãs e se alimenta das fibras em formação e das sementes, inviabilizando o capulho.
Danos da lagarta-rosada em maçãs do algodão, que comprometem a produção e a qualidade da fibra. (Fonte: Dos Santos, 2006 e Fand et al., 2019)
Fases de cultivo com maior prejuízo
A lagarta-rosada tem se tornado uma preocupação crescente nas últimas safras. Embora possa atacar em diferentes estágios, o período de maior risco e manifestação de danos na lavoura ocorre entre 70 e 100 dias após a semeadura, coincidindo com o início do florescimento.
No entanto, é crucial lembrar que o comportamento do inseto pode variar dependendo da região, da cultivar utilizada e das práticas de manejo. Por isso, o monitoramento constante da lavoura é indispensável em todas as fases de desenvolvimento da cultura.
Como controlar a lagarta-rosada-do-algodoeiro com MIP?
Um controle verdadeiramente eficiente da lagarta-rosada exige uma combinação de diferentes métodos, organizados dentro do Manejo Integrado de Pragas (MIP). Essa abordagem integra ações estratégicas, como:
- Escolha cuidadosa da época de semeadura do algodão;
- Implementação de manejos culturais;
- Catação e destruição de maçãs e capulhos caídos;
- Eliminação de restos culturais (soqueira) após a colheita;
- Uso combinado de controle químico e biológico.
No Agrofit, é possível consultar os defensivos registrados para o controle da praga. A escolha do produto, contudo, deve priorizar aqueles que causam menor impacto nos inimigos naturais. Sempre que possível, opte por inseticidas seletivos, pois a eliminação dos predadores e parasitoides pode levar ao aumento de pragas secundárias, que antes não causavam danos econômicos.
Confira abaixo outras medidas indispensáveis para um controle eficaz.
Manejos culturais da Pectinophora Gossypiella
- Áreas de refúgio: A semeadura de áreas de refúgio com algodão não-Bt é fundamental para retardar o desenvolvimento de resistência da praga à tecnologia Bt.
- Cultivares precoces: O uso de cultivares de ciclo mais curto pode ajudar a “escapar” dos picos populacionais da praga, reduzindo o tempo de exposição.
- Época de semeadura: Evite semeaduras muito antecipadas. Nesses casos, os insetos em hibernação podem emergir e encontrar alimento, aumentando a população que atacará o cultivo principal.
- Emergência suicida: Ao semear na época ideal, os insetos que saem da diapausa emergem, mas não encontram hospedeiro para se alimentar e reproduzir. Isso causa uma redução natural da população na área, um fenômeno conhecido como “emergência suicida”.
Armadilhas para monitoramento
A instalação de armadilhas com feromônio sexual feminino é uma ferramenta essencial para monitorar a população de mariposas na área. Elas atraem os machos e permitem quantificar a presença da praga, ajudando a decidir o momento certo para iniciar o controle.
Manejos químicos e biológicos
- Controle biológico: O uso de fungos entomopatogênicos, que causam doenças em insetos, é uma excelente alternativa. Outra estratégia eficaz é a liberação de ovos de vespas parasitoides, como as da espécie Trichogramma. Pesquisas indicam a necessidade de até 12 liberações por safra, com intervalo de até 15 dias entre elas, a partir do florescimento.
- Controle químico: Quando o controle químico for necessário, podem ser utilizados inseticidas com ação ovicida. Além disso, a aplicação do produto caulim, na concentração de 60 g por litro de água, também tem se mostrado eficaz.
Manejos pós-colheita
O controle não termina com a colheita do algodão. É fundamental realizar a limpeza e o controle em locais de armazenamento, como galpões, depósitos, esteiras e descaroçadores. Esses locais podem abrigar lagartas em diapausa, que se tornarão o foco de infestação para a próxima safra. O uso de iscas com feromônios nesses locais também é uma boa medida.
Qual o nível de controle para a lagarta-rosada do algodoeiro?
Se você já identificou a presença da lagarta-rosada na sua lavoura, é preciso agir com base em um nível de controle claro para evitar perdas econômicas.
A regra é clara: o controle da lagarta-rosada deve começar quando 5% das maçãs do algodoeiro em formação apresentarem danos. Essa avaliação deve ser feita em uma amostragem representativa de, no mínimo, 100 maçãs coletadas em diferentes pontos da área.
Lembre-se que o monitoramento deve ser constante, com atenção redobrada durante o período reprodutivo da cultura, fase em que os danos são mais severos e impactam diretamente a produção.
Conclusão
A lagarta-rosada se consolida como uma das pragas mais desafiadoras para o algodoeiro, principalmente devido à redução da eficiência de alguns inseticidas e casos de resistência. Esse cenário é um reflexo direto de práticas como a não implantação de áreas de refúgio e o uso inadequado de defensivos.
Diante disso, o MIP (Manejo Integrado de Pragas) se torna a ferramenta mais importante para um manejo de resistência eficaz e sustentável. A combinação de práticas culturais, monitoramento, controle biológico e uso criterioso de químicos é a chave para proteger a lavoura.
Se tiver dúvidas sobre qual medida de controle adotar, consulte um(a) engenheiro(a)-agrônomo(a) para definir as melhores estratégias para a sua realidade.
Glossário
Áreas de refúgio: Porções da lavoura plantadas com sementes de algodão convencional (não-Bt), localizadas próximas à área com tecnologia Bt. Essa prática visa manter uma população de pragas suscetíveis, retardando o desenvolvimento de resistência da lagarta à tecnologia.
Diapausa: Um estado de dormência ou desenvolvimento suspenso no ciclo de vida de um inseto, ativado por condições desfavoráveis como frio ou seca. A lagarta-rosada usa a diapausa para sobreviver no solo ou em restos culturais entre as safras de algodão.
Emergência suicida: Fenômeno que ocorre quando as pragas que estavam em diapausa emergem do solo, mas não encontram plantas hospedeiras (algodão) para se alimentar e reproduzir, morrendo em seguida. É um resultado direto do cumprimento do vazio sanitário e da semeadura na época correta.
Flor rosetada: Sintoma característico do ataque da lagarta-rosada, no qual as flores do algodoeiro não se abrem corretamente. As pétalas ficam unidas, formando uma estrutura semelhante a uma roseta, o que impede a formação da maçã.
Fungos entomopatogênicos: Micro-organismos, como fungos, que são inimigos naturais de insetos e causam doenças que os levam à morte. São uma ferramenta importante no controle biológico da lagarta-rosada.
MIP (Manejo Integrado de Pragas): Uma abordagem estratégica que combina diferentes métodos de controle (cultural, biológico, químico) para manter as pragas abaixo do nível de dano econômico. Seu objetivo é ser eficiente, sustentável e reduzir a dependência de defensivos químicos.
Praga de quarentena: Uma praga de grande potencial destrutivo que não existe em um determinado país ou região, ou que existe em áreas restritas e está sob controle oficial. Sua presença exige medidas rigorosas para evitar sua disseminação e erradicá-la.
Tecnologia Bt: Refere-se a plantas geneticamente modificadas, como o algodão Bt, que produzem proteínas da bactéria Bacillus thuringiensis. Essas proteínas atuam como um inseticida natural, controlando o ataque de certas lagartas, incluindo a lagarta-rosada.
Como a tecnologia pode ajudar no controle da lagarta-rosada
O Manejo Integrado de Pragas (MIP), como vimos, é a estratégia mais eficaz contra a lagarta-rosada, mas exige um controle rigoroso de datas, monitoramentos e aplicações. Organizar todas essas frentes de trabalho pode ser um grande desafio, especialmente durante os picos da safra.
Para facilitar esse processo, ferramentas de gestão agrícola como o Aegro são essenciais. Com um software, você pode registrar os dados do monitoramento — como a contagem de mariposas nas armadilhas e a porcentagem de maçãs atacadas — diretamente no campo pelo celular. Isso cria um histórico confiável para decidir o momento certo de intervir, garantindo que o controle seja feito apenas quando necessário e evitando gastos desnecessários com defensivos.
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Perguntas Frequentes
Qual é o principal sintoma visual do ataque da lagarta-rosada nas flores do algodão?
O principal sintoma é a formação da chamada “flor rosetada”. Isso acontece quando a lagarta ataca os botões florais, fazendo com que as pétalas fiquem unidas e a flor não consiga se abrir corretamente. Uma flor com esse dano não se desenvolverá em uma maçã, causando perda direta de produtividade.
Por que o algodão com tecnologia Bt, por si só, não é suficiente para controlar a lagarta-rosada?
O uso exclusivo e contínuo do algodão Bt acelera a seleção de indivíduos resistentes à tecnologia na população da praga. Para preservar a eficácia do Bt, é fundamental adotar o Manejo Integrado de Pragas (MIP), que inclui a criação de áreas de refúgio com algodão não-Bt, monitoramento constante e o uso de outras táticas de controle.
O que é a diapausa e por que ela torna a lagarta-rosada um desafio entre as safras?
A diapausa é um estado de dormência que permite à lagarta sobreviver em condições adversas, como a entressafra, quando não há algodão no campo. A praga permanece no solo ou em restos culturais, como maçãs caídas, tornando-se uma fonte de infestação para a safra seguinte. Por isso, a destruição da soqueira é uma prática de manejo crucial.
Quando exatamente devo iniciar o controle químico da lagarta-rosada na lavoura?
O controle químico deve começar quando o nível de dano econômico é atingido. A recomendação técnica é intervir quando o monitoramento apontar que 5% das maçãs em formação estão sendo atacadas. Essa decisão deve ser baseada em uma amostragem representativa, analisando no mínimo 100 maçãs de diferentes pontos da área.
Como posso utilizar a ’emergência suicida’ a meu favor no controle da praga?
A “emergência suicida” é um fenômeno que ocorre quando as mariposas que saem da diapausa não encontram plantas de algodão para se alimentar e reproduzir, morrendo antes de completar seu ciclo. Para promover isso, o produtor deve respeitar rigorosamente o vazio sanitário e realizar a semeadura na época recomendada, evitando plantios muito antecipados.
Além do algodão, a lagarta-rosada pode atacar outras culturas?
Sim. Embora seu principal hospedeiro seja o algodão, a lagarta-rosada também pode atacar outras plantas da mesma família (Malvaceae), como o quiabo e o hibisco. Ter essas plantas perto da lavoura de algodão pode servir como um hospedeiro alternativo para a praga, exigindo atenção no manejo da área como um todo.
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