Grande parte do cultivo de soja no Brasil acontece em solos com baixa fertilidade natural. Essa realidade exige um investimento maior em fertilizantes e corretivos para garantir o sucesso da safra.
A produtividade de grãos da soja tem uma forte ligação não apenas com os macronutrientes, mas também com os micronutrientes. Entre eles, o boro se destaca como um elemento essencial para maximizar a produção.
Contudo, para que ele funcione, precisamos fornecer esse nutriente na quantidade adequada e nas épocas mais críticas para a planta.
Aprenda a seguir como identificar a deficiência de boro na soja e garanta maior rentabilidade na sua lavoura.
Entendendo o Básico: A Nutrição das Plantas
Para entender a fundo o boro (B), primeiro precisamos revisar alguns pontos sobre a nutrição de plantas.
O solo contém uma grande variedade de nutrientes, que podem ser classificados em três grupos:
- Nutrientes Essenciais: São aqueles indispensáveis para a planta. Sem eles, a planta não consegue completar seu ciclo de vida, o que afeta diretamente seu crescimento, desenvolvimento e produção.
- Nutrientes Benéficos: Não são essenciais, mas sua presença pode melhorar o desenvolvimento da planta.
- Nutrientes Tóxicos: Em excesso, podem prejudicar ou até matar a planta.
Para alcançar uma alta produtividade, todos os nutrientes essenciais devem estar disponíveis. No total, são 14, divididos em duas categorias com base na quantidade que a planta necessita:
- Macronutrientes: São exigidos em grandes quantidades (Nitrogênio, Fósforo, Potássio, Cálcio, Enxofre e Magnésio).
- Micronutrientes: São exigidos em pequenas quantidades (Boro, Cloro, Cobre, Ferro, Manganês, Molibdênio, Níquel e Zinco).
É fundamental entender que “micro” se refere apenas à quantidade. Um micronutriente como o boro é tão essencial para a soja quanto um macronutriente como o potássio.
No solo, o pH é um dos fatores que mais influencia a disponibilidade desses nutrientes para a planta, como você pode ver no gráfico abaixo.
Variação na disponibilidade de micronutrientes em função do pH. Note como a faixa de disponibilidade do boro (B) é mais estreita.
(Fonte: Malavolta, 1979)
Agora que revisamos a importância geral dos nutrientes, vamos focar no papel específico do boro para a cultura da soja.
A Importância do Boro para a Soja
O boro (B) é um micronutriente com funções vitais na planta. Ele está ligado à produção de compostos essenciais como DNA, RNA, proteínas e fitohormônios, que são os hormônios que regulam o crescimento da planta.
Suas principais funções são:
- Atuar junto com o cálcio (Ca) na formação da parede celular, que dá estrutura e resistência à planta.
- Auxiliar na germinação do tubo polínico: processo fundamental para a fecundação da flor e a formação das vagens.
- Participar da divisão celular, permitindo que a planta cresça.
- Estimular o desenvolvimento das raízes.
- Ajudar no transporte de açúcares (energia) dentro da planta.
A planta absorve o boro do solo principalmente na forma de ácido bórico (H3BO3). Uma vez dentro da planta, seu transporte acontece em uma única direção: das raízes para a parte aérea, através do xilema (os “vasos” que levam água e nutrientes para cima). Esse movimento depende da transpiração das plantas.
Por causa desse transporte unidirecional, a concentração de boro é sempre maior nas folhas do que nas vagens e sementes, independentemente da dose aplicada.
Efeito de diferentes doses de boro aplicado ao solo em sua distribuição na parte aérea de Brassica napus L. Observe como a concentração nas folhas é muito superior.
(Fonte: Gerath et al., 1975, em Marchner, 1986)
Essa característica explica por que a aplicação foliar de boro é um tema controverso. Como ele tem baixa mobilidade no floema (os vasos que redistribuem nutrientes pela planta), o boro aplicado na folha não se move facilmente para outras partes que precisam dele, como as flores ou raízes.
Justamente por essa baixa mobilidade, os sintomas de deficiência de boro aparecem primeiro nos órgãos mais novos e nas regiões de crescimento da planta. Por isso, a correção via solo, no sulco de plantio, é tão importante para garantir a rentabilidade da lavoura.
Como Identificar a Deficiência de Boro na Soja
A deficiência de boro na soja se manifesta primeiro nas folhas mais jovens e nos meristemas apicais, que são as pontas de crescimento da planta (o “ponteiro”).
Sintomas de deficiência de boro na soja: as folhas novas ficam grossas, enrugadas, com leve amarelamento entre as nervuras (clorose internerval) e pontas enroladas para baixo. Os internódios também podem ficar mais curtos.
(Fonte: Plantix)
Para evitar que esses sintomas apareçam, o primeiro passo é sempre a análise de solo e a correção adequada da área.
Outra ferramenta poderosa é a análise química das folhas (análise foliar). Ela permite acompanhar o estado nutricional da lavoura em tempo real e identificar uma deficiência de boro antes que cause perdas significativas.
Como Fazer a Análise Foliar Corretamente
Para que a análise foliar traga resultados confiáveis, a coleta das amostras precisa ser padronizada. Siga estes passos:
Época da Coleta: O momento ideal na cultura da soja é no início do florescimento (estádio R1), pois é quando ocorre o ponto máximo de acúmulo de nutrientes na planta.
O que Coletar: Colete a 3ª e/ou 4ª folha trifoliolada a partir do topo da haste principal, retirando o pecíolo (o cabinho que liga a folha ao caule). A contagem começa na primeira folha do topo que está completamente aberta e desenvolvida.
Ilustração da terceira e quarta folhas trifolioladas (sem o pecíolo), que são as folhas corretas para a análise química em R1.
(Fonte: DRIS)
- Quantidade de Amostras: Quanto mais folhas você coletar, mais representativa será sua amostra. A recomendação geral é de pelo menos 30 folhas por hectare. Se sua lavoura for heterogênea, com diferentes tipos de solo, relevo ou manejos, você precisará de um número maior de amostras para cada área distinta.
Após a coleta, envie as amostras para um laboratório de confiança. A interpretação dos resultados é feita comparando os teores encontrados com os valores de referência para a cultura da soja.
Tabela para interpretação dos teores nutricionais na análise foliar de soja (coleta em R1).
(Fonte: Embrapa Soja, 2013)
Fontes de Boro para Adubação da Soja
Depois de identificar a necessidade de boro, o próximo passo é escolher a melhor forma de fornecê-lo à cultura. O mercado oferece diversas fontes de boro para a adubação de soja.
Esses produtos variam principalmente pelo nível de solubilidade em água, o que influencia diretamente a forma de aplicação.
Para a soja, a aplicação via solo no sulco de semeadura é a mais recomendada. A cultura não costuma responder bem à adubação foliar de boro devido à sua baixa mobilidade dentro da planta.
A aplicação de boro via solo também pode ser feita na forma líquida, muitas vezes em conjunto com a aplicação de herbicidas em pré-plantio. Essa prática garante uniformidade na distribuição, economiza tempo e operações, sem prejudicar o controle de plantas daninhas.
Atenção: Fontes de boro muito solúveis podem causar toxicidade às plantas se aplicadas em excesso ou de forma desuniforme. Por isso, geralmente se dá preferência para fontes menos solúveis, que liberam o nutriente de forma mais gradual.
Tabela com diferentes fontes de boro, seus teores (garantias) e nível de solubilidade.
(Fonte: adaptado de Vitti et al.)
Conclusão
Tanto os macronutrientes quanto os micronutrientes, como o boro, exercem grande influência na produtividade da soja.
Conhecer o comportamento do boro no solo e na planta, e saber como identificar sua deficiência, é essencial para ajustar o manejo e buscar a máxima produtividade.
Neste artigo, vimos a importância do acompanhamento nutricional da lavoura, através da análise de solo e foliar, e discutimos as principais fontes e formas de aplicação desse micronutriente tão importante.
Espero que, com estas informações, você possa manejar o boro de forma eficiente e evitar qualquer deficiência em sua lavoura de soja
Glossário
Análise Foliar: Método de diagnóstico que avalia o estado nutricional da lavoura através da análise química das folhas. Permite identificar deficiências de nutrientes, como o boro, antes que causem perdas visíveis de produtividade.
Estádio R1 (Início do Florescimento): Etapa específica do desenvolvimento da soja, marcada pelo aparecimento da primeira flor aberta em qualquer nó da haste principal. É o momento ideal para realizar a análise foliar, pois a planta atinge o pico de acúmulo de nutrientes.
Fitohormônios: Substâncias que atuam como hormônios vegetais, regulando processos vitais como crescimento, floração e desenvolvimento de frutos. O boro é essencial para a produção de diversos fitohormônios na soja.
Floema: Sistema de vasos condutores da planta responsável por distribuir a energia (açúcares) produzida nas folhas para as outras partes, como raízes, flores e vagens. O boro possui baixa mobilidade no floema, dificultando sua redistribuição dentro da planta.
Meristemas apicais: Regiões de crescimento intenso localizadas nas pontas dos caules e raízes, onde ocorre a divisão celular. São os primeiros locais onde os sintomas de deficiência de boro aparecem na soja.
Micronutriente: Nutriente essencial para o desenvolvimento das plantas, porém exigido em quantidades muito pequenas. Apesar da baixa dosagem, sua falta é tão prejudicial quanto a de um macronutriente. O boro (B) é um exemplo clássico.
Pecíolo: Estrutura semelhante a um “cabinho” que conecta a folha ao caule da planta. Na coleta para análise foliar da soja, o pecíolo deve ser retirado, enviando-se ao laboratório apenas as lâminas foliares.
pH do solo: Escala que mede a acidez ou alcalinidade do solo, variando de 0 a 14. Este fator influencia diretamente a disponibilidade dos nutrientes para as plantas; um pH inadequado pode “travar” o boro no solo, impedindo sua absorção pelas raízes.
Xilema: Sistema de vasos condutores que transporta água e nutrientes absorvidos pelas raízes em um fluxo ascendente para o restante da planta. O boro se move quase que exclusivamente pelo xilema, o que explica sua concentração maior nas folhas mais velhas.
Leve o manejo de nutrientes para o próximo nível
Gerenciar a adubação da soja, especialmente com a atenção que micronutrientes como o boro exigem, é um desafio que impacta diretamente os custos de produção e a rentabilidade. Para garantir que cada aplicação seja um investimento e não apenas um gasto, é essencial ter um controle preciso. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza o planejamento das atividades no campo e o controle financeiro. Com ele, você pode registrar os resultados das análises de solo e foliar, planejar as aplicações de fertilizantes na época certa e acompanhar o custo exato por talhão, transformando dados em decisões mais lucrativas.
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Perguntas Frequentes
O excesso de boro pode prejudicar a lavoura de soja?
Sim, o excesso de boro pode ser tóxico para a soja, pois a faixa entre a dose ideal e a tóxica é muito estreita. Por isso, a aplicação deve ser sempre baseada em análises de solo e foliar, utilizando fontes de liberação gradual e garantindo uma distribuição uniforme para evitar superdosagens que possam queimar as plantas e reduzir a produtividade.
Qual é a melhor forma de aplicar boro na soja: via solo ou foliar?
A aplicação via solo, no sulco de semeadura, é a mais recomendada. O boro possui baixa mobilidade dentro da planta, ou seja, quando aplicado nas folhas, ele não se desloca eficientemente para as raízes ou flores. A aplicação no solo garante um suprimento contínuo e disponível para a planta durante todo o seu ciclo de desenvolvimento.
Por que os sintomas de deficiência de boro aparecem primeiro nas folhas mais novas?
Isso acontece porque o boro não é um nutriente móvel dentro da planta. Ele é transportado das raízes para a parte aérea em um fluxo único e não pode ser redistribuído das folhas mais velhas para as mais novas. Consequentemente, quando há falta de boro, as partes em crescimento ativo, como as folhas jovens e os ponteiros, são as primeiras a manifestar os sintomas.
Além dos sintomas visuais, como posso confirmar com certeza uma deficiência de boro?
A forma mais segura para confirmar a deficiência de boro é através da análise foliar, realizada no início do florescimento (estádio R1). Enquanto a análise de solo indica a disponibilidade do nutriente, a análise foliar revela o quanto a planta realmente absorveu, fornecendo um diagnóstico preciso do estado nutricional da lavoura.
O pH do solo realmente afeta a absorção de boro pela soja?
Sim, o pH do solo influencia diretamente a disponibilidade de boro para as plantas. Em solos muito ácidos (pH baixo) ou muito alcalinos (pH alto), o boro pode ficar retido quimicamente, tornando-se indisponível para a absorção pelas raízes. Corrigir o pH para a faixa ideal é fundamental para garantir a eficiência da adubação boratada.
Qual é o momento certo para coletar amostras para a análise foliar de boro?
O momento ideal para a coleta de folhas para análise na cultura da soja é no estádio R1, que marca o início do florescimento. Nesta fase, a planta atinge o ponto máximo de acúmulo de nutrientes, o que torna o resultado da análise mais confiável para diagnosticar possíveis deficiências e planejar correções.
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