Os fungos entomopatogênicos são grandes aliados no controle de pragas na sua lavoura. Pense neles como um exército microscópico que trabalha a seu favor.
Esses microrganismos, que muitas vezes passam despercebidos, atuam como inimigos naturais de insetos e ácaros que ameaçam sua produção.
Para que funcionem bem, a eficiência deles depende de um bom Manejo Integrado de Pragas (MIP). Isso significa usar defensivos compatíveis e aplicar tudo de forma equilibrada e planejada.
Neste artigo, vamos explicar em detalhes como esses fungos ajudam no controle de pragas e quais cuidados você precisa ter para garantir que o controle biológico seja um sucesso na sua fazenda. Boa leitura!
O que são fungos entomopatogênicos?
Fungos entomopatogênicos: significa fungos que causam doenças em insetos. Eles são microrganismos capazes de infectar e colonizar diversas espécies de pragas, causando doenças conhecidas como epizootias.
Uma epizootia é como uma epidemia para os insetos. Ela pode causar a morte ou, no mínimo, atrapalhar a alimentação e a reprodução de insetos e ácaros, reduzindo a população da praga.
Na cultura da soja, por exemplo, eles são fundamentais para o controle biológico de lagartas.
Eles também são eficazes na proteção de diferentes cultivos contra a mosca-branca, cigarrinhas, ácaros e muitos outros insetos-praga.
Os dois tipos mais estudados e usados no campo são:
- Beauveria bassiana
- Metarhizium anisopliae
Como os Fungos Agem no Controle de Pragas: Atuação e Utilização
De forma geral, os fungos entomopatogênicos atacam seus hospedeiros (as pragas) ao penetrar e colonizar seus corpos.
O processo de infecção acontece em 6 etapas principais:
- Adesão: O esporo do fungo gruda na parte externa do corpo do inseto (cutícula).
- Germinação: As estruturas do fungo começam a germinar sobre o corpo do inseto, como uma semente brotando.
- Penetração: O fungo atravessa a “pele” do inseto, atingindo o interior do seu corpo.
- Superação das Defesas: O inseto tenta se defender com seu sistema imunológico, mas o fungo consegue superar essas defesas.
- Proliferação: O fungo se multiplica dentro do corpo da praga, formando suas estruturas de disseminação.
- Disseminação: Após a morte do inseto, o fungo cresce para fora do corpo dele, produzindo novos esporos que podem infectar outras pragas.
O sucesso desse processo depende muito do estágio de desenvolvimento da praga. No caso das lagartas, por exemplo, quanto mais novas elas forem quando infectadas, mais eficaz será o controle.
Ponto de Atenção: Para que o fungo germine e infecte a praga, é fundamental que haja alta umidade no ambiente. Em condições de tempo muito seco, a aplicação pode não funcionar.
Antes mesmo de matar a praga, os fungos já causam problemas, como mudanças no comportamento alimentar, perda de peso, esterilidade e malformações.
Ciclo da relação patógeno-hospedeiro de Metarhizium anisopliae sobre a cigarrinha-da-raiz da cana-de-açúcar (Mehanarva fumbriolata)
(Fonte: adaptado de Alves, 1998 e Mascarin, 2010)
Por que utilizar fungos entomopatogênicos?
A resistência das pragas aos defensivos agrícolas químicos é um problema que cresce a cada safra. A cada ano, surgem mais relatos de insetos, ácaros e doenças que não são mais controlados pelas moléculas disponíveis no mercado, o que preocupa produtores, técnicos e pesquisadores.
Nesse cenário, utilizar microrganismos como os fungos entomopatogênicos é uma alternativa inteligente, que traz vários benefícios:
- Menor impacto ao meio ambiente.
- Menor custo em muitos casos.
- Alta eficiência quando bem manejado.
- Reduz o risco de resistência das pragas.
Principais Programas de Controle Biológico com Fungos no Brasil
No Brasil, os fungos entomopatogênicos são usados com sucesso para controlar pragas em diversas culturas importantes. Veja os principais exemplos:
Cana-de-açúcar
- Cigarrinha-da-cana-de-açúcar (Mahanarva posticata e M. fimbriolata).
- Cupim da cana-de-açúcar (Cornitermes).
- Gafanhotos (Schistocerca pallens, Stiphra robusta e Rhammatocerus schistocercoides), que também atacam lavouras de arroz e pastagens.
Mahanarva posticata (cigarrinha-da-cana-de-açúcar) à esquerda e M. fimbriolata à direita, que causam danos nas folhas e raízes da cana-de-açúcar
(Fonte: Agrolink)
Cornitermes cumulans (cupim-da-cana-de-açúcar)
(Fonte: Silva e colaboradores, 2021)
Schistocerca pallens
(Fonte: Moreira et al., 1999)
Pastagens
As cigarrinhas-das-pastagens (dos gêneros Mahanarva, Deois e Zulia) podem reduzir drasticamente a oferta de alimento para o gado, impactando tanto a produção de corte quanto a de leite.
Adulto de Deois flavopicta e sintomas de danos em milho
(Fonte: Cruz et al., 2010)
Cafeeiro
A broca-do-cafeeiro (Hypothenemus hampei) é uma praga presente em praticamente todas as regiões produtoras de café. Ela pode ser controlada com o fungo Beauveria bassiana.
Recomendação Prática: Inicie a aplicação quando 1 a 2% dos frutos estiverem broqueados, direcionando o produto para as partes da planta com maior infestação.
Hypothenemus hampei (broca-do-cafeeiro)
(Fonte: Koppert)
Soja
A lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis) e a falsa-medideira (Chrysodeixis includens) são duas das principais pragas da soja, mas também atacam outras culturas como alfafa, amendoim, arroz, feijão e trigo, podendo causar até 100% de desfolha.
O controle de ambas pode ser feito com o fungo Nomuraea rileyi. Em anos úmidos, ele apresenta resultados muito satisfatórios no controle de várias espécies de lagartas (lepidópteros) na soja.
Mas atenção: o fungo Nomuraea rileyi ocorre naturalmente no campo se as condições ambientais forem favoráveis:
- Umidade: superior a 60%.
- Temperatura: entre 26 °C e 27 °C.
Embora possa proporcionar até 90% de controle das lagartas, a aplicação de certos inseticidas, fungicidas e herbicidas pode diminuir a sua eficiência.
Ovos, pupa e larva de quinto ínstar de Anticarsia gemmatalis
(Fonte: Praça, Moraes e Monnerat, 2006.)
Lagarta, fase de pupa e mariposa (Chrysodeixis includens)
(Fonte: Agrolink)
Milho
O fungo Beauveria bassiana é utilizado para o controle da lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda).
Fases de desenvolvimento de Spodoptera frugiperda – lagarta-do-cartucho-do-milho
(Fonte: Carneiro e colaboradores, 2004)
Dosagens e Aplicações: Recomendações Práticas
Para usar os fungos a seu favor, siga as recomendações técnicas. Aqui estão algumas dosagens comuns:
- Controle de cigarrinhas: O controle é feito com o fungo Metarhizium anisopliae, em concentrações de 500 g de esporos por hectare.
- Controle de cupins: Os fungos M. anisopliae e Beauveria bassiana são muito eficientes contra cupins-de-montículo e da cana-de-açúcar. A aplicação deve ser feita diretamente nos ninhos, em doses de 6 a 12 gramas da formulação em pó seco.
- Controle de gafanhotos: Utilize o fungo Metarhizium flavoride, que geralmente é produzido em arroz pré-cozido.
As vantagens desse manejo são claras: menor uso de defensivos químicos, o que evita desequilíbrios e contaminação ambiental, menos riscos para os aplicadores e menor chance de as pragas desenvolverem resistência.
Diversidade de fungos entomopatogênicos colonizando diferentes insetos-praga. A) Aschersonia sp. em Bemisia tabaci, B) Lecanicillium longisporum em Orthezia praelonga, C) Isaria fimbriolata, E) Lecanicillium em Coccus viridis, F) Beauveria bassiana em Sphenophorus levis, G) B. bassiana em Hypothenemus hampei, H) B. bassiana em Anaestrpha sp
(Fonte: Mascarin & Pauli, 2010)
No sistema Agrofit, do Ministério da Agricultura, você pode consultar a lista de produtos biológicos disponíveis. É comum que um mesmo microrganismo controle mais de uma praga de interesse agrícola, mostrando seu amplo espectro de ação.
A tabela a seguir mostra alguns dos formulados biológicos à base de fungos e as pragas que eles controlam.
Atenção: Produtos de diferentes fabricantes, mesmo que formulados com o mesmo agente biológico, podem conter cepas (variações do fungo) que não são eficazes para todas as pragas listadas. Sempre consulte a bula do produto antes de usar.
Pontos Críticos para o Sucesso do Controle Biológico
Quando você aplica esses fungos no campo, diversos fatores podem afetar sua capacidade de sobreviver, se espalhar e infectar as pragas. Fique de olho nestes pontos:
Compatibilidade com Produtos Químicos
É essencial planejar e avaliar a compatibilidade dos fungos com outros agrotóxicos usados na lavoura, como inseticidas, fungicidas e até herbicidas.
- Compatíveis: Em estudos com cana-de-açúcar, inseticidas à base de tiametoxam não afetaram o crescimento, a produção e a viabilidade dos esporos de Beauveria bassiana e Metarhizium anisopliae. Herbicidas como imazapir, glifosato e metribuzin também foram considerados compatíveis.
- Parcialmente Tóxico: O inseticida fipronil é considerado parcialmente tóxico para ambos os fungos.
- Tóxico: O inseticida e nematicida aldicarbe foi considerado tóxico para os dois fungos.
Portanto, em programas de MIP (Manejo Integrado de Pragas), conhecer a compatibilidade dos produtos é indispensável para não anular o efeito do controle biológico.
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Radiação Solar, UV e Temperatura
O ambiente no momento da aplicação é decisivo. Fatores como radiação solar, raios ultravioleta (UV) e temperaturas extremas (muito altas ou muito baixas) podem prejudicar o desempenho dos fungos.
- Radiação UV: Pode inativar os esporos, causar mutações genéticas e até matar o fungo. Além disso, a radiação causa o ressecamento das estruturas do fungo, impedindo sua germinação e a infecção da praga.
- Temperatura Ideal: Estudos mostram que temperaturas entre 23,8 °C e 31 °C são ideais para a germinação dos esporos. Temperaturas abaixo de 20 °C já dificultam o processo.
Por isso, sempre observe as condições do tempo no dia da aplicação e nos dias seguintes para garantir um ambiente favorável ao desenvolvimento dos microrganismos.
Armazenamento, Monitoramento e Aplicação
Para garantir a máxima eficiência, siga estas boas práticas:
Glossário
Controle Biológico: Estratégia de manejo de pragas que utiliza organismos vivos (como fungos, bactérias ou outros insetos) para reduzir a população de uma praga. É uma alternativa ao uso exclusivo de defensivos químicos.
Cepa: Refere-se a uma linhagem ou variação genética específica dentro de uma espécie de microrganismo. Diferentes cepas do mesmo fungo podem apresentar níveis variados de eficácia contra pragas distintas.
Cutícula: A camada externa protetora do corpo de um inseto, funcionando como um exoesqueleto ou “pele”. É a primeira barreira que os fungos entomopatogênicos precisam penetrar para iniciar a infecção.
Epizootia: Ocorrência de uma doença que se espalha rapidamente e afeta um grande número de indivíduos em uma população de pragas. É o equivalente a uma “epidemia” para insetos.
Esporo: Estrutura reprodutiva microscópica de um fungo, análoga a uma semente. No controle biológico, são os esporos que entram em contato com a praga, germinam e causam a doença.
Fungos Entomopatogênicos: Microrganismos que causam doenças especificamente em insetos e ácaros, levando-os à morte. São a base de muitos bioinseticidas utilizados na agricultura.
Lepidópteros: Ordem de insetos que inclui borboletas e mariposas. No contexto agrícola, o termo é frequentemente usado para se referir às suas formas jovens (larvas), conhecidas como lagartas, que são pragas importantes em diversas culturas.
MIP (Manejo Integrado de Pragas): Uma abordagem que combina diversas táticas de controle (biológico, cultural, químico) de forma planejada e sustentável. O objetivo é manter as pragas abaixo do nível de dano econômico, com o mínimo impacto ambiental e para a saúde.
Como a tecnologia ajuda a gerenciar o controle biológico
Colocar em prática um Manejo Integrado de Pragas (MIP) bem-sucedido, como o uso de fungos entomopatogênicos, exige um planejamento rigoroso. O desafio está em registrar cada aplicação, garantir a compatibilidade entre produtos e monitorar as condições ideais para o sucesso do controle. Ferramentas de gestão agrícola como o Aegro centralizam essas informações, permitindo que você planeje o calendário de atividades, registre os insumos utilizados em cada talhão e acompanhe o histórico de manejo de forma simples e visual.
Além do controle operacional, é crucial medir o impacto financeiro dessa estratégia. Um sistema de gestão ajuda a rastrear os custos com bioinsumos e a comparar com os defensivos químicos, mostrando claramente o retorno sobre o investimento. Dessa forma, suas decisões são baseadas em dados precisos, garantindo uma produção mais rentável e sustentável.
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Perguntas Frequentes
Qual a principal diferença na ação dos fungos entomopatogênicos em comparação com inseticidas químicos?
A principal diferença está no modo de ação. Enquanto inseticidas químicos geralmente têm efeito imediato por contato ou ingestão, os fungos entomopatogênicos agem como patógenos, causando uma doença que leva a praga à morte. Esse processo biológico é mais lento, mas tem a vantagem de reduzir o risco de desenvolvimento de resistência pela praga e apresentar menor impacto ambiental.
Por que a alta umidade é tão importante para a eficácia do controle biológico com fungos?
A alta umidade é fundamental porque os esporos do fungo precisam de água para germinar sobre o corpo do inseto, um passo essencial para iniciar a infecção. Em condições de tempo seco, os esporos podem se ressecar e não conseguir penetrar a cutícula da praga, o que torna a aplicação ineficaz.
Posso misturar fungos entomopatogênicos com outros defensivos agrícolas no tanque de pulverização?
Depende do produto. Alguns defensivos químicos são compatíveis e podem ser misturados, enquanto outros são tóxicos e podem inativar os fungos, anulando o efeito do controle biológico. É indispensável verificar a compatibilidade na bula do bioinseticida e, preferencialmente, consultar um engenheiro agrônomo para planejar as aplicações dentro de um Manejo Integrado de Pragas (MIP).
Quanto tempo leva para os fungos matarem as pragas após a aplicação?
O controle não é imediato. Após a aplicação, o fungo precisa de tempo para aderir, germinar, penetrar e se proliferar dentro do inseto, processo que pode levar de 3 a 7 dias, dependendo das condições ambientais e da praga. Mesmo antes da morte, o inseto infectado já pode apresentar redução na alimentação e na reprodução.
Qual é o melhor horário para aplicar produtos à base de fungos entomopatogênicos?
A aplicação deve ser feita em horários com temperaturas mais amenas e alta umidade relativa do ar, como no final da tarde, à noite ou em dias nublados. Isso evita que a radiação ultravioleta (UV) do sol e as altas temperaturas prejudiquem a viabilidade dos esporos, garantindo as condições ideais para que eles infectem as pragas.
Os fungos entomopatogênicos são seguros para os inimigos naturais e para a saúde humana?
Sim, eles são considerados uma alternativa segura e sustentável. Por serem específicos para insetos, esses fungos apresentam baixo ou nenhum risco para humanos, animais domésticos e para a maioria dos inimigos naturais (insetos benéficos). Isso os torna uma ferramenta valiosa para preservar o equilíbrio do ecossistema agrícola e reduzir a exposição dos aplicadores a produtos químicos.
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