Uma boa correção do solo é um dos investimentos com maior retorno na fazenda. Para se ter uma ideia, na cultura do milho, a produtividade pode aumentar em até 50% apenas com o manejo correto da acidez.
No entanto, com a chegada da pré-safra, as dúvidas aparecem: Qual dose de calcário usar? Preciso mesmo de gessagem? E a fosfatagem, quando é necessária?
As respostas certas dependem de um bom diagnóstico da sua área, baseado em uma análise de solo bem-feita. Este artigo é um guia prático para você entender os conceitos fundamentais e tomar as melhores decisões na hora de corrigir o solo da sua lavoura.
Vamos detalhar cada etapa para que você possa aplicar essas técnicas com segurança e alcançar melhores resultados.
Por Que a Correção do Solo é Tão Importante?
A grande maioria dos solos brasileiros é naturalmente ácida. Essa acidez é causada principalmente pela presença de íons de hidrogênio (H+) e alumínio (Al+3), que são tóxicos para as raízes das plantas.
Mas de onde vem essa acidez? Existem três motivos principais:
- Lixiviação Natural: Ao longo de milhares de anos, a água das chuvas vai “lavando” o solo, carregando nutrientes importantes como cálcio, magnésio e potássio para as camadas mais profundas. Esse processo, chamado de lixiviação, deixa para trás os elementos que causam a acidez.
- Extração pelas Culturas: As plantas absorvem nutrientes do solo para crescer. Se esses nutrientes não são repostos corretamente, a acidez tende a aumentar safra após safra.
- Uso de Fertilizantes Ácidos: Alguns fertilizantes, especialmente os nitrogenados, podem contribuir para a acidificação do solo ao longo do tempo.
Por isso, a calagem (aplicação de calcário) é uma prática essencial para neutralizar essa acidez e preparar o terreno para uma lavoura produtiva. A pré-safra é o momento ideal para realizar tanto a calagem quanto a aplicação de gesso agrícola, se necessário.
Quais São os Principais Benefícios da Calagem?
O benefício mais óbvio é neutralizar a acidez, mas os efeitos positivos vão muito além. A calagem bem-feita traz vantagens diretas para a sua produtividade e para a saúde do solo.
- Elimina a Toxicidade por Alumínio: Em solos ácidos, o alumínio (Al+3) se torna solúvel e tóxico, impedindo o crescimento das raízes. A calagem neutraliza esse alumínio, permitindo que as raízes se desenvolvam em profundidade.
- Fornece Nutrientes Essenciais: O calcário é fonte de cálcio (Ca) e magnésio (Mg), dois macronutrientes vitais. O cálcio fortalece a estrutura das plantas e melhora a agregação do solo, enquanto o magnésio é um componente central da clorofila, essencial para a fotossíntese.
- Aumenta a Disponibilidade de Outros Nutrientes: O pH do solo afeta diretamente a capacidade da planta de absorver nutrientes. Como o gráfico abaixo mostra, em um pH ideal (entre 6,0 e 6,5), a maioria dos nutrientes está mais disponível para as plantas.
Relação entre a disponibilidade de nutrientes e pH no solo
(Fonte:Malavolta, 1979)
Com a correção do pH, a eficiência dos fertilizantes que você aplica aumenta, resultando em mais produtividade. Em lavouras de soja, por exemplo, o ganho médio pode ser de pelo menos 20%.
Ponto de Atenção: Cuidado com o excesso de calcário. Um pH muito elevado pode prejudicar a absorção de micronutrientes como manganês, zinco e boro. Por isso, o cálculo correto baseado na análise de solo é fundamental.
Como Fazer o Cálculo da Calagem Corretamente
O cálculo da necessidade de calcário não precisa ser complicado. O método mais comum e confiável é o da saturação por bases (V%). Vamos seguir um passo a passo.
Passo 1: Entenda a Saturação por Bases (V%) na sua Análise de Solo
Primeiro, você precisa de uma análise química do solo recente. Nela, procure pelo valor V%.
- Saturação por Bases (V%): de forma simples, é um indicador que mostra a proporção de nutrientes “bons” (Cálcio, Magnésio, Potássio) em relação aos elementos que causam acidez (Hidrogênio e Alumínio). Quanto maior o V%, menos ácido é o solo.
O objetivo da calagem é elevar o V% atual do seu solo para um nível ideal para a sua cultura.
- Para soja no Cerrado: o ideal é elevar o V% para cerca de
60%
. - Para lavouras no Paraná e São Paulo: a meta fica entre
60%
e70%
.
Passo 2: Calcule a Necessidade de Calagem (NC)
A fórmula para calcular a Necessidade de Calagem (NC) em toneladas por hectare (t/ha) é a seguinte:
Passo 3: Ajuste a Dose com o PRNT do Calcário
As recomendações de calagem são sempre calculadas para um calcário com PRNT de 100%.
- PRNT (Poder Relativo de Neutralização Total): é a medida da qualidade e da velocidade de reação do calcário. Quanto maior o PRNT, mais eficiente e rápido ele é para corrigir a acidez.
Como o calcário que você compra raramente tem PRNT de 100%, você precisa corrigir a dose recomendada com a seguinte fórmula:
Dose a ser aplicada (t/ha) = NC (t/ha) x (100 / PRNT do seu calcário)
Exemplo prático:
Sua análise de solo indicou uma necessidade (NC) de 2 t/ha
. O calcário que você encontrou para comprar tem um PRNT de 85%
.
- Dose a ser aplicada = 2 x (100 / 85)
- Dose a ser aplicada = 2 x 1,176
- Dose a ser aplicada =
2,35 t/ha
Para se aprofundar, veja nosso artigo detalhado sobre como fazer o cálculo de calagem.
Qual Tipo de Calcário Utilizar?
A escolha depende da composição química do calcário e da necessidade do seu solo, indicada na análise. Existem três tipos principais:
- Calcítico: Contém até 5% de Óxido de Magnésio (MgO). Ideal para solos que já têm níveis adequados de magnésio.
- Magnesiano: Contém entre 5% e 12% de MgO.
- Dolomítico: Contém mais de 12% de MgO. É o mais recomendado para solos com deficiência de magnésio, como é comum no Cerrado.
Além da composição, lembre-se do PRNT: um calcário com PRNT mais alto pode ser um pouco mais caro, mas você precisará aplicar uma quantidade menor, o que pode reduzir o custo final com frete e aplicação.
Qual a Melhor Época para a Aplicação?
Para que o calcário tenha tempo de reagir e corrigir a acidez do solo, o ideal é aplicá-lo de 2 a 3 meses antes do plantio da sua lavoura de verão.
É fundamental que o solo tenha umidade para que a reação química aconteça. No Cerrado, por exemplo, a recomendação é fazer a calagem antes do fim da estação chuvosa.
Em áreas de plantio direto: A calagem é feita na superfície, sem incorporação. Por isso, é crucial que, antes de iniciar o sistema de plantio direto, a acidez do solo seja corrigida em profundidade (camada de 0-20 cm e, se necessário, 20-40 cm).
(Fonte: Prefeitura de Vitor Meireles)
Gessagem: O Condicionador de Solo em Profundidade
O gesso agrícola, composto principalmente por cálcio e enxofre, atua como um condicionador do subsolo.
Importante: o gesso não corrige a acidez da camada arável (0-20 cm) como o calcário. Sua principal função é melhorar o ambiente para as raízes em camadas mais profundas, neutralizando o alumínio tóxico e fornecendo cálcio.
Quando aplicar gesso? A decisão deve ser baseada na análise de solo da camada de 20-40 cm. Aplique gesso se uma destas condições for atendida:
- Saturação por alumínio (m%) for maior que 20%.
- Teor de cálcio (Ca) for menor que 0,5 cmolc/dm³.
O resultado da gessagem é um sistema radicular mais profundo e robusto, o que permite que a planta explore um volume maior de solo para absorver água e nutrientes. O efeito residual da aplicação pode durar cerca de 5 anos.
Confira aqui as diferenças detalhadas entre calagem e gessagem.
É um mito que calagem e gessagem não podem ser feitas juntas. Na verdade, a aplicação simultânea é possível e eficiente, sem interferências negativas.
(Fonte: 3rlab)
Fosfatagem: Corrigindo os Níveis de Fósforo
O fósforo (P) é um nutriente chave para a energia da planta e para a produtividade, especialmente na soja. Para que a adubação fosfatada seja eficiente, a calagem deve ser feita antes, pois a acidez do solo “prende” o fósforo, deixando-o indisponível para as plantas.
A recomendação da dose de fósforo também vem da análise de solo. Veja as tabelas abaixo como referência:
Aprenda a fazer amostragem de solo com 3 métodos diferentes.
(Fonte: Embrapa)
Existem duas estratégias principais para a adubação fosfatada corretiva:
a) Correção Total: Neste método, você aplica a dose total de fósforo de uma só vez para elevar os níveis no solo até o teor crítico.
- Teor crítico: é o nível de um nutriente no solo que permite alcançar, em média, 90% do potencial máximo de produtividade da cultura.
É um investimento inicial mais alto, mas seus efeitos podem durar de 3 a 5 anos, dependendo do manejo.
b) Correção Gradual: Esta estratégia é usada quando os níveis de fósforo no solo estão nas faixas “muito baixo” ou “baixo”. A dose recomendada é dividida:
- 2/3 da dose são aplicados no primeiro cultivo.
- 1/3 restante é aplicado no segundo cultivo.
Quando o teor de fósforo já está na faixa “médio” ou superior, a correção total é mais indicada, pois a dose necessária é menor e não compensa a divisão.
Conclusão
Calagem, gessagem e fosfatagem não são despesas, mas sim o primeiro grande investimento para construir uma lavoura de alta produtividade. Corrigir a base – o solo – é o que permite que todos os outros investimentos em sementes, fertilizantes e defensivos tenham seu máximo retorno.
Agora você tem um roteiro claro sobre como interpretar sua análise de solo e tomar as decisões corretas para cada uma dessas práticas. Aproveite estas informações para planejar sua próxima safra e fazer uma correção do solo eficiente
Glossário
Calagem: Prática de aplicar calcário no solo para corrigir a acidez (aumentar o pH). Este processo neutraliza o alumínio tóxico e fornece nutrientes essenciais como cálcio e magnésio, melhorando a eficiência da adubação.
Fosfatagem: Adubação corretiva para elevar os níveis de fósforo (P) no solo. É uma etapa crucial para culturas exigentes como a soja, e sua eficiência depende de uma calagem bem-feita, pois a acidez “prende” o fósforo no solo.
Gessagem: Aplicação de gesso agrícola para melhorar o ambiente do subsolo (camadas abaixo de 20 cm). O gesso não corrige a acidez da camada arável, mas neutraliza o alumínio tóxico em profundidade, permitindo que as raízes se desenvolvam mais.
Lixiviação: Processo natural em que a água da chuva “lava” o solo, carregando nutrientes importantes como cálcio e magnésio para camadas mais profundas. Este fenômeno contribui significativamente para a acidificação dos solos brasileiros.
PRNT (Poder Relativo de Neutralização Total): Medida que indica a qualidade e a velocidade de reação de um calcário. Um PRNT mais alto significa que o produto é mais eficiente para corrigir a acidez, influenciando diretamente o cálculo da dose a ser aplicada.
Saturação por Alumínio (m%): Indicador da análise de solo que mostra a porcentagem de alumínio tóxico presente. Níveis elevados (acima de 20% na camada de 20-40 cm) são um dos principais critérios para a recomendação de gessagem.
Saturação por Bases (V%): Principal indicador da análise de solo para o cálculo da calagem, representando a proporção de nutrientes benéficos (cálcio, magnésio, potássio). O objetivo da calagem é elevar o V% atual para o nível ideal exigido pela cultura.
Teor Crítico: Nível mínimo de um nutriente no solo que permite à cultura atingir cerca de 90% de seu potencial produtivo máximo. É o valor de referência usado para definir as doses na adubação de correção, como na fosfatagem.
Como a tecnologia pode ajudar na correção do solo
Gerenciar os custos com calcário, gesso e fertilizantes, além de planejar as aplicações no tempo certo, pode ser um desafio. Um software de gestão agrícola como o Aegro centraliza essas informações, ajudando a transformar o investimento na correção do solo em um processo mais controlado e lucrativo. Com ele, você registra todos os gastos com insumos e operações, garantindo um acompanhamento preciso do custo de produção por talhão.
Além disso, o planejamento das atividades se torna mais simples. Agendar a calagem com a antecedência correta, registrar as doses aplicadas e manter um histórico das análises de solo fica mais fácil em uma única plataforma. Isso garante que as decisões sejam baseadas em dados concretos, safra após safra, otimizando o uso de recursos e aumentando a produtividade.
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Perguntas Frequentes
Qual é a principal diferença entre calagem e gessagem?
A calagem corrige a acidez (aumenta o pH) na camada arável do solo (0-20 cm), fornecendo cálcio e magnésio. Já a gessagem atua como um condicionador em camadas mais profundas (20-40 cm), neutralizando o alumínio tóxico e fornecendo cálcio e enxofre, sem alterar significativamente o pH da superfície.
Posso aplicar calcário e gesso agrícola ao mesmo tempo?
Sim, a aplicação simultânea de calcário e gesso não só é possível como também é uma prática eficiente. Realizar as duas operações juntas otimiza o uso do maquinário e reduz os custos operacionais, sem que um produto interfira negativamente na ação do outro.
O que acontece se eu aplicar calcário em excesso no solo?
A aplicação excessiva de calcário, conhecida como supercalagem, eleva demais o pH do solo. Isso prejudica a absorção de micronutrientes essenciais como manganês, zinco e boro, causando deficiências nutricionais na lavoura e impactando negativamente a produtividade. Por isso, o cálculo baseado na análise de solo é fundamental.
Com que antecedência devo fazer a calagem antes do plantio?
O ideal é aplicar o calcário de 2 a 3 meses antes do plantio da cultura. Esse período é necessário para que o produto reaja com a umidade do solo e neutralize a acidez de forma eficaz, garantindo que o ambiente esteja corrigido quando as plantas iniciarem seu desenvolvimento.
Como sei se devo usar calcário dolomítico, magnesiano ou calcítico?
A escolha depende dos teores de cálcio e magnésio indicados na sua análise de solo. Se o solo for deficiente em magnésio, opte pelo dolomítico (mais de 12% de MgO). Se os níveis de magnésio forem adequados, o calcítico (até 5% de MgO) é a melhor opção para não causar desequilíbrio nutricional.
Por que a calagem é importante para a eficiência da adubação com fósforo (fosfatagem)?
Em solos ácidos, o fósforo reage quimicamente com o alumínio e o ferro, ficando ‘preso’ e indisponível para as plantas. Ao corrigir a acidez, a calagem reduz a presença de alumínio tóxico, permitindo que o fósforo aplicado via adubação permaneça disponível para ser absorvido pelas raízes, maximizando o retorno do seu investimento.
Quanto tempo dura o efeito da correção do solo?
O efeito da calagem geralmente dura de 3 a 5 anos, enquanto a gessagem pode ter um efeito residual por cerca de 5 anos. No entanto, essa duração varia com o tipo de solo, o manejo e as culturas. O ideal é realizar análises de solo periódicas a cada 2 ou 3 anos para monitorar a necessidade de novas correções.
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