Enfezamento do Milho: Como Identificar, Prevenir e Controlar

Engenheira agrônoma, mestre e doutora em Fitopatologia.
Enfezamento do Milho: Como Identificar, Prevenir e Controlar

O enfezamento do milho está se tornando um problema cada vez mais sério nas lavouras brasileiras, principalmente devido aos plantios consecutivos da cultura. Essa doença pode derrubar a produção de grãos de forma drástica, comprometendo o resultado de toda a safra.

Por isso, é fundamental que você conheça as melhores medidas de prevenção e controle do enfezamento. Essas estratégias envolvem, principalmente, o manejo correto da cigarrinha-do-milho, que é a principal transmissora da doença.

Neste guia completo, vamos detalhar tudo o que você precisa saber. Confira!

Por Que o Enfezamento do Milho se Tornou um Problema Tão Sério?

Até pouco tempo, o enfezamento não era visto como uma doença de grande importância para as lavouras de milho. No entanto, o cenário mudou. Com a expansão da área cultivada e os plantios contínuos, que mantêm o milho no campo durante boa parte do ano, a doença encontrou o ambiente perfeito para se espalhar.

Hoje, a incidência é alta e as perdas são consideráveis. Relatórios técnicos indicam que o enfezamento do milho pode reduzir a produção de grãos em até 70%, e em casos mais graves, algumas publicações falam até em perda total da produção.

O enfezamento é causado por patógenos: [significa organismos que causam doenças] da classe dos molicutes: [significa um tipo de bactéria sem parede celular]. O principal vetor: [significa o transmissor da doença] é a cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis).

Em 2020, houve um aumento alarmante nas populações de cigarrinha nas lavouras. Esse cenário favoreceu a disseminação da doença em plantios tardios e até mesmo a sua transferência de uma safra para outra.

Existem dois tipos de enfezamento na cultura do milho:

  • Enfezamento Vermelho: causado por um fitoplasma (Maize bushy stunt phytoplasma – MBSP), um tipo de molicute que infecta o floema da planta.
  • Enfezamento Pálido (ou Amarelo): causado por um espiroplasma (Spiroplasma kunkelii), outro tipo de molicute.

Vamos detalhar os sintomas de cada um deles para facilitar a identificação no campo.

Enfezamento Vermelho: Sintomas e Identificação

O principal sintoma do enfezamento vermelho é a clorose marginal: [significa que as bordas das folhas ficam amareladas], começando pelas folhas do cartucho. Com o tempo, essa coloração evolui para um avermelhamento intenso, principalmente nas folhas mais velhas (baixeiras), que também podem ter seu tamanho reduzido.

comparação visual, lado a lado, de duas folhas de milho exibindo diferentes sintomas de anomalias. A fSintomas do enfezamento vermelho: A - estrias cloróticas (amareladas), B – estrias avermelhadas. (Fonte: Janine Palma em Mais Soja)

Outros sinais importantes em plantas infectadas incluem:

  • Proliferação de espigas: a planta pode desenvolver um número maior de espigas, mas elas são pequenas e produzem poucos grãos ou são totalmente improdutivas.
  • Redução do porte da planta: as plantas ficam visivelmente menores.
  • Encurtamento dos entrenódios: a distância entre as folhas no colmo diminui, dando à planta uma aparência mais compacta e “arbustiva”.

Enfezamento Pálido (Amarelo): Como Diferenciar

O enfezamento pálido, também conhecido como amarelo, apresenta sintomas que podem ser confundidos com o vermelho. O principal sinal que o diferencia é o início da clorose: no enfezamento pálido, surgem estrias cloróticas claras: [significa listras amareladas ou esbranquiçadas] que começam na base da folha e se estendem em direção à ponta.

É importante notar que uma mesma planta pode ser infectada pelos dois tipos de enfezamento ao mesmo tempo, exibindo uma combinação de sintomas.

close-up de uma planta de milho em campo, com foco em suas folhas que apresentam sintomas visíveis de um pr(Fonte: Rodrigo Véras da Costa em Embrapa)

Resumo dos Sintomas Comuns aos Dois Tipos de Enfezamento

Para facilitar a identificação, aqui estão os principais sintomas que ambos os enfezamentos podem causar:

  • Redução geral do porte das plantas.
  • Avermelhamento ou estrias cloróticas claras nas folhas.
  • Maior número de espigas, que têm pouco ou nenhum grão.
  • Grãos chochos e malformados.
  • Encurtamento visível dos entrenódios.
  • Falhas na granação, resultando em espigas incompletas.
  • Redução drástica da produtividade.

A Relação Inseparável: Enfezamento e a Cigarrinha-do-Milho

Como já mencionado, a cigarrinha-do-milho é o vetor dos enfezamentos. Além de transmitir a doença (dano indireto), sua presença também causa danos diretos ao sugar a seiva da planta. No entanto, seu maior impacto econômico vem da sua capacidade de disseminar os molicutes.

Além dos enfezamentos vermelho e pálido, a cigarrinha também pode transmitir o vírus da risca do milho (Maize rayado fino virus – MRFV).

Para identificar o inseto corretamente, observe estas características:

  • Aparência: Na fase adulta, a cigarrinha tem coloração amarelo-palha.
  • Tamanho: É um inseto pequeno, com cerca de 4 mm de comprimento.
  • Marca Distintiva: A principal característica que a diferencia de outras cigarrinhas são duas manchas circulares pretas bem visíveis no alto da cabeça.

O ciclo de vida da cigarrinha, de ovo a adulto, é influenciado pela temperatura, mas dura em média 25 dias.

infográfico que ilustra o ciclo de vida de um inseto-praga, provavelmente a cigarrinha-do-milho (Dalbul(Fonte: Grupo Cultivar)

Como Acontece a Transmissão?

O processo de transmissão do enfezamento pela cigarrinha ocorre em três etapas:

  1. Aquisição: A cigarrinha se alimenta da seiva de uma planta de milho já doente, ingerindo o espiroplasma, o fitoplasma ou ambos.
  2. Incubação: Dentro do corpo do inseto, os molicutes se multiplicam por cerca de três semanas, circulam e chegam até sua glândula salivar. A partir deste momento, a cigarrinha se torna infectante para o resto da vida.
  3. Transmissão: Ao se alimentar de plantas sadias, a cigarrinha injeta os patógenos através da sua saliva, infectando-as e recomeçando o ciclo da doença.

Um ponto crucial é que a infecção geralmente ocorre quando as plantas são jovens, mas os sintomas só aparecem na fase adulta. Isso torna o controle preventivo ainda mais importante.

As cigarrinhas podem voar por longas distâncias, migrando de uma lavoura para outra e espalhando a doença. Como o milho é seu principal hospedeiro, o cultivo contínuo e a presença de plantas tigueras: [significa plantas de milho que nascem voluntariamente de grãos perdidos na colheita anterior] criam uma “ponte verde”, favorecendo a sobrevivência do vetor e da doença durante todo o ano.

Manejo Preventivo: Como Evitar o Enfezamento na sua Lavoura

O planejamento da lavoura de milho é a primeira linha de defesa contra as doenças da cultura. Para prevenir o enfezamento, adote as seguintes medidas:

  • Evite o plantio escalonado: Não plante milho novo próximo a áreas com milho mais velho, que podem abrigar altas populações da cigarrinha.
  • Não plante milho sobre milho: Evite plantios consecutivos na mesma área para quebrar o ciclo da doença e do vetor.
  • Sincronize a época de semeadura: Em regiões com alto histórico de enfezamento, procure alinhar o plantio com seus vizinhos para criar uma janela sem milho no campo.
  • Cuidado com plantios tardios: Evite que o desenvolvimento inicial das plantas coincida com os picos populacionais da cigarrinha.
  • Elimine as plantas voluntárias (tigueras): Destrua todo o milho tiguera na área antes de iniciar um novo plantio, pois ele serve de abrigo para o vetor.
  • Utilize a rotação de culturas: Essa prática é fundamental para quebrar o ciclo de vida de pragas e doenças associadas ao milho.

Estratégias de Controle: O Que Fazer para Combater o Enfezamento

O manejo do enfezamento do milho deve combinar ações preventivas e de controle direto. As principais medidas de controle são:

  • Use cultivares tolerantes: Escolha híbridos de milho que apresentem maior tolerância ou resistência ao enfezamento. Consulte o portfólio das empresas de sementes.
  • Monitore o vetor: Faça o monitoramento constante da cigarrinha na sua plantação para tomar decisões de controle no momento certo.
  • Controle químico do vetor: A aplicação de inseticidas pode ser necessária. No entanto, esse manejo pode não ser totalmente eficiente, pois a cigarrinha transmite a doença muito rápido, podendo infectar a planta antes de morrer. Além disso, novas infestações podem ocorrer continuamente.
  • Considere o controle biológico: Existem inimigos naturais que podem ajudar a reduzir a população da cigarrinha.
  • Faça o tratamento de sementes: Utilize inseticidas no tratamento de sementes para proteger as plântulas durante os estágios iniciais, que são os mais críticos para a infecção.

A recomendação mais eficaz é realizar o manejo integrado, combinando diversas táticas de controle e prevenção para proteger sua lavoura de milho.

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planilha controle da cigarrinha do milho

Se for utilizar inseticidas, verifique sempre os produtos registrados no MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) para a praga e para a cultura do milho no sistema Agrofit. Para um manejo mais seguro e eficaz, procure sempre a orientação de um(a) engenheiro(a) agrônomo(a).

Conclusão

O enfezamento se consolidou como uma das doenças mais preocupantes para a cultura do milho, principalmente por causa dos plantios consecutivos que favorecem a sobrevivência do seu vetor, a cigarrinha.

Neste artigo, você aprendeu os pontos mais importantes sobre o tema:

  • Os dois tipos de enfezamento: o pálido (amarelo) e o vermelho, e como identificar os sintomas de cada um na lavoura.
  • O papel da cigarrinha-do-milho: ela não apenas causa danos diretos, mas é a principal responsável pela transmissão da doença.
  • Medidas de prevenção: estratégias como eliminar plantas tigueras, fazer rotação de culturas e evitar plantios escalonados são fundamentais.
  • Opções de controle: o manejo integrado, que combina uso de híbridos tolerantes, monitoramento e controle químico e biológico, é a abordagem mais eficiente.

Com essas informações, você está mais preparado para fazer um manejo adequado e proteger sua lavoura, reduzindo as perdas causadas pelo enfezamento do milho.


Glossário

  • Clorose: Amarelamento das folhas da planta, causado pela deficiência na produção de clorofila. No caso do enfezamento, pode se manifestar como listras amareladas (estrias cloróticas) ou no amarelamento das bordas das folhas (clorose marginal).

  • Entrenódios: Segmento do caule da planta localizado entre a inserção de duas folhas. O encurtamento dos entrenódios é um sintoma clássico do enfezamento, que resulta em plantas de milho com porte reduzido e aparência “arbustiva”.

  • Espiroplasma: Gênero de bactéria da classe dos molicutes, responsável por causar o enfezamento pálido (ou amarelo) no milho. Este patógeno é transmitido exclusivamente pela cigarrinha-do-milho durante sua alimentação.

  • Fitoplasma: Outro gênero de bactéria da classe dos molicutes que causa o enfezamento vermelho do milho. Assim como o espiroplasma, ele infecta os vasos condutores da planta e depende da cigarrinha como vetor para se espalhar.

  • Molicutes: Classe de bactérias muito pequenas e sem parede celular, que inclui os fitoplasmas e espiroplasmas. São os agentes causadores (patógenos) responsáveis pelos dois tipos de enfezamento do milho.

  • Plantas Tigueras: Termo usado para descrever plantas de milho que nascem voluntariamente de grãos perdidos durante a colheita da safra anterior. Elas atuam como uma “ponte verde”, servindo de abrigo e fonte de alimento para a cigarrinha-do-milho entre os ciclos de cultivo.

  • Vetor: Organismo que transmite um agente causador de doença de um hospedeiro para outro. No contexto do enfezamento, a cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) é o principal vetor, pois transporta os molicutes de plantas doentes para plantas sadias.

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O manejo integrado do enfezamento, como vimos, exige um monitoramento rigoroso da cigarrinha-do-milho e um planejamento preciso das ações de controle. O grande desafio é executar esse plano com eficiência, registrando informações do campo e, ao mesmo tempo, controlando os custos para proteger a rentabilidade da safra. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza essas duas frentes: o registro de atividades no campo permite acompanhar os monitoramentos da praga e planejar as pulverizações no momento certo, enquanto o controle financeiro automático vincula cada aplicação ao custo da lavoura. Dessa forma, você toma decisões agronômicas mais seguras com base em dados reais e sabe exatamente o impacto de cada ação na sua lucratividade.

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Perguntas Frequentes

Qual é a principal diferença visual entre o enfezamento vermelho e o enfezamento pálido no milho?

A principal diferença está nos sintomas foliares. O enfezamento vermelho causa um avermelhamento intenso que geralmente começa nas bordas das folhas mais velhas. Já o enfezamento pálido se manifesta como estrias cloróticas (amareladas ou esbranquiçadas) que surgem na base da folha e se estendem em direção à ponta.

Por que eliminar as plantas de milho tiguera é tão importante para o controle do enfezamento?

As plantas de milho tiguera (voluntárias) servem como um refúgio para a cigarrinha-do-milho entre as safras, criando uma “ponte verde”. Isso permite que o inseto vetor e os patógenos da doença sobrevivam e se multipliquem, aumentando a pressão de infestação no início do novo plantio. A eliminação dessas plantas quebra o ciclo da doença.

Apenas aplicar inseticida para controlar a cigarrinha-do-milho é suficiente para evitar a doença?

Não, o controle químico isolado do vetor geralmente é insuficiente. A cigarrinha pode transmitir a doença muito rapidamente ao se alimentar, muitas vezes antes que o inseticida a elimine. A estratégia mais eficaz é o manejo integrado, que combina o uso de cultivares tolerantes, tratamento de sementes e práticas preventivas, como a rotação de culturas.

A infecção do enfezamento ocorre quando a planta é jovem. Por que os sintomas só aparecem na fase adulta?

Após a cigarrinha infectar a plântula, os patógenos (molicutes) precisam de um período de incubação para se multiplicar e se espalhar pelos tecidos da planta. Por isso, os sintomas visíveis, como redução de porte e espigas malformadas, só se manifestam em estágios mais avançados do desenvolvimento da cultura, reforçando a importância do controle inicial do vetor.

Além de transmitir o enfezamento, a cigarrinha-do-milho causa algum outro tipo de dano direto à planta?

Sim. Além de ser o vetor dos enfezamentos pálido e vermelho, a cigarrinha também transmite o vírus da risca do milho e causa danos diretos ao sugar a seiva da planta. No entanto, seu maior impacto econômico é, sem dúvida, a disseminação dos patógenos do enfezamento, que podem levar a perdas drásticas na produção.

O que causou o aumento da gravidade do enfezamento do milho no Brasil nos últimos anos?

O problema se agravou principalmente devido à intensificação do cultivo, com plantios consecutivos de milho (safrinha) ao longo do ano. Essa prática mantém o hospedeiro sempre disponível no campo, favorecendo a sobrevivência e a multiplicação da cigarrinha-do-milho, o que levou a um aumento alarmante de sua população e, consequentemente, da disseminação da doença.

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