A ocorrência de florescimentos fracos e de doenças nas flores é uma preocupação real para quem produz citros. Afinal, para os citros e outras frutíferas, uma boa florada é apenas o primeiro passo para garantir uma colheita rentável. Se as flores não vingam, a produção inteira fica comprometida.
Para evitar perdas, é fundamental estar atento às condições do pomar, desde o clima e a nutrição até o controle de pragas e doenças.
Neste guia prático, vamos detalhar os manejos mais importantes para assegurar uma florada saudável e, como resultado, uma excelente produção.
Entendendo a Florada: A Fisiologia do Florescimento dos Citros
Antes de falarmos sobre o manejo, é importante entender como a planta funciona. Esse conhecimento sobre a fisiologia do florescimento ajuda a tomar decisões mais acertadas no campo.
As plantas cítricas cultivadas em clima subtropical, como no Sul e Sudeste do Brasil, costumam ter de 2 a 5 surtos de crescimento (fluxos) ao longo do ano.
O fluxo da primavera, que geralmente acontece do final de julho a meados de setembro, é o mais importante, pois dá origem à principal florada do pomar. Já em regiões de clima tropical, mais quentes, o crescimento e o florescimento podem ocorrer o ano todo, desde que sejam estimulados.
O principal gatilho que estimula a planta a florescer é um período de estresse hídrico, ou seja, uma leve falta de água controlada.
Embora pareça simples, a florada é um processo complexo que depende de um equilíbrio fino entre fatores internos da planta e fatores externos do ambiente.
- Fatores Internos (endógenos): Incluem os níveis de carboidratos (energia) e hormônios dentro da planta.
- Fatores Externos (exógenos): Incluem a temperatura do ar, a disponibilidade de água e a nutrição do solo.
As flores perfumadas dos citros nascem em inflorescências, que são conjuntos de flores que podem ou não ter folhas junto. A presença de folhas nessas inflorescências depende diretamente das condições do ambiente durante o período de indução floral.
Para a maioria das variedades de citros, as inflorescências que possuem folhas conseguem fixar mais flores, resultando em mais frutos. Isso ocorre porque as folhas fornecem mais energia (carboidratos) e hormônios, criando uma condição interna ideal para o desenvolvimento.
Esquema dos tipos de inflorescências formadas nas plantas cítricas: inflorescências sem folhas (1 e 2); inflorescências com folhas (3 e 4) e ramo vegetativo sem flores (5).
(Adaptado de Yair Erner e Ilan Shomer, 1996).
As 7 Fases do Desenvolvimento Floral
Desde o botão até o “chumbinho”, a flor passa por 7 estágios bem definidos antes de se tornar um fruto. Conhecer essas fases é crucial para aplicar os manejos no momento certo.
Estágios de desenvolvimento floral dos citros: (R1) botões verdes cobertos pelas folhas; (R2) botões verdes cobertos pelas sépalas; (R3) botões brancos; (R4) botões brancos alongados ‘cotonete’; (R5) flores abertas; (R6) queda das pétalas (70% de queda) e (R7) frutificação ‘chumbinho’.
(Adaptado de Silva-Júnior et al., 2014)
Agora que entendemos a base do processo, vamos aos 3 manejos essenciais para transformar essa florada em alta produtividade.
3 Manejos Essenciais para Aumentar a Produção
1. Irrigação Inteligente
Como vimos, o estresse hídrico é fundamental para induzir o florescimento. No entanto, após essa fase, a água se torna um dos fatores mais importantes para a produção.
Uma planta de citros precisa de 900 a 1.200 mm de chuva bem distribuída por ano. Em regiões onde a falta de água (déficit hídrico) ultrapassa 300 mm
anuais, a instalação de um sistema de irrigação se torna obrigatória para ter boa produtividade.
Muitas vezes, o problema não é a quantidade total de chuva, mas sim a sua distribuição. Períodos de seca maiores que 2 meses podem derrubar a produção drasticamente.
Para alcançar uma boa produtividade, a necessidade de água da planta pode variar:
- Verão: Até
4 mm/dia
. - Inverno: Entre
2 a 3 mm/dia
.
Atenção: A necessidade de água de cada pomar pode variar. Ela depende de fatores como a combinação de copa e porta-enxerto, as características do solo, o espaçamento entre plantas, a idade do pomar e a sanidade geral das plantas.
2. Adubação Estratégica
O manejo da adubação é um pilar para todo o ciclo produtivo dos citros. Ele deve ser sempre planejado com base nos resultados de análises de solo e de folhas.
A adubação geralmente é concentrada na época das águas (de setembro a março), um período que cobre as fases de pré-florada e pós-florada. É nesse momento que a planta tem a maior demanda por nutrientes, pois está focada no crescimento de ramos, no florescimento e na fixação dos frutos.
Uma prática comum é aplicar o adubo em faixas, com largura igual ao raio da copa da planta. A recomendação é aplicar dois terços do adubo dentro da projeção da copa e um terço fora.
O parcelamento da adubação é altamente recomendado. Dividir a aplicação em duas ou três vezes durante o período chuvoso melhora o aproveitamento dos nutrientes pela planta.
Confira a tabela abaixo como um guia geral:
Época de aplicação e parcelamento de nitrogênio, fósforo e potássio em plantas cítricas de 2 ou mais anos.
(Adaptado de Embrapa Informação Tecnológica, 2005).
Os micronutrientes também são fundamentais para o desenvolvimento das plantas. Nos últimos anos, duas técnicas ganharam destaque para otimizar a nutrição e melhorar a florada: a fertirrigação e a adubação foliar.
Adubação Foliar para a Florada
A adubação foliar se tornou uma ferramenta importante na citricultura moderna para complementar a nutrição feita via solo. Ela ajuda a manter ou corrigir rapidamente os níveis de nutrientes, especialmente os micronutrientes.
Os principais micronutrientes aplicados via folha são:
- Manganês (Mn)
- Molibdênio (Mo)
- Zinco (Zn)
- Cobre (Cu)
- Boro (B)
As aplicações foliares devem ser feitas durante os surtos de crescimento (primavera e verão), sempre nas horas mais frescas do dia. As brotações novas têm uma cutícula mais fina, o que permite uma melhor absorção dos nutrientes.
Alguns macronutrientes, como nitrogênio (N) e cálcio (Ca), também podem ser aplicados via foliar para dar um impulso na florada.
Importante: A adubação foliar é um complemento. A planta precisa de grandes quantidades de macronutrientes, que devem ser fornecidos principalmente via solo.
Muitas vezes, a adubação foliar pode ser feita na mesma aplicação dos defensivos agrícolas, mas é essencial verificar a compatibilidade dos produtos na calda para evitar problemas.
Fertirrigação: Nutrição Direto na Raiz
A fertirrigação consiste em aplicar os fertilizantes diretamente na água de irrigação. Suas principais vantagens são:
- Aplicação localizada: O nutriente vai direto para a zona de maior concentração de raízes ativas.
- Aplicação em solo úmido: Aumenta a eficiência de absorção pela planta.
Contudo, a técnica exige alguns cuidados:
- Infraestrutura: É necessário que o pomar já tenha um sistema de irrigação instalado.
- Fertilizantes: Devem ser totalmente solúveis em água para não entupir os emissores.
- Monitoramento: É preciso acompanhar de perto para evitar a salinização do solo, especialmente na área do bulbo molhado.
Comportamento do bulbo de molhamento em solo argiloso e arenoso. Em solos arenosos, a água tende a ir mais fundo (percolação), enquanto em solos argilosos, ela se espalha mais para os lados.
(Fonte: Solo, planta e atmosfera: conceitos, processos e aplicações. Reichardt & Timm, 2004.)
3. Controle Fitossanitário das Flores
As plantas de citros são atacadas por diversas pragas e doenças, e durante a florada, o cuidado deve ser redobrado.
O principal inimigo das flores é o fungo Colletotrichum acutatum, que causa a doença conhecida como podridão-floral ou “estrelinha”.
À esquerda (1), uma flor saudável. À direita (2), uma flor atacada pelo fungo Colletotrichum acutatum, apresentando pétalas escurecidas e aspecto de murcha.
(Fontes: (1) Marcelo Brossi Santoro e (2) Fundecitrus)
Esse fungo infecta as flores e os frutos recém-formados, provocando a queda e reduzindo drasticamente a produção. As fases mais críticas para a infecção são R3 (botões brancos), R4 (cotonete) e R5 (flores abertas).
O controle deve ser feito de forma preventiva, antes do florescimento, com a aplicação de fungicidas dos grupos das estrobilurinas e dos triazóis. Fique atento: períodos longos de chuva aumentam muito o risco de infecção.
Uma Atenção Especial: A Florada da Ponkan
A tangerina Ponkan (Citrus reticulata) é uma das variedades mais cultivadas no Brasil. Sua maturação, no estado de São Paulo, ocorre de abril a junho.
Apesar de popular, a Ponkan tem uma particularidade importante: a tendência à alternância de produção.
Alternância de produção: significa que a planta produz muito em um ano e quase nada no ano seguinte.
Isso acontece por um desequilíbrio entre o crescimento de folhas/ramos (fase vegetativa) e a produção de flores/frutos (fase reprodutiva). O principal gatilho para esse desequilíbrio é um florescimento excessivo.
Quando a planta floresce demais, ela gasta todas as suas reservas de energia para sustentar aquelas flores. Como resultado, no ano seguinte, ela não tem força para produzir, levando a uma safra muito baixa ou até mesmo nula.
Para evitar esse prejuízo, é recomendado o uso de técnicas para reduzir o excesso de flores, que podem ser aplicadas de forma preventiva ou corretiva. As principais são:
- Uso de reguladores de crescimento.
- Poda estratégica.
- Raleio de flores ou frutos (químico ou manual).
Conclusão
Como vimos neste artigo, a florada dos citros é influenciada por uma combinação de fatores: água, nutrição e sanidade. Não há uma receita de bolo única, mas sim um conjunto de boas práticas.
O segredo é estar sempre atento, alinhando as técnicas de manejo com as necessidades da planta em cada fase do seu desenvolvimento e com as particularidades de cada variedade.
Dessa forma, você consegue transformar uma bela florada em uma produção abundante e lucrativa.
Glossário
Alternância de produção: Fenômeno em que a planta produz uma safra muito grande em um ano e uma safra muito pequena (ou nula) no ano seguinte. É comum em algumas variedades de citros, como a tangerina Ponkan, e é causado por um desequilíbrio energético na planta.
Estresse hídrico: Período controlado de restrição de água aplicado ao pomar. Essa técnica funciona como um gatilho para induzir as plantas cítricas a pararem o crescimento de folhas e iniciarem o processo de florescimento.
Fertirrigação: Técnica de adubação que consiste em aplicar fertilizantes já diluídos na água de irrigação. Isso permite que os nutrientes sejam entregues de forma localizada e eficiente diretamente na zona das raízes da planta.
Fisiologia do florescimento: O estudo dos processos internos (hormônios, energia) e fatores externos (clima, água) que regulam o desenvolvimento das flores em uma planta. Entender essa fisiologia ajuda a tomar decisões de manejo mais precisas.
Fluxos de crescimento: Períodos ou surtos de desenvolvimento de novos ramos e folhas que ocorrem ao longo do ano nas plantas cítricas. O fluxo da primavera é o mais importante, pois origina a principal florada da safra.
Inflorescência: O conjunto ou agrupamento de flores em um ramo da planta. Nos citros, as inflorescências que possuem folhas junto às flores geralmente conseguem fixar um número maior de frutos.
Podridão-floral: Doença causada pelo fungo Colletotrichum acutatum, também conhecida como “estrelinha”. Ataca as flores e frutos recém-formados, causando seu apodrecimento e queda, o que impacta diretamente a produtividade.
Porta-enxerto: A parte inferior (sistema radicular e base do tronco) de uma planta enxertada. É escolhido por características como resistência a doenças e adaptação ao solo, servindo de base para a variedade de copa (a que produz os frutos).
Veja como o Aegro pode otimizar o manejo da florada
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Perguntas Frequentes
Por que um período de falta de água (estresse hídrico) é benéfico para a florada dos citros?
O estresse hídrico controlado funciona como um gatilho natural que sinaliza para a planta a hora de parar de crescer folhas e ramos e iniciar o processo de florescimento. Essa técnica induz uma florada mais uniforme e abundante. No entanto, é crucial restabelecer a irrigação logo após esse período para garantir que as flores e futuros frutos tenham água suficiente para se desenvolver.
Qual o momento ideal para aplicar fungicidas contra a podridão-floral (estrelinha)?
O controle da podridão-floral deve ser preventivo. As aplicações de fungicidas são mais eficazes quando realizadas antes do florescimento e durante as fases mais críticas de infecção, que são R3 (botões brancos), R4 (cotonete) e R5 (flores abertas). A atenção deve ser redobrada em períodos chuvosos, que favorecem o desenvolvimento do fungo.
A adubação foliar pode substituir completamente a adubação feita no solo?
Não, a adubação foliar não substitui a adubação de solo. Ela atua como uma ferramenta complementar, ideal para corrigir deficiências de micronutrientes (como Boro, Zinco e Manganês) de forma rápida. As grandes quantidades de macronutrientes (Nitrogênio, Fósforo e Potássio) que a planta precisa devem ser fornecidas via solo.
Quais os nutrientes mais importantes para estimular uma boa florada nos citros?
Para uma florada de qualidade, um balanço nutricional é essencial. O Nitrogênio (N) e o Cálcio (Ca) são importantes para o desenvolvimento estrutural. Micronutrientes como o Boro (B) são cruciais para a germinação do pólen e a fixação dos frutos, enquanto o Zinco (Zn) e o Manganês (Mn) participam de processos hormonais e energéticos vitais para a planta.
Como posso evitar a alternância de produção em um pomar de tangerina Ponkan?
A alternância de produção na Ponkan é causada por um florescimento excessivo que esgota as reservas da planta. Para evitar isso, o produtor pode adotar técnicas como o raleio de flores ou frutos (manual ou químico), realizar podas estratégicas para equilibrar a relação entre ramos e frutos, e utilizar reguladores de crescimento para controlar a intensidade da florada.
É verdade que inflorescências com folhas resultam em mais frutos? Por quê?
Sim, é verdade. Inflorescências que possuem folhas junto às flores tendem a fixar mais frutos porque as folhas atuam como uma fonte extra e imediata de energia (carboidratos) e hormônios. Essa proximidade cria uma condição ideal para o desenvolvimento das flores e a sua transformação em frutos, aumentando a taxa de pegamento.
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