Cigarrinha-das-Pastagens: Guia Completo de Identificação e Manejo

Engenheira agrônoma, mestre e doutora em Ciências/Entomologia. Atualmente na gestão acadêmica do SolloAgro.
Cigarrinha-das-Pastagens: Guia Completo de Identificação e Manejo

Você já notou que, logo após o início das chuvas, algumas áreas da sua pastagem ou do consórcio milho-braquiária começam a apresentar um amarelamento preocupante? Esse sintoma, conhecido como “queima do pasto”, tem um culpado muito comum: a cigarrinha-das-pastagens.

Entender como essa praga age e quais são os momentos certos para intervir é fundamental para evitar perdas de produtividade. Se os sintomas aparecem e não são controlados, os prejuízos podem se acumular ao longo da estação.

Neste guia, vamos detalhar as características da cigarrinha-das-pastagens, seu ciclo de vida e, o mais importante, as estratégias de manejo integrado para manter sua pastagem saudável e produtiva.

Características da Cigarrinha-das-Pastagens

Existem diversas espécies de cigarrinha-das-pastagens que causam danos significativos em gramíneas forrageiras, impactando diretamente a alimentação do gado. Algumas dessas espécies também são pragas importantes no milho safrinha, especialmente quando cultivado em sistema de consórcio com braquiárias.

Esta imagem é uma fotografia macro que exibe em detalhes uma cigarrinha-das-pastagens, provavelmente da espécie *Mahanarva fi Presença de cigarrinha-das-pastagens, Deois flavopicta, em milho. (Fonte: Ivan Cruz)

Todas as espécies de cigarrinhas pertencem à família Cercopidae, da ordem Hemiptera. As que mais causam problemas no Brasil são:

  • Deois schach
  • Deois flavopicta
  • Deois incompleta
  • Zulia entreriana

Apesar de terem aparências um pouco diferentes, seus hábitos e os danos que causam são muito parecidos. Tanto os insetos adultos quanto as ninfas (sua forma jovem) se alimentam sugando a seiva das plantas. Durante esse processo, eles injetam toxinas que causam o amarelamento característico, popularmente chamado de “queima do pasto”.

campo de pastagem em um dia ensolarado, com vegetação mista de grama verde e seca. Em primeiro plano, o foc Sintoma provocado pela infestação de cigarrinha-das-pastagens. (Fonte: Giro do Boi)

Ciclo de Vida e Comportamento

Para um manejo eficaz, é essencial entender o ciclo de vida da praga:

  • Adultos: Ficam na parte de cima das folhas e caules (parte aérea).
  • Ninfas (fase jovem): Vivem na base do capim, protegidas por uma espuma branca que elas mesmas produzem para manter a umidade e se proteger de predadores.
  • Ovos: São depositados no solo, perto da base das plantas. Durante a seca, eles entram em diapausa: um estado de inatividade que permite que sobrevivam até a chegada das chuvas.

Quando a estação chuvosa começa, a umidade “acorda” os ovos, que eclodem e dão início a uma nova infestação. Agora fica claro por que a “queima do pasto” se torna mais visível justamente após as primeiras chuvas, certo?

close-up da base de uma pastagem, mostrando caules de gramíneas verdes e secas misturados com palha no solo Espuma característica produzida pelas ninfas para proteção na base do capim. (Fonte: Bioseeds)

Como Manejar a Cigarrinha-das-Pastagens

Segundo o pesquisador da Embrapa, Roni de Azevedo, a abordagem mais eficiente é o Manejo Integrado de Pragas (MIP), que combina diferentes táticas de controle de forma estratégica.

Para aplicar o MIP corretamente, você precisa monitorar as condições de temperatura e umidade, que são os gatilhos para o início do ciclo da praga.

diagrama esquemático em preto e branco que ilustra o ciclo de vida de um inseto-praga ao longo de uma estação, Incidência das cigarrinhas e épocas de controle. (Fonte: Gallo et al., 1988)

Com as primeiras chuvas, os ovos que estavam inativos eclodem, dando origem à primeira geração de cigarrinhas. Se o controle não for feito de maneira adequada nesse momento, a praga pode completar até três gerações durante a estação, cada uma causando mais prejuízos que a anterior.

As principais estratégias de controle são o cultural, o biológico e o químico. Vamos detalhar cada uma delas.

Controle Cultural: A Base da Prevenção

O controle cultural foca em criar um ambiente menos favorável para a praga. As principais táticas incluem:

  • Diversificação de Espécies: É fundamental evitar o plantio de uma única variedade de capim. Combine cultivares resistentes à cigarrinha (como Brachiaria brizantha cv. Marandu e Panicum maximum cv. Massai) com cultivares suscetíveis (como a Brachiaria decumbens cv. Basilisk e a Brachiaria ruziziensis). Essa diversidade ajuda a evitar a seleção de insetos mais resistentes.
  • Manejo do Solo: Um solo bem corrigido e fertilizado gera plantas mais vigorosas, que conseguem tolerar melhor o ataque de pragas.
  • Manejo de Pastejo: A divisão da pastagem em piquetes e o controle da altura do capim são cruciais. Evitar o superpastejo (quando o gado come o capim muito baixo) impede que a base das plantas fique exposta, ambiente ideal para a proliferação das ninfas.

uma paisagem rural vibrante, destacando um extenso campo de pastagem com capim alto e verdejante, provavelment Pastagem dividida em piquetes permite o manejo correto da altura do capim. (Fonte: Gabriel Faria/Embrapa)

Controle Biológico: Usando a Natureza a seu Favor

O próprio ambiente já possui inimigos naturais que ajudam a reduzir a população de cigarrinhas. Os principais são:

  • Predadores: Espécies de moscas como Porasilus barbiellinii e Salpingogaster nigra, além de várias espécies de formigas.
  • Parasitoides de ovos: A pequena vespa Anagrus urichi ataca os ovos da cigarrinha no solo.

Além disso, é possível realizar o controle biológico aplicado com o fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae (conhecido como fungo verde). A aplicação desse fungo é mais eficaz quando direcionada para a segunda e terceira geração das cigarrinhas.

Para usar o fungo Metarhizium anisopliae, você deve monitorar a área e aplicar somente quando a infestação atingir um nível de controle específico: entre 6 e 25 ninfas ou de 20 a 30 adultos por metro quadrado (m²).

gráfico técnico que ilustra a dinâmica populacional de uma praga agrícola ao longo de três gerações, correl Momento ideal para controle biológico e químico, de acordo com as gerações da praga. (Fonte: Gallo et al., 1988)

Controle Químico: Quando e Como Utilizar

A decisão pelo controle químico deve ser baseada em dados de monitoramento e não apenas na observação visual dos danos. A aplicação de inseticidas só é recomendada quando a população da praga atinge o nível de dano econômico.

Se o monitoramento indicar mais de 25 ninfas ou mais de 30 adultos por m², o controle químico se torna necessário.

Lembre-se de retirar os animais da área antes da aplicação do inseticida. O retorno dos animais só deve ocorrer após o período de carência especificado no rótulo do produto.

Abaixo estão alguns exemplos de inseticidas com registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) para o controle da praga:

  • Clorpirifós – (Ex: Lorsban 480 BR)
  • Carbaril – (Ex: Sevin 850 WP)
  • Tiametoxam + Lambdacialotrina – (Ex: Engeo Pleno)

Importante: Consulte sempre um engenheiro agrônomo para obter a recomendação correta de produtos, doses e tecnologia de aplicação para a sua realidade.


Glossário

  • Consórcio milho-braquiária: Sistema de cultivo que combina o plantio de milho com uma gramínea forrageira (braquiária) na mesma área e ao mesmo tempo. Após a colheita do milho, a braquiária forma a palhada ou a pastagem para o gado.

  • Diapausa: Estado de inatividade ou dormência no ciclo de vida de um inseto, geralmente acionado por condições ambientais desfavoráveis como a seca. Para a cigarrinha, permite que seus ovos sobrevivam no solo durante o período seco, eclodindo com as primeiras chuvas.

  • Fungo entomopatogênico: Um microrganismo, como o Metarhizium anisopliae (fungo verde), que causa doenças em insetos e é usado no controle biológico. Ele infecta e mata a praga, sendo uma alternativa sustentável aos inseticidas químicos.

  • Hemiptera: Ordem de insetos que inclui percevejos, pulgões e cigarrinhas. Sua principal característica é possuir um aparelho bucal em formato de estilete, adaptado para sugar a seiva das plantas, o que causa danos diretos às culturas.

  • Manejo Integrado de Pragas (MIP): Estratégia que combina diferentes métodos de controle (cultural, biológico e químico) de forma equilibrada. O objetivo é manter a população da praga abaixo do nível em que causa prejuízo econômico, em vez de simplesmente erradicá-la.

  • Ninfas: Estágio jovem e imaturo de insetos como as cigarrinhas. No caso desta praga, as ninfas vivem na base das plantas de capim, protegidas por uma espuma branca característica que elas mesmas produzem para se manterem úmidas.

  • Nível de dano econômico: Ponto em que a densidade de uma praga é alta o suficiente para que os prejuízos causados sejam maiores que o custo da aplicação de um método de controle. Para a cigarrinha, o controle químico é recomendado acima de 25 ninfas por m².

  • Superpastejo: Ocorre quando os animais pastam excessivamente em uma área, consumindo a forragem a uma altura muito baixa. Essa prática degrada a pastagem e expõe a base do capim, criando um ambiente favorável para a proliferação das ninfas da cigarrinha.

Como a tecnologia pode otimizar o manejo de pragas

Realizar o Manejo Integrado de Pragas (MIP) exige disciplina e organização. Como vimos, monitorar a infestação da cigarrinha, registrar as contagens por metro quadrado e decidir o momento exato para o controle são desafios operacionais que impactam diretamente os custos de produção.

Um software de gestão agrícola como o Aegro simplifica esse processo, permitindo que você registre os dados do monitoramento direto no campo pelo aplicativo e planeje as aplicações de defensivos ou biológicos com antecedência. Isso não só garante que o controle seja feito na hora certa, mas também ajuda a acompanhar os custos com insumos, assegurando que cada decisão proteja tanto a sua pastagem quanto a sua margem de lucro.

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Perguntas Frequentes

Qual é o primeiro sinal da cigarrinha-das-pastagens e por que ele aparece logo após as chuvas?

O primeiro sinal visível é o amarelamento da pastagem, conhecido como “queima do pasto”. Esse sintoma aparece logo após as primeiras chuvas porque a umidade do solo ativa os ovos da praga, que estavam em um estado de dormência (diapausa) durante a seca, dando início a uma nova infestação.

Como posso diferenciar o dano das ninfas e dos adultos da cigarrinha?

Embora o dano final (o amarelamento) seja o mesmo, pois ambos sugam a seiva e injetam toxinas, sua localização na planta é diferente. As ninfas, ou formas jovens, vivem na base do capim protegidas por uma espuma branca característica, enquanto os adultos são encontrados na parte aérea, como folhas e caules.

Quando devo usar o controle químico para a cigarrinha-das-pastagens?

O controle químico deve ser a última opção, utilizado apenas quando o monitoramento indicar que a infestação atingiu o nível de dano econômico. Conforme o artigo, isso ocorre quando há mais de 25 ninfas ou mais de 30 adultos por metro quadrado. Abaixo desses níveis, métodos como o controle cultural e biológico são preferíveis.

De que forma o manejo do pastejo ajuda a controlar a cigarrinha?

O manejo correto do pastejo, especialmente evitando o superpastejo (quando o gado come o capim muito baixo), é uma tática de controle cultural fundamental. Manter a altura adequada do capim protege a base das plantas, dificultando a sobrevivência das ninfas, que precisam desse ambiente úmido e protegido para se desenvolver.

É mais eficaz usar o controle biológico na primeira ou nas gerações seguintes da praga?

O artigo indica que a aplicação do fungo Metarhizium anisopliae, um método de controle biológico, é mais eficaz quando direcionada para a segunda e terceira geração das cigarrinhas. O controle da primeira geração é crucial para evitar o aumento da população, mas o fungo tem melhor desempenho quando a praga já está mais estabelecida no campo.

Plantar apenas um tipo de capim, como a Brachiaria decumbens, pode piorar o problema com cigarrinhas?

Sim, a monocultura de capins suscetíveis, como a Brachiaria decumbens, pode agravar o problema. A recomendação do Manejo Integrado de Pragas é diversificar, combinando cultivares resistentes com as suscetíveis. Essa prática dificulta a proliferação da praga e a seleção de insetos mais agressivos.

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