O Brasil é o maior produtor de soja do mundo. Mas você sabia que, com o manejo correto, a produtividade da sua lavoura poderia ser até 42% maior?
Um dos pontos que mais impacta os seus resultados é o controle de doenças. Por isso, é fundamental conhecer as melhores estratégias e usar os produtos de forma inteligente para evitar que os fungos criem resistência.
Nesse cenário, os fungicidas multissítios, já comprovados em outras culturas, aparecem como uma ferramenta poderosa no manejo de doenças na soja.
A seguir, vamos explicar em detalhes o que são esses fungicidas e por que eles podem fazer uma grande diferença na sua próxima safra.
O que são fungicidas multissítios e como funcionam?
Os fungicidas são classificados em duas categorias principais, dependendo de como eles atacam os fungos: sítio-específicos e multissítios. Entender a diferença é crucial para um manejo eficiente.
Fungicidas de Sítio-Específico
Esses produtos agem de forma muito precisa, atacando um único ponto no metabolismo do fungo. Pense neles como uma chave específica que só funciona em uma fechadura.
- Como atuam: Interferem em uma única proteína ou enzima que o fungo precisa para sobreviver.
- Risco de resistência: Alto. Como o ataque é em um único ponto, o fungo tem mais chance de desenvolver uma “defesa” e sobreviver, passando essa resistência para as próximas gerações.
- Ação na planta: Geralmente possuem ação sistêmica: significa que, após a aplicação, o produto é absorvido pela planta e se move por seus tecidos, protegendo-a por dentro.
Fungicidas Multissítios
Ao contrário dos sítio-específicos, os fungicidas multissítios atacam os fungos de várias frentes ao mesmo tempo. É como usar várias chaves diferentes em várias fechaduras.
- Como atuam: Afetam diferentes processos vitais do fungo simultaneamente.
- Risco de resistência: Muito baixo. É extremamente difícil para o fungo desenvolver defesas contra múltiplos ataques ao mesmo tempo.
- Ação na planta: Atuam por ação de contato: significa que eles formam uma camada protetora na superfície da folha, impedindo que os esporos dos fungos germinem e infectem a planta. Por isso, são aplicados de forma preventiva.
Como ficam do lado de fora da planta, os fungicidas de contato podem ser lavados pela chuva ou degradados pela luz do sol. Por essa razão, a melhor estratégia é sempre utilizá-los em associação com produtos de sítio-específico, combinando o melhor dos dois mundos.
Quais são os principais benefícios de usar fungicidas multissítios?
Integrar os multissítios no seu programa de manejo traz vantagens diretas para a proteção da lavoura e para o seu bolso.
- Controle amplo: Eles são eficazes contra uma grande variedade de patógenos, como você verá na tabela mais adiante. Isso simplifica o manejo, pois um único produto ajuda a controlar vários problemas.
- Reduz o risco de resistência: Por atacarem os fungos de várias maneiras, eles diminuem a pressão de seleção. Ou seja, mesmo que um fungo consiga escapar de um dos ataques, os outros mecanismos de ação continuarão a controlá-lo.
- Aumentam a vida útil de outros produtos: Ao serem usados em mistura com fungicidas de sítio-específico (como estrobilurinas e carboxamidas), os multissítios protegem esses produtos, retardando ou evitando o surgimento de resistência e garantindo que eles continuem funcionando bem por mais safras.
Recomendações de aplicação para a cultura da soja
O manejo da ferrugem asiática, uma das doenças mais severas da soja, tem enfrentado desafios com a perda de sensibilidade dos principais grupos de fungicidas (triazois, estrobilurinas e carboxamidas). Por isso, o uso de multissítios se tornou uma recomendação técnica essencial.
Estratégias com Fungicidas Multissítios
Pesquisas da Embrapa demonstram a eficácia dessas combinações:
- Resultados expressivos: A associação de picoxistrobina+ciproconazol (sítio-específicos) com oxicloreto de cobre (multissítio) manteve a severidade da ferrugem em cerca de
20%
. Na área sem tratamento, a severidade chegou a73%
. - Redução significativa: O uso de picoxistrobina+ciproconazol com clorotalonil (multissítio) reduziu a severidade da ferrugem em aproximadamente
60%
em testes de campo. - Potencial comprovado: Em experimentos na safra 2019/20, o uso isolado de clorotalonil e mancozebe reduziu a severidade da ferrugem entre
40%
e50%
em comparação com a área sem tratamento.
O FRAC-BR (Comitê de Ação à Resistência a Fungicidas) reforça que as recomendações devem se basear em produtos registrados para o controle da ferrugem asiática. Você pode verificar a lista completa no Sistema Agrofit do Ministério da Agricultura.
Estratégias com Produtos de Sítio-Específico
Para garantir a eficácia e evitar resistência, siga estas diretrizes:
- Estrobilurinas: Sempre devem ser aplicadas em combinação com triazóis, triazolinthione ou carboxamidas.
- Triazóis e Triazolinthione: Não devem ser usados de forma isolada, pois já existem casos de resistência.
- Carboxamidas: Devem ser sempre utilizadas em combinações, principalmente com estrobilurinas.
O ponto mais importante é que o controle deve ser iniciado de forma preventiva. Isso evita expor os fungicidas a uma alta população de fungos, o que acelera o processo de resistência.
Recentemente, novas tecnologias foram lançadas combinando carboxamidas (sítio-específico) com multissítios como o oxicloreto de cobre, oferecendo uma solução robusta e pronta para o manejo da ferrugem.
Para uma lista completa dos grupos químicos e seus modos de ação, consulte o site do FRAC-BR. Lembre-se sempre de seguir as recomendações da bula para doses, épocas e intervalos de aplicação.
Combinações de fungicidas de diferentes sítios de ação (sítio específico e multissítio) no controle de diferentes patógenos causadores de doenças na cultura da soja
(Fonte: adaptado de Agrofit)
Resistência dos fungos: por que acontece e como evitar?
A resistência surge por uma combinação de dois fatores: a enorme variedade genética dos fungos e sua rápida capacidade de se multiplicar.
Quando aplicamos o mesmo fungicida de sítio-específico repetidamente, sem outras táticas de manejo, estamos fazendo uma pressão de seleção. Isso significa que eliminamos os fungos sensíveis, mas qualquer indivíduo que, por acaso, tenha uma mutação que o torne resistente, sobrevive e se multiplica, passando essa característica adiante.
Para evitar esse problema, o FRAC-BR recomenda as seguintes estratégias:
- Rote ingredientes ativos: Utilize produtos com diferentes mecanismos de ação ao longo da safra. Não use sempre a mesma “ferramenta”.
- Siga a bula: Aplique os fungicidas na época, dose e intervalo corretos recomendados pelo fabricante.
- Adote o Manejo Integrado de Doenças (MID): Combine diferentes métodos de controle, como o cultural (rotação de culturas, vazio sanitário), o genético (uso de variedades resistentes) e o biológico, sempre verificando a compatibilidade entre os produtos.
- Consulte um agrônomo: Um profissional qualificado pode indicar os ingredientes ativos mais adequados para a sua realidade e para os desafios da sua região.
Planejar o uso de misturas e rotacionar os mecanismos de ação é a base para um programa de controle sustentável e eficaz.
Programa de aplicação de fungicidas, estratégia e risco de resistência. A – fungicida com alto risco de resistência; B – fungicida com baixo risco de resistência.
(Fonte: adaptado de Zambolim, 2008)
9 possíveis causas para falhas no controle com fungicidas
Muitas vezes, quando o controle químico falha, a culpa recai sobre o produto. No entanto, outros fatores podem estar por trás do insucesso. Confira os principais:
- Diagnóstico incorreto da doença: Aplicar o produto errado para o problema errado nunca funciona.
- Escolha inadequada da área de plantio: Plantar em locais com excesso de umidade e pouca ventilação cria um ambiente perfeito para os fungos.
- Clima favorável à doença: Em regiões onde o vazio sanitário não é respeitado ou a irrigação é constante (como em áreas de pivô central no Mato Grosso do Sul), a pressão inicial da ferrugem é muito alta.
- Desconhecimento dos fatores de predisposição: Fatores como nutrição desequilibrada, compactação do solo e estresse hídrico podem deixar a planta mais suscetível a doenças.
- Uso de uma única medida de controle: Confiar apenas no controle químico com o mesmo ingrediente ativo é uma receita para a resistência.
- Época de aplicação errada: Aplicar o fungicida fora do estádio de desenvolvimento recomendado ou sem atingir o local onde o fungo ataca (como a parte de baixo das folhas) reduz a eficácia.
- Aplicação curativa tardia: Usar fungicidas sistêmicos quando a doença, como a ferrugem asiática, já está em níveis severos na lavoura, compromete o resultado.
- Dose incorreta: Aplicar doses abaixo ou acima do recomendado pode não controlar a doença ou acelerar a resistência.
- Problemas na aplicação: O uso de adjuvantes inadequados, pH incorreto da calda e falhas na tecnologia de aplicação (bicos errados, má regulagem) impedem que o produto chegue ao alvo corretamente.
Conclusão
Neste artigo, vimos a diferença clara entre os fungicidas sítio-específicos e os multissítios, e entendemos como eles se tornam aliados poderosos quando utilizados em conjunto.
Analisamos também as principais causas da resistência dos fungos e as estratégias recomendadas para evitar que ela aconteça na sua lavoura.
Lembre-se: o sucesso no controle de doenças depende de um bom monitoramento, diagnóstico correto e, acima de tudo, do planejamento cuidadoso do uso dos produtos. Com as ferramentas certas e a estratégia correta, você protege seu investimento e garante uma safra mais produtiva e rentável.
Glossário
Ação de contato: Tipo de ação de fungicidas que formam uma camada protetora na superfície da planta, impedindo a germinação dos esporos. Funciona como um “escudo” externo, sendo ideal para aplicações preventivas.
Ação sistêmica: Tipo de ação em que o fungicida é absorvido pela planta e se move através de seus tecidos (seiva). Age como um “remédio” interno, protegendo a planta por dentro, inclusive em partes que não receberam a pulverização diretamente.
Carboxamidas, Estrobilurinas e Triazóis: Nomes de importantes grupos químicos de fungicidas de sítio-específico. Cada grupo possui um mecanismo de ação diferente, e a rotação entre eles é fundamental para o manejo da resistência de fungos.
Ferrugem asiática: Uma das doenças mais severas que afetam a cultura da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi. Causa desfolha precoce e pode levar a perdas significativas de produtividade se não for controlada adequadamente.
FRAC-BR: Sigla para “Comitê de Ação à Resistência a Fungicidas - Brasil”. É um comitê de especialistas que estuda e recomenda as melhores práticas para evitar que os fungos se tornem resistentes aos fungicidas disponíveis no mercado.
Fungicidas de Sítio-Específico: Produtos que atacam o fungo em um único ponto do seu metabolismo. São muito eficientes, mas o uso repetido pode levar ao rápido desenvolvimento de resistência, pois o fungo precisa de apenas uma mutação para sobreviver.
Fungicidas Multissítios: Produtos que atacam o fungo em múltiplos pontos do seu metabolismo simultaneamente. Por terem vários mecanismos de ação, o risco de o fungo desenvolver resistência a eles é muito baixo.
Pressão de seleção: Fenômeno que ocorre com o uso contínuo de um mesmo fungicida. Os fungos sensíveis são eliminados, enquanto os indivíduos que possuem alguma resistência natural sobrevivem e se multiplicam, tornando a população do fungo resistente ao produto.
Vazio sanitário: Período obrigatório, definido por lei, em que não se pode ter plantas vivas de soja no campo. Essa medida visa quebrar o ciclo de vida da ferrugem asiática e de outras doenças, reduzindo a quantidade de fungos presentes no início da safra seguinte.
Veja como o Aegro pode ajudar a superar esses desafios
Planejar a rotação de fungicidas para evitar a resistência e, ao mesmo tempo, controlar os custos com defensivos são dois dos maiores desafios na cultura da soja. Um registro detalhado de cada aplicação é fundamental, mas fazer isso em planilhas ou cadernos pode gerar erros e dificultar a análise do que realmente funcionou na safra.
Um software de gestão agrícola como o Aegro resolve isso centralizando o planejamento e o controle das suas operações. Nele, você pode registrar todas as aplicações de defensivos, monitorar os custos por talhão e analisar o desempenho de cada estratégia. Isso não só ajuda a evitar a resistência, garantindo a eficácia dos produtos por mais tempo, mas também assegura que seu investimento está trazendo o máximo retorno.
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Perguntas Frequentes
Qual a principal diferença prática entre um fungicida multissítio e um de sítio-específico?
A principal diferença está na forma de atuação. Fungicidas multissítios agem por contato, formando uma barreira protetora na superfície da folha e devem ser aplicados preventivamente. Já os fungicidas de sítio-específico geralmente têm ação sistêmica, sendo absorvidos e movidos pela planta, o que lhes confere uma ação mais curativa, protegendo por dentro.
Posso usar apenas fungicidas multissítios para controlar as doenças na soja?
Não é o ideal. Embora eficazes na prevenção, os multissítios não são absorvidos pela planta. A estratégia mais robusta e recomendada é sempre utilizá-los em associação com produtos de sítio-específico, combinando a proteção externa (contato) com a proteção interna (sistêmica) para um controle mais completo e duradouro.
Como o uso de fungicidas multissítios ajuda a evitar a resistência dos fungos?
Eles atacam múltiplos processos vitais do fungo simultaneamente. Isso torna extremamente difícil para o fungo desenvolver mutações que o tornem resistente a todos os ataques ao mesmo tempo. Ao reduzir a pressão de seleção sobre os fungicidas de sítio-específico, os multissítios ajudam a preservar a eficácia desses produtos por mais safras.
Por que a ferrugem asiática exige um manejo de resistência tão rigoroso?
A ferrugem asiática, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, possui alta variabilidade genética e um ciclo de vida rápido. O uso intensivo de fungicidas de sítio-específico no passado já causou a perda de sensibilidade de alguns grupos químicos, tornando a combinação com multissítios uma estratégia essencial para manter a eficácia do controle.
Se uma aplicação de fungicida falhar, o problema é sempre a resistência?
Não necessariamente. Falhas no controle podem ocorrer por diversos outros motivos, como diagnóstico incorreto da doença, época de aplicação inadequada, tecnologia de aplicação deficiente (bicos, regulagem), dose incorreta do produto ou condições climáticas desfavoráveis que ’lavam’ o produto da folha.
Quando devo iniciar as aplicações de fungicidas para ser mais eficaz?
O controle deve sempre ser iniciado de forma preventiva, ou seja, antes que a doença se estabeleça com alta severidade na lavoura. Iniciar as aplicações em uma população baixa de fungos aumenta a eficácia dos produtos e, crucialmente, diminui a pressão de seleção, que é o principal fator que acelera o surgimento de resistência.
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