Garantir a produtividade da sua lavoura de soja é um trabalho que vai até o último dia do ciclo. No entanto, é justamente na reta final que as doenças de final de ciclo (DFCs) surgem como uma grande ameaça, capazes de comprometer seriamente o resultado da safra.
Dependendo da doença e da severidade do ataque, as perdas podem variar de 10% a impressionantes 90% da produção, como no caso da temida ferrugem asiática.
Neste guia completo, vamos detalhar as principais doenças que atacam a soja na sua fase final e apresentar as estratégias de manejo mais eficazes para proteger sua produtividade e garantir a rentabilidade da sua operação.
O Desafio do “Complexo de Doenças”
Um ponto crucial a entender é que, muitas vezes, as doenças da soja não agem sozinhas. Elas podem ocorrer em conjunto, formando o que os técnicos chamam de “complexo de doenças”. Essa combinação pode gerar perdas de até 30% no rendimento da lavoura.
A seguir, detalhamos as características de cada doença para que você possa identificá-las corretamente e aplicar o manejo mais adequado.
Conheça as Principais Doenças de Final de Ciclo da Soja
Saber identificar os sintomas e entender as condições que favorecem cada doença é o primeiro passo para um controle eficiente.
Crestamento Foliar de Cercospora e Mancha Púrpura da Semente
Causada pelo fungo Cercospora kikuchii, esta doença se desenvolve bem em clima quente e chuvoso e pode atacar todas as partes da planta.
- Sintomas nas folhas: Aparecem como pontuações escuras, com coloração castanho-avermelhada, que crescem e formam grandes manchas. A doença pode provocar a queda prematura das folhas, um sintoma que pode ser confundido com a senescência: o envelhecimento natural da planta, mascarando o problema.
- Sintomas nas vagens: Surgem pontuações vermelhas que evoluem para manchas castanho-avermelhadas.
- Sintomas na semente: O fungo atinge a semente através da vagem, causando a conhecida mancha-púrpura no grão.
- Sintomas na haste: Podem ocorrer lesões avermelhadas e levemente deprimidas.
- Sobrevivência do fungo: O Cercospora kikuchii sobrevive em sementes infectadas e nos restos culturais da safra anterior.
(Fonte: Paulo Edimar Saran)
Mancha-parda ou Septoriose
Causada pelo fungo Septoria glycines, a mancha-parda pode surgir desde o início do desenvolvimento da cultura.
- Condições favoráveis: Requer um período mínimo de 6 horas de molhamento foliar e temperaturas entre 15°C e 30°C para se desenvolver.
- Sintomas: No final do ciclo, causa pontuações pardas nas folhas. Essas evoluem para manchas de formato angular, com centro castanho e um halo: um anel amarelado ao redor da lesão. A doença também provoca a desfolha precoce da soja.
- Sobrevivência do fungo: Assim como o crestamento foliar, o Septoria glycines sobrevive em sementes infectadas e nos restos culturais.
(Fonte: Paulo Edimar Saran)
Doenças que Atacam Durante Todo o Ciclo
Algumas doenças são frequentemente associadas ao final do ciclo, mas na verdade podem atacar a lavoura em qualquer estágio de desenvolvimento, desde a emergência das plântulas. É fundamental monitorá-las constantemente.
Veja no calendário abaixo os períodos de maior risco para as principais doenças da soja:
(Fonte: Paulo Edimar Saran)
Antracnose
Causada pelo fungo Colletotrichum truncatum, a antracnose já foi considerada a segunda doença mais importante da cultura em safras passadas.
- Condições favoráveis: Clima quente e úmido.
- Sintomas: Pode causar a morte de plântulas no início do desenvolvimento. Ao longo do ciclo, causa manchas na haste, folhas e vagens. A partir da floração, as vagens podem apresentar uma coloração castanho-escura. As sementes atacadas exibem manchas castanhas e deprimidas.
- Sobrevivência do fungo: Sobrevive em restos culturais e sementes contaminadas.
(Fonte: Fundação Rio verde)
Mancha Olho de Rã
Causada pelo fungo Cercospora sojina, esta doença pode gerar perdas de até 60% na produção.
- Condições favoráveis: Presença de água nas folhas e temperaturas altas. É mais comum a partir da fase de floração.
- Sintomas: Inicia com pequenos pontos escuros nas folhas que evoluem para lesões marrons com margem mais escura. Com o tempo, o centro da mancha fica castanho-claro na parte de cima da folha e cinza na parte de baixo. Nas vagens, causa lesões avermelhadas circulares. As sementes atacadas ficam com coloração acinzentada a marrom.
- Sobrevivência do fungo: Sobrevive em restos de cultura e é disseminado por sementes.
(Fonte: Paulo Edimar Saran)
Mancha-alvo
Causada pelo fungo Corynespora cassiicola, a mancha-alvo pode gerar perdas de até 35% na produtividade.
- Condições favoráveis: Temperaturas amenas e alta umidade.
- Sintomas: Ataca folhas, haste, vagens e sementes. Nas folhas, os sintomas começam como pontuações pardas com halo amarelado, evoluindo para manchas circulares de cor castanha. A característica principal é a presença de um ponto no centro e anéis concêntricos mais escuros, semelhantes a um alvo de tiro. Nas vagens, as lesões são circulares e deprimidas, podendo contaminar a semente.
- Sobrevivência do fungo: Sobrevive em restos culturais e é disseminado por sementes contaminadas.
(Fonte: Dirceu Gassen em Agrolink)
Oídio
Causada pelo fungo Microsphaera difusa, esta doença se desenvolve bem em condições opostas a muitas outras.
- Condições favoráveis: Temperaturas amenas e baixa umidade relativa do ar.
- Sintomas: Aparece como uma cobertura esbranquiçada, parecida com um pó (daí o nome), sobre folhas, vagens e hastes. Com o avanço da doença, essa cobertura pode se tornar castanha-acinzentada. O oídio pode causar a queda precoce das folhas.
(Fonte: Cláudia V. Godoy em Embrapa)
Ferrugem Asiática
A mais temida das doenças, a ferrugem asiática é causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi e pode causar perdas devastadoras, de 10% a 90%.
- Condições favoráveis: Ocorre em qualquer estádio da planta, mas o risco aumenta a partir do fechamento do dossel: o momento em que as folhas das fileiras de soja se encontram, criando um microclima úmido.
- Sintomas Iniciais: A identificação precoce é difícil. É preciso olhar na parte inferior das folhas, com auxílio de uma lupa, procurando por pequenas saliências que são as pústulas: estruturas onde o fungo se reproduz. Diferente de outras ferrugens, os esporos iniciais são claros, não alaranjados.
- Sintomas Avançados: Com o avanço, as pústulas se tornam castanhas e liberam os esporos. Atenção: se você observar folhas amarelando e caindo na lavoura, a ferrugem provavelmente já está instalada há mais de 30 dias, tornando o controle muito mais difícil e caro.
Lavoura de soja durante o período reprodutivo intensamente atacada por ferrugem asiática (A), e a mesma lavoura, uma semana após, apresentando severa desfolha (B)
(Fonte: Pioneer sementes)
5 Estratégias de Manejo Integrado para Proteger sua Lavoura
Nenhuma doença é controlada por uma única ação. A melhor abordagem é integrar diferentes métodos, sempre avaliando o custo-benefício para a sua realidade.
1. Escolha de Cultivares Resistentes
Se uma doença é um problema recorrente em sua região, a primeira linha de defesa é a genética. Opte por cultivares que possuam resistência ou tolerância comprovada para o patógeno em questão.
- Indicado para: Mancha olho de rã, Oídio e Mancha-alvo.
2. Uso de Sementes Sadias e Tratadas
A qualidade da semente é a base para uma lavoura saudável. Utilize sempre sementes certificadas, pois muitos patógenos: organismos causadores de doenças, como fungos, são transmitidos por sementes contaminadas. Além disso, o tratamento de sementes (químico ou biológico) é uma prática indispensável.
- Indicado para: Crestamento foliar, Mancha olho de rã, Mancha-alvo e Antracnose (recomenda-se fungicida sistêmico e de contato).
Você pode consultar no Agrofit a lista de produtos químicos e biológicos registrados para o tratamento de sementes de soja.
(Fonte: Cotrisoja)
3. Rotação de Culturas
A rotação de culturas é fundamental para quebrar o ciclo de vida dos fungos que sobrevivem nos restos culturais. Ao plantar espécies que não são hospedeiras dos patógenos da soja (como milho ou braquiária), você reduz a fonte de contaminação para a safra seguinte.
- Indicado para: Mancha-parda, Mancha-alvo e Antracnose.
4. Controle Químico da Parte Aérea
A aplicação de fungicidas na cultura da soja é uma ferramenta essencial. O segredo está no timing e na escolha do produto correto.
- Aplicação Protetora: Para algumas doenças, as aplicações devem ser feitas preventivamente, antes do aparecimento dos sintomas.
- Aplicação Curativa: Para outras, a aplicação é recomendada logo no início do desenvolvimento da doença.
Consulte sempre o Agrofit para verificar os produtos registrados para cada doença e as doses recomendadas.
- Indicado para: Crestamento foliar, Mancha-parda (especialmente na fase de formação e enchimento das vagens), Oídio e Mancha-alvo.
Em caso de dúvida sobre o diagnóstico ou o melhor momento para o controle, consulte sempre um(a) engenheiro(a) agrônomo(a).
5. Gestão Agrícola e Planejamento
Um bom manejo de doenças começa muito antes da aplicação do fungicida. Ele começa no planejamento agrícola. Um planejamento bem feito permite organizar a compra de insumos, o momento certo para o tratamento de sementes e as janelas ideais para a aplicação de defensivos.
Registrar todas as atividades, seja em planilhas ou em um software para fazenda, é igualmente vital. Esses dados históricos são a base para uma gestão agrícola eficiente, melhorando a tomada de decisões safra após safra.
Para ajudar você a começar, disponibilizamos gratuitamente uma planilha de estimativa de produtividade de soja. Com ela, você pode projetar sua produção e planejar melhor a colheita e a comercialização.
Conclusão
O controle das doenças de final de ciclo na soja não depende de uma única ação, mas sim de um manejo integrado e bem planejado. A estratégia de sucesso combina três pilares:
- Identificação correta dos sintomas no campo.
- Conhecimento das condições que favorecem cada doença.
- Aplicação de múltiplas táticas de controle, desde a escolha da cultivar até o uso de um bom planejamento agrícola.
Ao adotar essa abordagem, você deixa de apenas reagir aos problemas e passa a se antecipar a eles. Lembre-se: cada decisão de manejo, do planejamento à colheita, é um passo para proteger seu investimento e garantir a rentabilidade da sua safra.
Glossário
Dossel: Refere-se à camada superior de folhas da lavoura. O “fechamento do dossel” ocorre quando as folhas de fileiras vizinhas se tocam, criando um microclima úmido que favorece o desenvolvimento de doenças como a ferrugem asiática.
Fungicida sistêmico e de contato: Tipos de defensivos agrícolas. Fungicidas de contato agem apenas na superfície da planta, como uma barreira. Já os sistêmicos são absorvidos e se movem pela seiva, protegendo a planta por dentro e alcançando novas brotações.
Halo: Círculo ou anel de coloração diferente (geralmente amarelado) que se forma ao redor de uma mancha ou lesão na folha. É um sintoma chave para identificar doenças como a mancha-parda e a mancha-alvo.
Patógeno: Organismo capaz de causar doenças, como um fungo, bactéria ou vírus. No artigo, os fungos Cercospora sojina (mancha olho de rã) e Phakopsora pachyrhizi (ferrugem asiática) são exemplos de patógenos.
Pústulas: Pequenas saliências ou bolhas, semelhantes a feridas, que aparecem nas folhas e são as estruturas onde os fungos da ferrugem se reproduzem. A observação de pústulas na parte de baixo das folhas é o principal sinal para o diagnóstico precoce da ferrugem asiática.
Rotação de Culturas: Prática de alternar diferentes espécies vegetais (ex: soja e milho) em uma mesma área a cada safra. Essa técnica quebra o ciclo de vida de patógenos que sobrevivem nos restos culturais, reduzindo a fonte de infecção para o cultivo seguinte.
Senescência: Processo de envelhecimento natural da planta, que causa o amarelamento e a queda das folhas no final do seu ciclo de vida. É fundamental diferenciar a senescência da desfolha precoce causada por um ataque severo de doenças.
Otimize o controle de doenças com uma gestão integrada
O manejo integrado de doenças, como detalhado no artigo, exige um acompanhamento rigoroso do campo e um planejamento financeiro preciso. Decidir o momento certo para aplicar um fungicida e controlar os custos dessas operações são os maiores desafios para garantir a rentabilidade da safra. Ferramentas de gestão agrícola como o Aegro centralizam essas duas frentes. Nele, você pode registrar os monitoramentos de pragas e doenças, planejar as pulverizações no calendário de atividades e, ao mesmo tempo, acompanhar o custo de cada aplicação, garantindo que o manejo fitossanitário não comprometa sua margem de lucro.
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Perguntas Frequentes
Por que algumas doenças são chamadas de ‘doenças de final de ciclo’ se podem infectar a soja antes?
Elas são chamadas assim porque seus danos mais severos e sintomas mais visíveis ocorrem da floração em diante, impactando diretamente o enchimento dos grãos e a produtividade. Embora a infecção possa começar mais cedo, as condições do final do ciclo, como o fechamento do dossel e maior umidade, aceleram drasticamente o desenvolvimento desses patógenos.
Como posso diferenciar a desfolha natural da soja (senescência) daquela causada por doenças?
A senescência é um processo natural e geralmente uniforme, onde as folhas mais baixas amarelam e caem progressivamente. A desfolha causada por doenças, como a ferrugem asiática, tende a ser irregular, ocorrendo em manchas (reboleiras) na lavoura e é acompanhada por lesões visíveis como pústulas, manchas pardas ou halos amarelados nas folhas que ainda não caíram.
O uso de cultivares resistentes elimina a necessidade de aplicar fungicidas?
Não necessariamente. Cultivares resistentes são uma ferramenta fundamental no manejo integrado, reduzindo a severidade das doenças, mas não garantem imunidade total. Em anos de alta pressão do patógeno, a resistência pode ser superada, sendo crucial monitorar a lavoura e realizar aplicações complementares de fungicidas para garantir a proteção da produtividade.
Qual a real importância da rotação de culturas para o controle dessas doenças?
A rotação de culturas é vital porque quebra o ciclo de vida de fungos que sobrevivem nos restos culturais, como os agentes da mancha-alvo e antracnose. Ao plantar uma cultura não hospedeira, como o milho, você reduz a quantidade de inóculo (fonte de contaminação) no solo para a próxima safra de soja, diminuindo a pressão inicial da doença.
Devo aplicar fungicidas de forma preventiva ou somente quando os primeiros sintomas aparecerem?
Para doenças agressivas e de rápida disseminação como a ferrugem asiática, as aplicações preventivas, baseadas no calendário e nas condições climáticas, são essenciais para o sucesso do controle. Para outras doenças, o monitoramento constante é chave, e a aplicação pode ser feita logo no início da manifestação dos sintomas. A melhor estratégia sempre deve ser definida com o auxílio de um engenheiro agrônomo.
O que significa o ‘complexo de doenças’ e como ele afeta o manejo?
O ‘complexo de doenças’ ocorre quando duas ou mais doenças atacam a lavoura simultaneamente. Isso dificulta a identificação e o controle, pois os sintomas podem se sobrepor e os danos somados podem ser muito maiores do que os de cada doença isoladamente. O manejo exige o uso de fungicidas de amplo espectro, que sejam eficazes contra os diferentes patógenos presentes na área.
Como o fechamento do dossel da lavoura influencia a severidade das doenças de final de ciclo?
O fechamento do dossel cria um microclima sob as folhas com alta umidade, pouca circulação de ar e maior tempo de molhamento foliar. Esse ambiente é extremamente favorável para a germinação de esporos e a rápida proliferação de fungos, como o da ferrugem asiática, transformando a lavoura em um ambiente ideal para uma epidemia.
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